segunda-feira, 24 de maio de 2010

Fidel: A importância histórica da morte de José Martí

Fazendo abstração dos problemas que hoje angustiam a espécie humana, nossa Pátria teve o privilégio de ser berço de um dos pensadores mais extraordinários que nasceu neste hemisfério: José Martí. Em 19 de maio, completa-se (completou-se) o 115º aniversário de sua gloriosa morte.


Por Fidel

Não seria possível avaliar a magnitude de sua grandeza sem levar em conta que aqueles com os quais escreveu o drama de sua vida também foram figuras extraordinárias, como Antonio Maceo, símbolo perene da firmeza revolucionária que protagonizou o Protesto de Baraguá, e Máximo Gómez, internacionalista dominicano, professor dos combatentes cubanos nas duas guerras pela independência onde participaram.

A Revolução Cubana que, ao longo de mais de meio século, vem resistindo aos ataques do império mais poderoso existente, foi fruto dos ensinamentos daqueles predecessores.

Apesar de que quatro páginas do diário de Martí nunca estiveram ao alcance dos historiadores, o que consta no resto daquele diário pessoal, detalhadamente escrito, e outros documentos seus daqueles dias, é mais do que suficiente para conhecer os detalhes do acontecido. Como nas tragédias gregas, foi uma discrepância entre gigantes.

Na véspera de sua morte em combate, escreveu a seu íntimo amigo, Manuel Mercado: "Já corro todos os dias o perigo de dar minha vida pelo meu país e por meu dever — já que o entendo e tenho ânimos para realizá-lo — de impedir a tempo, com a independência de Cuba, que os Estados Unidos se estendam pelas Antilhas e caiam com essa grande força sobre nossas terras da América. Tudo o que fiz até hoje e farei, é para isso. Em silêncio teve que ser e indiretamente, porque há coisas que, para consegui-las, devem estar ocultas, e de se proclamarem como são, trariam dificuldades muito sérias para conseguir sobre elas o fim".

Quando Martí escreveu estas palavras lapidárias, Karl Marx já tinha escrito O Manifesto Comunista, em 1848, isto é, 47 anos antes da morte de Martí, e Charles Darwin publicara A origem das espécies, em 1859, para citar só duas obras que, na minha opinião, mais influenciaram na história da humanidade.

Marx era um homem tão extraordinariamente desinteresseiro, que seu trabalho científico mais importante, O Capital, talvez jamais se teria publicado se Friedrich Engels não tivesse reunido e organizado os materiais aos quais o autor dedicou sua vida toda. Engels não só se encarregou desta tarefa, mas também foi autor de uma obra intitulada Introdução à dialética da natureza, onde falou do momento em que a energia do nosso sol se esgotaria.

O homem ainda não sabia como libertar a energia existente na matéria, descrita por Albert Einstein em sua famosa fórmula, nem dispunha de computadores que fazem bilhões de operações por segundo, capazes de reconhecerem e transmitirem, ao mesmo tempo, os bilhões de reações por segundo que têm lugar nas células das dezenas de pares de cromossomos que a mãe e o pai entregam em partes iguais, um fenômeno genético e reprodutivo que conheci depois do triunfo da Revolução, buscando as melhores características para a produção de alimentos de origem animal nas condições do nosso clima, que se estende às plantas, através de suas próprias leis hereditárias.

Com a educação incompleta que os cidadãos de mais recursos recebíamos nas escolas, a maioria privadas, consideradas os melhores centros de ensino, tornávamo-nos analfabetos, com um pouco de mais nível que aqueles que não sabiam ler nem escrever ou que frequentavam as escolas públicas.

Por outro lado, o primeiro país do mundo que tentou aplicar as idéias de Marx foi a Rússia, o menos industrializado dos países da Europa.

Lênin, criador da Terceira Internacional, considerava que não havia no mundo organização mais leal às idéias de Marx que a fração bolchevique do Partido Operário Social-Democrata Russo. Embora boa parte daquele imenso país vivesse em condições semifeudais, a classe operária era muito ativa e combativa.

Nos livros que Lênin escreveu depois de 1915, foi crítico incansável do chauvinismo. Em sua obra O imperialismo, fase superior do capitalismo, escrita em abril de 1917, meses antes da tomada do poder como líder da fração bolchevique daquele partido frente a fração menchevique, demonstrou que foi o primeiro em compreender o papel que estavam chamados a desempenhar os países sujeitos ao colonialismo, como a China e outros de grande peso em diversas regiões do mundo.

Por sua vez, a valentia e audácia de que Lênin era capaz foi demonstrada pelo fato de ter aceitado o trem blindado que o exército alemão, por conveniência táctica, lhe proporcionou para transladar-se da Suíça às proximidades de Petrogrado, pelo que os inimigos dentro e fora da fração menchevique do Partido Operário Social-Democrata Russo não tardaram em acusá-lo de espião alemão. De não ter utilizado o famoso trem, o fim da guerra teria surpreendido ele na distante e neutral Suíça, com o qual o minuto ótimo e adequado se teria perdido.

De alguma forma, por puro azar, dois filhos da Espanha, graças a suas qualidades pessoais, passaram a ter um papel relevante na Guerra Hispano-Norte-Americana: o chefe das tropas espanholas na fortificação de El Viso, que defendia o acesso a Santiago da altura de El Caney, um oficial que combateu até ser mortalmente ferido, causando aos famosos Rough Riders — ginetes duros, norte-americanos organizados pelo então tenente-coronel Theodore Roosevelt, que por causa do precipitado desembarque desceram sem seus fogosos cavalos — mais de trezentas baixas, e o almirante que, cumprindo a estúpida ordem do governo espanhol, partiu da baía de Santiago de Cuba com os fuzileiros navais a bordo, uma força seleta, da única maneira possível, que foi desfilar com cada navio, um a um, saindo pelo estreito canal de acesso, tendo em frente a poderosa frota ianque, que com seus encouraçados em linha disparavam com os potentes canhões contra os navios espanhóis, de muito menor velocidade e blindagem.

Logicamente, os navios espanhóis, suas dotações de combate e os fuzileiros navais foram afundados nas profundas águas da fossa de Bartlett. Apenas um desses navios chegou a poucos metros da beira do abismo. Os sobreviventes daquela força foram presos pela esquadra dos Estados Unidos.

A conduta de Martínez Campos foi arrogante e vingativa. Cheio de rancor por seu fracasso na tentativa de pacificar a Ilha, como tinha feito em 1871, apoiou a política ruim e rancorosa do governo espanhol. Valeriano Weyler o substituiu no comando de Cuba; este, com a cooperação dos que enviaram o encouraçado Maine a buscar justificativas para a intervenção em Cuba, decretou a reconcentração da população, que causou enormes sofrimentos ao povo de Cuba e serviu de pretexto aos Estados Unidos para estabelecerem seu primeiro bloqueio econômico, o qual deu lugar a uma enorme escassez de alimentos e provocou a morte de incontáveis pessoas.

Assim se viabilizaram as negociações de Paris, nas que a Espanha abriu mão de todo direito de soberania e propriedade sobre Cuba, depois de mais de 400 anos de ocupação em nome do Rei da Espanha, em meados de outubro de 1492, após afirmar Cristóvão Colombo: "esta é a terra mais formosa que olhos humanos viram".

A versão espanhola da batalha que decidiu a sorte de Santiago de Cuba é a mais conhecida, e sem dúvida houve heroísmo se é analisado o número e a patente dos oficiais e soldados que, numa situação muito desvantajosa, defenderam a cidade, honrando a tradição de luta dos espanhóis, que defenderam seu país dos aguerridos soldados de Napoleão Bonaparte, em 1808, ou a República Espanhola contra a investida nazi-fascista, em 1936.

No ano de 1906, uma ignomínia adicional caiu sobre o comitê norueguês que outorga os prêmios Nobel, ao buscar ridículos pretextos para conceder essa honra a Theodore Roosevelt, eleito duas vezes presidente dos Estados Unidos, em 1901 e 1905. Nem sequer era clara sua verdadeira participação nos combates de Santiago de Cuba à frente dos Rough Riders, e pôde ter muito de lenda a publicidade que recebeu posteriormente.

Eu apenas posso testemunhar a forma em que essa heróica cidade caiu nas mãos das forças do Exército Rebelde, em 1º janeiro de 1959. Então, as ideias de Martí triunfaram em nossa Pátria!

Por Fidel Castro Ruz
Fonte: Granma

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