terça-feira, 13 de julho de 2010

  Fidel aparece na TV e acusa EUA de orquestrarem ataque     ao Irã  

O líder da revolução cubana e ex-presidente da ilha, Fidel Castro, participou nesta segunda-feira (12) de um programa da televisão oficial de seu país, em que tratou de questões internacionais, como as sanções contra o Irã e o conflito entre as Coreias. Ele alertou para o grave perigo que significará, para a paz mundial, uma agressão militar dos Estados Unidos e de Israel ao Irã.

 

Para Fidel, os Estados Unidos estão orquestrando uma série de pretextos para agredir o Irã e, assim, isolá-lo internacionalmente. O ex-presidente disse ainda que as recentes sanções aplicadas à nação iraniana são provas das reais intenções norte-americanas.

Durante sua participação no programa Mesa redonda, Fidel sublinhou que o virtual ataque, para o qual estão concentrados importantes efetivos militares dos EUA e de Israel no Golfo Pérsico, pretende destruir o Irã e se baseia na equivocada teoria de uma ausência de resistência por parte desse povo.

"Fazer um cálculo em cima do pressuposto de que os iranianos vão sair correndo é um verdadeiro absurdo", disse, após recordar a história de luta desta nação e também seus preparativos defensivos durante as últimas décadas. Fidel expressou que, ante os agressivos moivimentos dos EUA e de Israel - "totalmente públicos" -, o Irã adquiriu todas as armas possíveis e milhões de cidadãos integram o grupo Guardiões da Revolução e as forças aéreas, terrestres e marítimas do Exército e da Marinha.

"Estão treinando todas as pessoas maiores de 12 anos e menores de 60, são 20 milhões de muçulmanos xiitas", manifestou, em alusão aos generalizados preparativos do povo para enfrentar uma agressão anunciada.

O líder cubano explicou que assim como a agressão contra um barco sul-coreano supostamente realizada pelos EUA para provocar uma guerra entre as duas Coreias, as sanções contra o Irã ilustram a preocupação norte-americana com o domínio da tecnologia nuclear, motivo suficiente para uma possível guerra contra os iranianos.

Além disso, o ex-presidente lembrou que uma eventual agressão da Coreia do Norte contra a Coreia do Sul serviu de pretexto para os EUA manterem suas bases militares no Japão. “É muito curioso que esta suposta agressão tenha coincidido com o pedido do novo líder japonês para devolver o território ocupado em Okinawa pelas tropas norte-americanas”, disse Fidel, de acordo com o jornal cubano Juventud Rebelde.

Após assinalar que os coreanos não vão esperar que os agridam, disse que um primeiro conflito pode desencadear também uma guerra nuclear nessa área. "Seria uma guerra imediatamente depois da outra", agregou, para destacar a gravidade do tema.

Em outra parte da intervenção, revelou que os Estados Unidos gastam, em questões militares, mais recursos que todas as nações do mundo juntas, e os orçamentos de guerra desse país superam em 49% o que foi gasto por Washington em 2000.

Durante a entrevista, Fidel foi acompanhado pelo jornalista Randy Alonso, mediador do Mesa Redonda, pelo historiador Rolando Rodriguez, pelo presidente da Comissão Econômica da Assembleia Popular Nacional e pelo diretor do CNIC (Centro Nacional de investigações Científicas).

No sábado (10), o ex-presidente visitou o CNIC em uma rara aparição pública desde 2006, quando adoeceu. Dois anos depois, Fidel Castro renunciou à presidência cubana por motivos de saúde e seu irmão Raúl Castro oficialmente assumiu o cargo.

Desde então, o ex-presidente abandonou os eventos públicos e limitava sua participação à publicação de artigos no jornal cubano Granma. Fidel também reuniu-se algumas vezes com líderes de outros países e recebeu estudantes, fatos sempre registrados pela imprensa oficial da ilha.

Atualmente com 83 anos, Fidel liderou o Poder Executivo em Cuba durante 49 anos e ainda é o primeiro-secretário do Partido Comunista. As recentes aparições do cubano concidem com a decisão da ilha de libertar 52 presos em 2003, por tentarem derrubar o governo.

Com agências


http://www.vermelho.org.br/noticia

A juventude, enfim, é parte da Constituição Brasileira!

Paulo Vinícius *

O dia 07 de julho marca uma nova página para a juventude Brasileira. Se há 22 anos a juventude conquistou o voto aos 16 anos, nessa data a juventude brasileira se inseriu como sujeito de direitos na Constituição da Republica Federativa do Brasil.


A aprovação da PEC 42/2008 no Senado Federal em duas votações unânimes ilustra a envergadura que ganhou a representação política da juventude brasileira no governo Lula, assim como o reconhecimento de todas as forças políticas da importância e da necessidade de considerar a juventude como sujeito de políticas públicas de Estado.

Doravante, não estará sujeita a política pública de juventude aos ditames deste ou daquele(a) gestor(a). Com a aprovação da PEC, abrem-se largas avenidas para a consecução de um Plano Decenal e de um Estatuto da Juventude. Entra na ordem do dia a realização da II Conferência Nacional da Juventude no primeiro semestre de 2011, assim como a consolidação dos órgãos gestores que tratem das questões relacionadas à juventude.

E não é a toa. Estudos demográficos apontam para um dado relevante. Essa geração comporá uma parcela imensa da população economicamente ativa que será a maior e definirá a face do desenvolvimento nacional nas próximas décadas. Quando a Câmara e o Senado aprovam a PEC da juventude, abrem caminho à definição de políticas públicas perenes num setor que decidirá efetivamente que novo Brasil teremos. Assegurando direitos à juventude e superando a omissão do texto constitucional, o Congresso abriu larga avenida à consolidação de direitos que só se insinuaram nesses oito anos de mudanças e continuidades. Direitos que se refletirão sobre o conjunto da população brasileira.

Assim, O Parlamento respondeu ativamente à pressão feita pelo Conselho Nacional de Juventude, que reúne um retrato fiel e qualificado da juventude nacional. Esse coletivo mobilizou a Câmara e o Senado, mas a sua representação fez muito mais, numa trilha que uniu governo e oposição e acabou por afirmar políticas públicas como o PROUNI, o PROJOVEM, os Pontos de Cultura e o Segundo Tempo, a expansão da educação superior e profissional. Ressaltou sucessão geracional no movimento sindical e no campo, construiu políticas de assistência estudantil enfatizou a importância das mulheres, dos negros e indígenas, dos trabalhadores e estudantes, das pessoas com deficiência, da cultura, da juventude que luta nas periferias. É essa moçada que propõe um Pacto da Juventude ao debate das eleições de 2010 e que compõe um bonito mosaico de movimentos sociais - como a UNE, a UBES, a CTB, a UGT e a CUT -, as juventude políticas, as ONGs, todos os tipos de movimentos.

Foi esse lastro social contemporâneo que extravasou nos blogs, nos portais e na massiva campanha que ganhou o Twitter. Foi essa voz que se fez ouvir na Tribuna de Honra e nas galerias do Senado, é essa a razão da vitória que só anima a mocidade brasileira na luta por mais direitos, pela construção de um novo projeto nacional de desenvolvimento em que possamos ver, como diz a canção que não dá pra esquecer "os meninos e o povo no poder eu quero ver".


Danilo Moreira
Presidente do Conselho Nacional de Juventude
Augusto Chagas
Presidente da União Nacional dos Estudantes
Paulo Vinícius
Secretário Nacional de Juventude Trabalhadora da CTB

PS.: concebido no calor da vitória, no Azeite de Oliva, em Brasília, Distrito Federal

* Cientista social e bancário.
Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Dragão de Jorge


Aposentadoria é quando o Dragão vira donzela, quando a batalha dá lugar ao gozo. Mas o simplesmente gozar não nos foi ensinado. E mergulhamos então na tristeza da depressão.


                                                                                       
   Rubem Alves*              

Sou Professor universitário, no gozo da liberdade que a aposentadoria  traz, tinha agora tempo para ler os livros que não lera, fazer as viagens que não fizera, ou simplesmente tempo para vagabundear. Sobravam-lhe as razões para viver o que William Blake escrevera: "No tempo de semear, aprender; no tempo de colher, ensinar; no tempo do inverno, gozar...". Seu inverno chegara. Estava aposentado, livre da compulsão prática que o trabalho impõe. Podia entregar-se a realizar os sonhos com que sempre sonhara. Chegara o tempo de gozar.

 
Minha cabeça, ao se defrontar com um enigma, faz o que faziam os gregos: ela inventa histórias, mitos. Pois foi isso que aconteceu. Baixou-me a história que passo a contar para explicar a incapacidade de gozar quando é tempo de gozar. "Desde muitos séculos, São Jorge fora um habitante da Lua. Romântica quando vista da Terra, a Lua era a arena de uma batalha diária entre o Santo Guerreiro e o Dragão da Maldade. Todas as manhãs, ao acordar, São Jorge sabia: havia uma missão que só ele poderia cumprir.

Era esse sentimento quase religioso de missão e de dever que dava sentido à sua vida. Bem que ele poderia ter matado o Dragão séculos antes. Mas ele sabia que se matasse o Dragão sua vida se transformaria num tédio sem fim: nada para fazer, nenhuma missão a cumprir. Sua máxima espiritual era 'Pugno, ergo sum': luto, logo existo. São as batalhas que dão sentido à vida.

Aconteceu, entretanto, algo de que ninguém suspeitava. O Dragão era, na verdade, uma linda donzela que uma bruxa invejosa havia enfeitiçado e mandado para a Lua. Mas como todo feitiço tem um prazo de validade, chegou também o dia em que a validade do feitiço chegou ao fim e se desfez: o horrendo Dragão foi transformado numa linda donzela.
São Jorge, que tudo ignorava, acordou na manhã daquele dia como acordava todos os dias, determinado a cumprir o seu destino que era dar combate ao Dragão. Com lança, armadura e espada saiu o guerreiro em seu cavalo. Mas qual não foi o seu susto quando, em vez de um Dragão, o que o esperava era um ser que lhe era totalmente estranho: uma linda donzela.

E a donzela com suas vestes entreabertas o recebeu com palavras de amor e gozo: 'Venha, Jorginho, provar do meu carinho e do mel dos meus beijos...' São Jorge ficou paralisado de susto e medo. Não sabia o que fazer. Essa entidade estranha não estava registrada em sua memória. Não lhe fora ensinada na escola. Fora educado a vida inteira para a batalha. Era a batalha que dava sentido à sua vida. E agora ele se defrontava com a possibilidade de simplesmente gozar sem nada fazer...

São Jorge nem desceu do seu cavalo. Voltou para onde viera triste e deprimido, com saudades dos tempos do Dragão. O Dragão dava sentido à sua vida. Ele definia a sua identidade: ele era um guerreiro... Agora, perdida sua identidade, perdeu-se também o sentido de sua vida.

Não lhe fora ensinada na escola a arte do gozo, de não ter deveres a cumprir. Sua vida tornou-se, então, um grande vazio. Quanto à linda donzela, apesar de linda, não foi apreciada. São Jorge olhava-a com aquela sensação saudosista dos tempos do Dragão...";

(*) Rubem Alves é escritor, educador e psicanalista

Mais três estados criam juizados de violência contra a mulher

Dos 27 estados brasileiros, somente quatro ainda não possuem Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que foram criados pela Lei Maria da Penha. Recentemente os estados do Piauí, Tocantins e Roraima promoveram a instalação desses juizados. Com isso, apenas os estados de Santa Catarina, Paraíba, Rondônia e Sergipe ainda não possuem esses juizados especializados.

 

De acordo com a presidente da Comissão de Acesso à Justiça e Cidadania do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conselheira Morgana Richa, a 4ª Jornada da Lei Maria da Penha, realizada em março deste ano, e os Mutirões da Cidadania do Conselho pretendem que todos os estados possuam os juizados até o final deste ano.

Segundo ela, os estados de Santa Catarina, Paraíba e Rondônia estão preparando cronograma para criar as unidades até o final do ano. “Em Rondônia, há a previsão de aprovação de uma lei nos próximos dias para autorizar a criação do Juizado”, explica Morgana.

A conselheira Morgana esclarece que a meta de 100% de juizados de Violência Doméstica instalados proporcionará um atendimento mais adequado às mulheres. “É necessária uma estrutura exclusiva e apropriada, pois trata-se de um tema muito delicado”, afirma.

A conselheira destaca que mesmo com as limitações e dificuldades do Judiciário local é preciso ampliar as políticas públicas voltadas para as mulheres vítimas de violência. “O Judiciário precisa priorizar aspectos essenciais na seara dos Direitos Fundamentais, onde se inserem os grupos de maior vulnerabilidade”, opina.

Até março deste ano, havia 43 Juizados especializados em Violência Doméstica contra a Mulher, sendo que alguns estados possuíam mais de um juizado, como no caso do Rio de Janeiro com seis unidades. Atualmente, há 46 juizados em todo o país. Até o final deste mês haverá 48, pois o Tribunal de Justiça de Tocantins criará uma unidade em Araguaína e outra em Gurupi. Segundo informações prestadas ao CNJ por esses juizados, há aproximadamente 195 mil processos em andamento referentes a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Agência CNJ de Notícias


http://www.vermelho.org.br/noticia
Bolívia quer que água seja declarada direito humano irrevogável 

O presidente da Bolívia, Evo Morales, anunciou nesta segunda-feira (13) que seu governo apresentou perante as Nações Unidas um projeto de resolução para que o acesso à água seja um direito humano irrevogável. Em entrevista coletiva no Palácio de Governo, Morales ressaltou que o direito à vida, incluído na carta de Direitos Humanos da ONU, "é impossível" sem a água. "Meu pedido, desde a Bolívia, aos presidentes e aos Governos dos cinco continentes que são parte das Nações Unidas, é que aprovem a água como direito humano", sentenciou.

O líder lembrou que a Constituição de seu país, promulgada no ano passado, já considera o acesso à água um direito da população boliviana, e agora espera que se faça o mesmo no organismo internacional. Segundo Morales, isso ajudaria a cumprir com os Objetivos do Milênio para o ano 2015, entre os quais se encontra a dotação de água potável e saneamento em todo o mundo. "Seria totalmente contraditório para as Nações Unidas dizer que aprova como objetivo dotar o mundo de água potável e saneamento, e não declarar a água um direito humano", opinou.

Morales fez uma chamada aos movimentos sociais para que pressionem os Governos "que não querem debater". "Se a água continuar sendo um negócio privado, é uma forma de prejudicar os direitos humanos e por isso deve haver uma resolução para declarar a água um direito humano no mundo todo. (...) Em alguns países, infelizmente, ela está como um direito e negócio privado, quando deveria ser de serviço público", assegurou. Morales explicou que, por causa da mudança climática, a falta de água afeta cada vez mais o mundo. "Sem água não podemos viver, estamos trabalhando para que a água seja declarada um direito humano", concluiu.

De acordo com o embaixador da Bolívia nas Nações Unidas, Pablo Solón, a falta de acesso à água potável e serviços de saneamento de qualidade provoca a morte de uma criança a cada oito segundos, a mais alta taxa de letalidade das patologias no planeta. Para ele, o fato de a água não estar listada entre os direitos humanos obrigatórios tem permitido que as decisões políticas relacionadas ao tema sejam tratadas por instituições que não respondem aos Estados membros da ONU e não se aderem a suas normas. Portanto, “é muito importante que muitos Estados contribuam com esta resolução e que ela seja aprovada com a linguagem clara”, disse o embaixador. A proposta boliviana faz parte de uma das medidas solicitadas na carta de motivos da I Conferência Mundial de Povos e Direitos da Mãe Terra, que aconteceu em abril na cidade de Cochabamba, na Bolívia.

O jornal boliviano Los Tiempos afirma que a solicitação lembra que quando se escreveu a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, ninguém podia prever no dia no qual a água seria uma área de dificuldade, mas que agora não é um exagero dizer que a falta de acesso à água limpa é a maior violação aos direitos humanos no mundo. 

“O mundo precisa de um sinal claro que mostre que a água é um assunto prioritário”, disse Solón. 
Com agências
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia


"Mary e Max – Uma Amizade Diferente"

Cloves Geraldo *

Iguais e diferentes

Animação do diretor australiano Adam Elliot trata de amizade e frustrações que as estruturas sociais causam às pessoas

                As vidas de dois seres quase improváveis permitem ao diretor australiano Adam Elliot discutir as relações sociais nos tempos atuais. A partir da história real da garota australiana Mary Dinkle, 8 anos, e do estadunidense Max Horovitz, 44 anos, ele se vale da animação para estruturar sua narrativa, centrada em estados de espírito, visões de mundo, desencontros amorosos, compulsão consumista e, sobretudo, amizade entre eles. Uma história que atravessa 20 anos, entre altos e baixos, retraimento e fuga da realidade com que ambos se deparam, para manter vivas suas expectativas.
                Elliot, responsável pelo roteiro, direção e animação, estrutura a narrativa de modo a que o espectador não perceba que está diante de personagens que agem como pessoas reais. Vale-se das vozes dos atores Toni Collete (Mary), Philip Seymour Hoffman (Max) e Eric Bana (Damian) para torná-los críveis, próximos dele, espectador. Diferentes das dublagens das animações tradicionais que enfatizam encantamento e medo, jogando com suas emoções.
                Além disso, os ambientes/cenários contribuem para esta verossimilhança. Sombrios, amarronzados; dão densidade ao clima opressivo em que Mary e Max vivem. Móveis, utensílios, fotografias e animais, longe de serem decorativos, são extensões de ambos. Gordinha, inquieta, insatisfeita consigo e com os pais, ela tenta evadir-se de sua casa; ele, obeso, sofrendo da Síndrome de Asperger (espécie de autismo), mal consegue se deslocar pelo seu apartamento. Elliot trabalha-os não com suas fraturas, prefere dotá-los de humor corrosivo, criativo, tornando-os interessantes, simpáticos, até.
                Difícil conduzir uma narrativa assim, sem deixá-la cansar o espectador, por mais que o diretor/amimador tenha encontrado um equilíbrio nas sequências, cenas e entrechos. Trata-se de animação sem grandes lances de ação e desfecho grandioso. Elliot consegue manter o espectador atento pela forma como sua câmera foca os personagens. Ela está sempre próxima de Mary, de sua mãe, de seu galo; sempre situando Max entre móveis, utensílios e seu peixe no aquário. Quando dele se aproxima é para captar suas reações à vida ou para concentrar-se numa carta de ou para Mary.
             Preferências cotidianas unem Max e Mary
             Este tipo de narrativa ajuda o espectador entender o papel dos cenários. Tanto Mary, vivendo no subúrbio de Melbourne,  Austrália,  quanto Max, morando em Nova York, compensam suas carências de formas adversas. Ela tentando escapar à solidão, ao alcoolismo e roubos da mãe; ele entupindo-se de chocolate e fugindo da colega do grupo de tratamento de Asperger consume seu dia vendo tv. No entanto, eles têm em comum gostar do mesmo programa de televisão e compensar suas frustrações convivendo com animais – Mary com um galo, Max com um peixinho.
                Estes são mais que bichos de estimação, viram muletas, substitutos de pais, amigos, amantes, companheiros/as. Mary procura substituir estas compensações à medida que cresce. Consegue alguém para discutir suas carências; Max, cada vez mais velho, mantém-se solitário, comendo cada vez mais chocolates. Elliot nesta caracterização introduz um elemento importante para a compreensão de ambos: o que leva uma garota australiana a se tornar amiga por duas décadas de um estadunidense sem esperança alguma de elevar-se de patamar numa sociedade de massa?
                A resposta é simples: seus pontos em comum. Justamente aquilo que, em princípio, poderia ser improvável. Mas não é. São duas pessoas comuns. Gostam do mesmo programa de TV e adoram chocolate. Através destes marcos de identidade, elas trocam cartas, presentes e ficam cada vez mais próximas. Elliot dota-os de humor e criatividade para mostrar o quanto são diferentes, o  quanto são iguais. Principalmente, quando ela, iniciando a amizade quer saber como surgem os bebês nos EUA.  A resposta que ele lhe dá é hilariante, corrosiva, daquelas que fazem rir e pensar na mordacidade de Max para com padres, rabinos e freiras.
                São nestas sequências que os comentários ácidos do judeu Max e as inquietações da sensível Mary levam o espectador a entender o que, na verdade, quer Elliot. Mostrar como ambos são vítimas das estruturas sociais, capitalistas, feitas supostamente para “o bem estar” e terminam causando dores e frustrações. Max é um faz tudo, ex-comunista, que não sonha com mais nada. Seu horizonte vai apenas até pilhas e pilhas de caixas de chocolate. O de Mary, depois de tentar escapar à solidão, é o de mãe solteira em busca de uma saída. Elliot, mesmo assim, evita cair no pessimismo: Mary encontra nas cartas de Max, pregadas na parede do apartamento dele, a satisfação de tê-lo tido como amigo.
Um belo filme, em que a sobriedade narrativa em off de Barry Humphries ajuda a compreender melhor a natureza humana e as estruturas que os aprisiona. Nem se percebe os recursos de animação usados por Elliot. Eles estão ali para compor um quadro dos tempos atuais, cheios de carências e poucas compensações.

Mary e Max – Uma amizade Diferente” (“Mary e Max”). Drama. Animação. Austrália. 2009. 93 minutos. Roteiro, Direção, Animação: Adam Elliot.


* Jornalista e cineasta, dirigiu os documentários "TerraMãe", "O Mestre do Cidadão" e "Paulão, lider popular". Escreveu novelas infantis,  "Os Grilos" e "Também os Galos não Cantam".

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna