quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Enfrentando as contradições contemporâneas

José Carlos Ruy *

Ao enfrentar as contradições de nosso tempo, Idéias e Rumos, de Renato Rabelo, dá uma demonstração (mais uma) da atualidade do pensamento marxista.

Idéias e rumos
Renato Rabelo
Editora Anita Garibaldi/Fundação Maurício Grabois
São Paulo, 2009

O filósofo francês Jean Paul Sartre escreveu, em 1960, que o “marxismo é a filosofia insuperável de nosso tempo”. Ele justificou sua tese afirmando que uma filosofia tem essa estatura quando “dá expressão ao movimento geral da sociedade” e indica as tarefas históricas a serem resolvidas em uma época dada. Não se trata de ter maior ou menor adesão mas de exprimir de forma teórica os problemas concretos que os homens enfrentam.

Idéias e rumos, o livro recém lançado de Renato Rabelo, presidente nacional do Partido Comunista do Brasil, é uma demonstração contemporânea, e brasileira, daquela afirmação de Sartre. O livro compendia o enfrentamento de questões práticas e teóricas durante quarenta anos de “militância e aprendizado político”, diz ele. São textos e artigos “divulgados no curso da luta, no calor das exigências de respostas políticas, programáticas, partidárias e práticas, num esforço conjunto de encontrar alternativas para a luta transformadora nos estreitos horizontes do status quo dominante”, com o objetivo de “alcançar uma nação mais avançada, soberana, moderna, justa e solidária”.

Apresentados em três partes – rumo, caminho e instrumento – estes textos historiam a evolução de um pensamento marxista solidamente colado aos problemas reais, das contradições profundas da sociedade brasileira ao enfrentamento do imperialismo em todos os rincões onde ele manifeste sua ação agressiva contra os povos. Contradições do presente que exigem um equacionamento contemporâneo e criativo, distante das velhas e fossilizadas concepções que transformavam a teoria em um receituário pronto a ser aplicado em qualquer nação.

Uma das teses teóricas centrais, nesse sentido, está em um texto publicado em 2001, significativamente intitulado “O socialismo está na ordem do dia?”. Do ponto de vista político ainda não, reconhece. E afirma que, do ponto de vista histórico, “a luta pelo socialismo está na ordem do dia”, no quadro de uma crise capitalista de caráter sistêmico que se agrava e leva a humanidade “ao confronto inevitável de escolher entre o rumo socialista e alcançar novas conquistas civilizatórias, ou retroceder a formas inferiores de convivência social”. Mas o triunfo do socialismo não resultará somente do “agravamento das contradições do sistema capitalista”, mas depende “da ação consciente e organizada dos trabalhadores e seus aliados” cuja luta não arrefeceu depois da crise dos países do leste europeu, mas “cresce e adquire uma nova dimensão a luta pelo socialismo”.

Aquele texto indica, em embrião, teses teóricas de longo alcance que resultaram da constatação de que a situação de defensiva estratégica que resultou do fracasso do Leste Europeu não significou a paralisia da luta dos trabalhadores, mas levou à sua retomada em outro patamar. E que exigia assim dos teóricos e dirigentes comunistas respostas adequadas às contradições do tempo presente, e não a mera reafirmação de textos clássicos.

Ali está esboçada, nesse sentido, a indicação da nova luta pelo socialismo, que será desenvolvida nos anos seguintes. E também a idéia de que sem uma concepção teórica atualizada (o “rumo”, o objetivo estratégico) não se vislumbra a tática (o “caminho”) para se alcançar o início da transição para o socialismo, nem a ferramenta (o “instrumento”) para ela, constituído pelo partido.

No Brasil esta perspectiva foi aberta pela nova etapa da história republicana representada pela eleição de Luís Inácio Lula da Silva em 2002. Ela permitiu o início da superação do neoliberalismo e criou depois a possibilidade de um Novo Programa Nacional de Desenvolvimento, que o 12º Congresso do Partido Comunista do Brasil indica como caminho a seguir para superar as contradições do presente e elevar o país a um novo patamar capaz de abrir as portas para uma sociedade mais avançada.

A tarefa indicada por Sartre ao pensamento avançado – a de refletir as contradições e tarefas históricas de uma época – estão assim delineadas em Idéias e Rumos. À margem de qualquer reflexão livresca ou retórica, os textos ali reunidos têm este sólido compromisso com a realidade e com a luta por um mundo avançado. Nesse sentido, um de seus méritos é a demonstração, mais uma vez, de que o pensamento marxista continua vivo e se renova ao enfrentar os desafios do presente.
 
(Publicado inicialmente em Princípios, nº 105)

* Jornalista, editor da Classe Operária, membro da Comissão Nacional de Comunicação e do Comitê Central do PCdoB; é da Comissão Editorial da revista Princípios

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