Avançar é preciso
Um fato saudável. Na linhagem da mais generosa tradição do pensamento marxista criador, Renato Rabelo (1) levantou questões fundamentais acerca do futuro do movimento revolucionário, essencial a um futuro exitoso para a humanidade e o Brasil. Sua pedagógica intervenção coincide com um momento nacional que requer das forças avançadas uma inteligente postura diante das tentativas de glorificação de um nebuloso passado derrotado no plano eleitoral com a contribuição do PCdoB.
Quando é avaliado o papel da China e dos países emergentes nas circunstâncias da profunda crise dos EUA, Europa e Japão, aflorou-me à memória uma entrevista realizada (ao lado de José Carlos Ruy) com um dirigente do PC da China em dezembro de 2001 – durante o 10º Congresso do PCdoB, realizado no Rio de Janeiro. O comunista chinês ali tangenciou a possibilidade de restauração da bipolaridade e exaltou as excelências de um mundo multipolar. Foi também no Rio, quase dez anos depois, no recente Encontro Internacionalista realizado na UFRJ, que Renato pronunciou sua esclarecedora conferência que confirma tais rumos.
Novo ciclo, nova influênciaÉ nas circunstâncias dessa “nova realidade internacional e de mudança do cenário nacional, levando-se em conta o ciclo político aberto por Lula e continuado por Dilma Rousseff”, que o Brasil é promovido a “uma nova dimensão” também no quadro mundial, realçando-se, no pensamento de Renato Rabelo, “a importância de atualizar a teoria revolucionária”. É quando o movimento comunista “começa a recuperar sua influência no processo de acumulação de forças (no sentido ideológico, político e prático da influência concreta na sociedade)”. Uma reflexão assim posta é um vigoroso sopro renovador num país que vive hoje um ambiente auspicioso, mas ameaçado, aqui ou acolá, pelo velho pensamento neoliberal que busca a estagnação e a imbecilização da política.
Por vezes, tacitamente assimilado pela fase inercial que sucedeu ao desaparecimento de circunstâncias e lideranças que marcaram o curso histórico significativo da trajetória republicana – a exemplo de João Amazonas de Sousa Pedroso, Mauricio Grabois, Leonel de Moura Brizola, Miguel Arraes e outros tantos exemplares do pensamento nacional e de extração patriótica e popular. Boa parte deles eliminada com a ferocidade planejada para que nada restasse desse capital político da soberania e do desenvolvimento — voltado para a realização do Brasil como nação justa, igualitária e grande potência no contexto mundial.
FHC: o paladino ocasionalNeste elo, entre as tarefas mais atuais coloca-se uma, muito especial, que trata de resgatar o gigantesco atraso proporcionado pelas quatro décadas perdidas que se remontam aos períodos do regime militar (1964-1985) e neoliberal que acometeu o país (ao longo dos anos 1990 até 2002).São períodos na essência complementares, articulados e siameses, e raros intervalos nos quais trataram de consagrar a transição negociada – que, da Nova República a Fernando Henrique Cardoso, transitando pela vitória de Fernando Collor, já em 1989, lograram barrar a efetivação de avanços a uma transição de ruptura. Um desdobramento cirúrgico à destruição do pensamento nacional alcançado na ditadura.Emblemática da atual presença deste velho pensamento derrotado em 2002, 2006 e 2010, foi a recente (e bizarra) glorificação do mesmo FHC, que reaparece “forçando a barra” como ocasional paladino da (possível) descriminalização da maconha. Mas o que se torna impossível à nação é tragar seu conservador perfil fisiológico entreguista e embusteiro da chantagem inflacionária.
Em seu conjunto, destacaram-se, neste cenário, sinais dessa pasmaceira plasmada de ternura cínica e que, na plácida “maresia”, ainda subsiste às transformações requeridas e aos avanços acenados nas três recentes eleições presidenciais. Tudo em nome de uma “estabilidade” que custa ao país uma maquiada instabilidade e sua ruptura com o prodigioso passivo construído pela mesma elite estelionatária que “pensou” o Plano Real à “luz” do Consenso de Washington — e, na tradição, aqueles 502 anos de solidão, monopólio fundiário da propriedade territorial, cidades infladas e apartadas, perversa e secular espoliação do trabalho voltada para a acumulação, vandalismo, truculência, miséria e agudas contradições.(1) Renato Rabelo, presidente do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) palestrou sobre “Os desafios dos Partidos Comunistas no século 21” e, no seminário "Governos de esquerda e progressistas na América Latina e no Caribe - Balanço e perspectivas", aprofundou sua análise acerca da natureza, do atual estágio e das agudas repercussões da crise do capitalismo.
Luiz Carlos Antero *
Luiz Carlos Antero *
* Desde o início dos anos ‘70 atuou no Jornal dos Esportes, O Globo, Última Hora e Diário de Noticias, nos semanários Opinião e Movimento. Assessor parlamentar no Congresso Nacional desde 1995.