“Em Teu Nome”: Memórias da juventude
Cloves Geraldo *
Filme do diretor gaúcho Paulo Nascimento resgata a luta dos jovens brasileiros contra a ditadura militar 
             Eram garotos que amavam os Beatles  e os Rolling Stones, diz a música. Em “Em  Teu Nome”,
 do gaúcho Paulo Nascimento, eles amavam a revolução e não eram  tão 
garotos assim. Aderiram à luta armada, sangraram nas masmorras da 
ditadura,  foram exilados, retornaram ao Brasil com a anistia, em 1979. E
 nem por isto,  deixaram de viver grandes paixões. Eis e contexto deste 
filme que amplia a visão  da luta da esquerda no país contra a ditadura 
militar (1964/1985). Tira o filme  dos aparelhos, das sombras e lança-o 
nas ruas, no campus universitário e nas reuniões  familiares. É mais 
sobre uma geração do que sobre concepções de luta armada,  embora esta 
esteja presente o tempo inteiro.
            O que buscavam os jovens dos anos  60, época em que a 
Guerra Fria, opunha a ex-União Soviética aos EUA? Apenas  derrubar a 
ditadura militar? Não. Mudar o mundo. Substituir o Capitalismo pelo  
Socialismo. “Em Teu Nome” os mostram  em discussões 
político-ideológicas, ações revolucionárias, tentativas de  escapar ao 
cerco imposto pelos generais. Além disso, o filme transmite uma  
afetividade que escapa às produções que tratam da luta da esquerda no 
país. E  tem sua raiz em “Reds”, de Warren  Beatty, cinebiografia do jornalista revolucionário John Reed, autor de “10 Dias Que Abalaram o Mundo”. Beatty  trata das ações de Reed e seu envolvimento amoroso com a feminista Louise  Bryant.
               Não é diferente neste “Em Teu Nome”. 
Nascimento baseia sua  narrativa na militância do estudante de 
engenharia João Carlos Bona Garcia  (Leonardo Machado) na VPR (Vanguarda
 Popular Revolucionária), formada, em 1966,  por dissidentes da Polop 
(Política Popular) e do MNR (Movimento Nacionalista  Revolucionário), e 
em sua paixão pela universitária Cecília (Fernanda Moro).  Esta 
dualidade narrativa dota o filme de um viés mais próximo da realidade do
  militante, afastado da figura do herói férreo, sem paixões ou emoções.
 O  militante, mesmo no calor da refrega revolucionária, mantém sua 
capacidade de  amar e clareza para levar adiante seu objetivo.
                 Bona, no entanto, não é único  a ter sua história 
enfocada. Outros personagens são tratados com igual força. A  jovem 
calada, introspectiva, Lenora (Silvia Buarque), que sintetiza em si  
outros militantes de esquerda, que tiveram sua vida destroçada pelas 
torturas  sofridas nas masmorras dos generais, caso de Frei Tito; o 
hesitante, radical,  Onório (Marcos Verza), que cobra compromisso dos 
demais, mas fraqueza nas  situações limite; o frade, Professor (Nelson 
Diniz), cerebral, capaz de  conduzir a luta e também amar; o 
sindicalista Higino (Sirmar Antunes),  afrodescendente, que dá o perfil 
operário à organização.
Convicção ideológica fortalece militantes 
            É a luta contra a ditadura militar e a  convicção 
ideológica que dão sentido à vida desses jovens, em meio à  
multiplicidade de lutas na época: de Cuba, de Guevara na Bolívia à 
Guerra do  Vietnã. Mesmo que os generais os torturassem, a maioria 
preservava suas  convicções. Numa simbólica sequência sobre o quanto 
eles, os generais, lhe  infligiam dor, Bona, depois de suplicar por 
comida, devora um malcheiroso  pedaço de carne, enquanto sua família 
degusta frango assado. Esta dialética,  herdada do Eisenstein de “O Encouraçado Potemkin”
 atesta o  sacrifício dele e o sadismo dos generais. É forte o 
suficiente para carecer de  qualquer análise político-ideológica.
           Nascimento, ao basear sua narrativa  na história de Bona, 
teve a oportunidade de ampliá-la, usando a troca de 70  militantes de 
esquerda pelo embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, em  dezembro de 
1970. Com a chegada dos militantes de Porto Alegre a Santiago, no  
governo Salvador Allende, ela, a narrativa, passa a enfocar o dilema dos
  exilados, fato inédito nos filmes sobre a luta armada no Brasil. São 
emocionantes  as tentativas de Bona e Cecília de se tornarem atores e 
inquietante e triste sofrimento  de Lenora. Ambos iriam peregrinar de 
país em país, após a queda de Allende; ele  e Cecília na Argélia, ela em
 Paris, onde depois se encontram.
               Com este leque digno de uma  epopéia, Nascimento 
passeia ainda pelas etapas históricas vividas por eles. De  Bona e 
Cecília lutando para escapar à deportação à luta pela anistia, passando 
 pela tragédia de Lenora, sem dúvida um dos melhores personagens do 
filme. Mas,  em meio à luta pela sobrevivência desses jovens que lutaram
 contra a ditadura  militar, surgem figuras ainda hoje atuantes na 
política brasileira, a mídia  nacional e o papel que jogaram e não jogam
 mais. Serve para mostrar quem  avançou e quem retrocedeu. Basta 
refletir sobre isto a partir das falas de Bona  em Paris. Elas recuperam
 o que os “outrora engajados” querem a todo custo  esquecer.
                “Em Teu Nome” embora não seja uma 
obra prima, inclusive carecendo de  maior rigor estético, pode ser 
colocado ao lado de filmes que contribuem para o  entendimento da 
história recente do país: “O  Desafio”, de Paulo César Serracini; “Vida  Provisória”, de Maurício Gomes Leite; “Pra  Frente Brasil”, de Roberto Farias; “O  Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias”, de Cao Hamburguer.  Mas dá conta do recado. Emociona.
“Em Teu Nome”. Drama. Brasil. 2009. 100 minutos.
 Roteiro: Paulo Nascimento, baseado na  militância de João Carlos Bona 
Garcia. Elenco: Leonardo Machado, Fernanda Faro,  Nelson Diniz, Marcos 
Verza, Sirmar Antunes, Silvia Buarque.
            
      
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 Jornalista e cineasta, dirigiu os documentários "TerraMãe", "O Mestre 
do Cidadão" e "Paulão, lider popular". Escreveu novelas infantis,  "Os 
Grilos" e "Também os Galos não Cantam".
Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna