quarta-feira, 28 de julho de 2010

Lei Maria da Penha Neles!

Jandira Feghali *


A violência contra a mulher desconhece barreiras de classe, religião, instrução ou geografia. Seus índices sempre revelaram uma histórica impotência das instituições em coibi-la de forma vigorosa e mesmo a incapacidade de se prover uma consciência coletiva que gerasse um ambiente propício às necessárias mudanças estruturais, em especial no sistema de justiça, para transformar a cultura jurídica dominante, que hoje ainda se mostra dissociada da normativa internacional dos direitos humanos das mulheres, como demonstram as notícias provenientes de pesquisas acadêmicas e dos jornais, onde as denúncias nem sempre levam ao prosseguimento processual.

Numa sociedade de nítida desigualdade de gênero as mulheres ainda enfrentam preconceitos, muitas vezes de seus próprios familiares, e, em grande parte, optam pelo silêncio. Mas após a existência da Lei Maria da Penha, esse quadro vem mudando. Muitas conseguem ultrapassar esta barreira, denunciam e buscam ajuda, querem uma resposta efetiva do Estado: levar o processo até as últimas consequências, ou no mínimo, evitar o pior, ou seja, proteção suficiente para sua vida e a de seus filhos.

Nos últimos dias, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres - SPM, órgão vinculado à Presidência da República, divulgou dados que registram o aumento, nos cinco primeiros meses desse ano, de 95% no número de denúncias recebidas pelo 180 - a Central de Atendimento à Mulher - em relação ao mesmo período do ano passado. A Central registrou 271.719 atendimentos de janeiro a maio de 2010. Em 2009, o número deste período corresponde a 138.985 atendimentos. Isto não significa que aumentou o número de casos.

A lei, portanto, ampliou a visibilidade da trágica violência cometida, principalmente por aqueles que gozaram da intimidade, do afeto e do convívio com a mulher. A estatística continua a perseguir nossa luta, mas hoje temos instrumentos para reduzi-la.

O reconhecimento do crime de violência contra a mulher é recente historicamente. Vista como “objeto de posse” ou “produto”, qualquer ato de violência contra ela seria considerado natural, como expressam, sem escrúpulos, alguns homens com forte aparição de mídia e, por isso, uma péssima referência para a sociedade e para os jovens. Antes da Lei Maria da Penha, a agressão contra a mulher era considerada crime de menor potencial ofensivo, tratada nos Juizados Especiais Criminais e frequentemente respondida com o pagamento de cestas básicas. A Lei criou os Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e vedou penas desproporcionais ao dano produzido, que terminavam por humilhar as mulheres e reforçar os estereótipos que é dever do Estado combater.

A lei “pegou”, afirmo sem medo de errar, pois está marcada pela sociedade, já mudou comportamentos de homens e mulheres e impediu muitas agressões e mortes. Mas também afirmo sem medo de errar, que o seu descumprimento tem permitido barbaridades como a que diariamente é estampada em todas as mídias.

Falta aos milhares de chefes de Executivo e Judiciário estabelecer prioridade para a prevenção e o combate à violência contra a mulher, sobretudo a produzida no âmbito doméstico e ou familiar. É preciso determinar orçamentos sensíveis à questão, criar número suficiente de Juizados Especiais e outros serviços de apoio, com pessoal especializado, como por exemplo atendimento médico-legal apetrechado para dar conta de desafios como compreender o fascínio que a vítima de violência muitas vezes nutre por seu agressor/torturador e que lhe reduz a percepção do risco e obscurece as possibilidades de reação, treinar seus profissionais, assumir as ações de prevenção e atendimento, determinar as medidas de urgência, e acabar com interpretações errôneas às explícitas linhas e significados do texto da Lei. Como omitir proteção por erro de interpretação, não reagir a expressões que vulgarizam a violência, não dar seguimento a processos, ser tolerante com mau comportamento quando temos poder hierárquico para punir!? Todos essas configuram atitudes inaceitáveis, venham de homens ou mulheres que assumem cargos de comando e decisão.

A atuação do movimento feminista brasileiro, desde o slogan “quem ama não mata”, provocou nova dimensão à dramática realidade. Reagiu e enfraqueceu o manejo da tese da legitima defesa da honra, comumente arguida em casos de assassinatos como os de Ângela Diniz e tantos outros. Além disso, partiu para a mobilização do Legislativo, com a determinação de criar uma lei especial para enfrentar e coibir esse grave fenômeno social. É preciso que a Justiça recepcione, integralmente, a Lei especial conduzida pelos anseios e necessidades das mulheres – Lei Maria da Penha!

A lei Maria da Penha existe!

Escrita a partir da ausculta e observação da vida real em todo o Brasil, exige seu cumprimento por muitas vozes e mãos. A sociedade brasileira precisa imediatamente criar um movimento suprapartidário pelo cumprimento da Lei Maria da Penha, envolvendo homens e mulheres desejosos de um mundo de igualdade substantiva de direitos, sem impunidade! As mulheres, em especial, precisam deixar de figurar como vítimas, muito menos vítimas passivas.

Com a palavra, a Justiça!

* Foi deputada estadual, quatro vezes deputada federal, secretária de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia de Niterói e Secretária municipal de Cultura do Rio de Janeiro. Relatou a Lei Maria da Penha.
 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Criança, TV e batata frita

 
Sidnei Liberal *


15% das nossas crianças já são consideradas obesas e 30% estão acima do peso normal para a idade. Em todo o mundo, pelo menos 42 milhões de crianças com menos de 5 anos estarão obesas ou acima do peso até o fim deste ano de 2010. Destas, quase 34 milhões vivem em paises em desenvolvimento, como o Brasil. São dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), divulgados em matéria de Carolina Khodr, especial para o Diário de Pernambuco1de 17/07/2010.  Outro dado a ser avaliado: 50% da publicidade na TV são dirigidas às crianças. É aí onde a criança é estimulada ao uso do refrigerante, que contém cerca de 3 colheres de sopa de açúcar. Há outra colher para cada bola de sorvete. Cada biscoito recheado contém 60% do seu peso em açúcar.

Cifras preocupantes de gordura saturada dão a cremosidade e o sabor aos biscoitos recheados, aos sorvetes, salsichas e pizzas. O sal de uma Coca-cola “zero”, de um salgadinho, pizza, salsicha, altera o equilíbrio hídrico do organismo da criança, com retenção de líquido e aumento do peso corpóreo e da pressão arterial. O aumento do consumo de refeições industrializadas e de alimentos com excessos de açúcar, sal e gordura é um risco para a saúde e assusta os especialistas. São os riscos que a publicidade desses tipos de produtos agora é obrigada a deixar claro ao consumidor. É a nova resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quem diz.  
Uma pesquisa do Ministério da Saúde mostra uma progressiva queda no consumo de alimentos saudáveis, substituídos por produtos industrializados e refeições prontas. São estes os novos vilões de uma alimentação inadequada, por excesso de açúcar, sal e gordura, que, consumidos com frequência, são responsáveis por sérios problemas de saúde. Informações que justificam as novas regras da Anvisa, que introduzem veiculações de alertas nos comerciais de televisão e rádio. Um texto como “o produto tal contém muito açúcar e, consumido em grande quantidade, aumenta o risco de obesidade e cárie dentária”, será corriqueiro em nossas guloseimas.

Além disso, a Anvisa estabeleceu limites para os constituintes de cada classe de alimentos. Assim, num pacote de 100 gramas de biscoitos recheados, que contém cerca de 60gramas de açúcar, a doçura não pode mais passar de 15 gramas. Nos salgados, o limite de gordura saturada passa a ser de 5%. De sal (sódio), apenas 0,4%. Razões sobram ao governo para incidir numa desordem alimentar que, de acordo com a OMS, leva mais de 45% da população brasileira ao excesso de peso e cerca de 20% à obesidade. Excesso de peso e má alimentação desencadeiam problemas cardiovasculares, responsáveis principais pelos óbitos no País.
Como explica a Anvisa, os brasileiros, especialmente os jovens, “são muito influenciados pelas propagandas. A iniciativa da Anvisa visa a proteger os consumidores da omissão de informações e da indução ao consumo exagerado”. E "os alertas nas propagandas vão possibilitar a reflexão do consumidor, para que ocorra uma mudança de comportamento, desestimulando os excessos. Essa medida reflete a capacidade e o dever do Estado de proteger a população".

Informa Carolina Khodr que em sua última assembleia, realizada em Genebra, 2010, a OMS “recomendou que os países adotassem medidas para reduzir o impacto da propaganda de alimentos pouco nutritivos sobre as crianças, já que as escolhas delas influenciam em até 80% as compras feitas pela família”. As crianças, segundo fonte da Fundação Oswaldo Cruz, “são estimuladas por sons, cores e imagens, são tentadas pelas logomarcas e seduzidas pelos presentes oferecidos com os alimentos". Como conseqüência, altos riscos de alterações metabólicas, obesidade, hipertensão arterial.

Há na matéria do bravo e eterno Diário de Pernambuco uma pequena menção à responsabilidade compartilhada da mídia, em especial a Televisão, por este risco à saúde dos nossos adultos e da nossa infância. A preocupação é procedente e não poderia estar ausente do debate nacional no atual cenário eleitoral. Pautar sua discussão, entretanto, não é fácil. É o que demonstra a irada reação dos donos do poder midiático a um programa prévio de uma das candidaturas a presidência, por conter indícios de discussão sobre o papel dos meios de comunicação no Brasil. À luta, pais!
(1) http://www.diariodepernambuco.com.br/2010/07/17/brasil6_0.asp

* Médico, membro da Direção do PCdoB – DF

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Meio ambiente

Eron Bezerra *
 

Atualmente, como nós sabemos, a questão ambiental é usada como pano de fundo de um objetivo ideológico específico: o bloqueio da Amazônia e a sua eventual internacionalização.


Os fatos que sustentam essa afirmativa são abundantes e nem vale apenas enumerá-los. São por demais evidentes para que alguém isento ouse questioná-los. Mas devemos ter o cuidado de separar o discurso reacionário pró-internacionalização daqueles que efetivamente demonstram real preocupação com a sustentabilidade.

A forma predatória de uso dos recursos naturais está comprometendo a existência da nossa espécie e de dezenas de outras espécies de terráqueos sobre a face da terra. E, por isso mesmo, reclama outro modo de produção se é que temos interesse em continuar usando tais recursos.

A pesquisa certamente vai responder a muitas interrogações e questionamentos que hoje ainda não tem respostas satisfatórias. Isso não deve nos paralisar. O nível de conhecimento cientifico e tecnológico atual nos permite manejar florestas, espécies florestais e animais outrora ameaçados de extinção, andar de avião ou carro movido a hidrogênio e dispor de toda uma gama de produtos “limpos”. Todavia, na etapa atual do capitalismo, o uso desses produtos é condicionado pela lucratividade, o que obviamente tem restringido a sua utilização e o seu alcance.

Assim, esse tema figura em todas as rodas de debate. Freqüenta a academia e o mundo político de forma intensa e é manejado de acordo com a concepção ideológica do interlocutor de plantão, seja o produtivismo, o santuarismo ou o sustentabilismo.

Não é inusitado, portanto, que a 62ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), o mais importante encontro de pesquisadores do país tenha pautado esse tema para reflexão. É uma grande oportunidade para se tratar o assunto com a seriedade que se impõe na prazerosa capital potiguar.

A preocupação real e sincera com a questão ambiental não é nova. Mas nenhum pensador de vulto dedicou a atenção que o tema requer. Compreensível. A consciência é produto da realidade material objetiva. E realidade objetiva era “crescimento rápido”.

Amazônidas de grande visão como Artur Cesar Ferreira Reis, Araujo Lima, Djalma Batista, Agnelo Bittencourt e Samuel Benchimol já revelavam grande preocupação com o tema, num momento em que a questão ambiental ainda não era “modismo”. E mais recentemente o poeta Thiago de Melo e o jurista Bernardo Cabral têm dedicado boa parte de suas elaborações teóricas em torno desse tema. Thiago fez da poesia o seu escudo para a defesa sincera da questão ambiental. Cabral fez da defesa recorrente da importância da água a sua causa maior, tanto como parlamentar quanto como articulista.

Esforço-me para dar a minha modesta contribuição a esse tema. Por isso aceitei com prazer suspender a campanha por um dia para vir a 62ª Reunião Anual da SBPC, a convite do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) para fazer o lançamento de meu livro “Amazônia, esse mundo à parte”, no qual eu procuro abordar a complexidade amazônica, sua cultura, sua gente, seus mistérios.

A luta de idéias é algo permanente e nem sempre sutil. Precisamos assegurar que a sustentabilidade seja concepção real de desenvolvimento e não retórica para os produtivistas que apenas querem mascarar seu caráter predador ou para os sustentabilistas que tão somente recorrem ao palavrório para impedir todo e qualquer uso de nossos recursos naturais.

* Engenheiro Agrônomo, Professor da UFAM, Deputado Estadual, Membro do CC do PCdoB, Secretário Nacional da Questão Amazônica e Indígena.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Levantar as bandeiras da juventude, para avançar nas mudanças

  

André Tokarski *

Estamos na terceira semana oficial da campanha eleitoral e o tema das eleições já contagia boa parte do povo e da juventude. Os primeiros movimentos já deixaram claro que vivemos uma verdadeira guerra eleitoral, de intensa disputa e combate. A juventude brasileira jamais se furtou a um bom combate e agora não será diferente.


É durante as eleições que a política transita com mais facilidade no dia a dia do povo. Vira assunto na escola e no trabalho, dentro de casa e na mesa do bar. Ao seu próprio modo, os trabalhadores e trabalhadoras, estudantes, jovens, mulheres, todos discutem o que pode mudar na sua vida com o processo eleitoral.

A eleição presidencial de 2010 tem características únicas, que devem servir para chamar a nossa atenção para os impactos do seu resultado. O Brasil vive um ciclo de crescimento e desenvolvimento não visto há décadas. Os êxitos obtidos com o Governo Lula transformaram a vida de milhões de brasileiros e brasileiras. Em especial para a juventude, nunca vivemos um período de tantas conquistas importantes. Os sonhos da juventude estão se transformando em realidade e temos a consciência de que existe espaço para mais avanços.

Nos últimos sete anos, mais de 600 mil estudantes de baixa renda tiveram acesso ao Prouni. O REUNI dobrou o número de vagas nas universidades federais, foram criadas mais de 214 escolas técnicas federais. O Projovem beneficiou milhares de jovens com bolsas remuneradas para incentivando a volta à escola e a formação profissional. O Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) é um espaço de debate e formulação de propostas com a participação organizada da juventude. E há duas semanas escrevemos o nome da juventude brasileira na Constituição da República.

A UJS tem propostas e compromissos com o Brasil, toda a sua militância deve se empenhar de corpo e alma na campanha eleitoral, apresentado suas propostas e mobilizando a juventude.

Devemos atuar em duas frentes:
1- denunciar com veemência o risco do retrocesso que viveria o nosso país com a eleição de Serra. Volta das privatizações, do desemprego e da marginalização da juventude.
2- Apresentar nossas bandeiras e propostas: reconhecimento da juventude como agente estratégico do novo projeto nacional de desenvolvimento, criação do Sistema Nacional de Juventude, defesa do 50% do Fundo Social do Pré-sal para a educação.

É no debate de conteúdo e na comparação de projetos que vamos conquistar a confiança da juventude e a mobilização social necessária para a construção de um projeto de governo mais ousado, que aprofunde as mudanças iniciadas com o governo Lula.

Por isso, é tarefa de todo militante da UJS participar ativamente das eleições, em todos os âmbitos e espaços, na escola, no trabalho, nas redes sociais, em casa... Devemos lutar para eleger Dilma, mais também nos empenharmos com muita força na eleição de Governadores, Senadores, Deputados Federais e Estaduais comprometidos com as bandeiras da UJS e da juventude.

Vamos à luta!

* 26 anos, é Presidente da UJS e membro do Comitê Central do PCdoB. Publica seus artigos também no blog: http://juventudenarede.wordpress.com

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Brizola Neto: O racismo de O Globo

Pode-se discutir uma política de cotas no ensino. Pode-se discutir se essa é a maneira mais eficiente de buscar equilíbrio de oportunidades num país que tem na divisão social a marca da herança escravagista. Agora, é repugnante que um jornal como O Globo, em seu editorial de hoje (domingo, 25), negue até que tenha havido racismo no Brasil.


Por Brizola Neto, em seu blog "Tijolaço"

Pode-se discutir uma política de cotas no ensino. Pode-se discutir se essa é a maneira mais eficiente de buscar equilíbrio de oportunidades num país que tem na divisão social a marca da herança escravagista. Agora, é repugnante que um jornal como O Globo, em seu editorial de hoje (domingo, 25), negue até que tenha havido racismo no Brasil, sob o argumento de que na nossa sociedade miscigenada até negros foram donos de escravos e chamar os movimentos de afirmação da cultura negra de “falanges racialistas”, francamente, é assumir o padrão “Da Costa” de debate político.

É uma mistificação dizer que até os EUA estão “relativizando” a pol´tica de ações afirmativas para os negros e que, por isso, o Brasil estaria na contramão da história. Ora, eles podem estar até atenuando certas políticas, porque tiveram mais de três décadas de ações afirmativas para os negros que, embora ainda estejam na parcela mais humilde da população americana, ao lado dos latinos, já conseguiram, até, ter um deles como presidente da República.

Ontem mesmo o jornal publicou uma matéria mostrando que, entre os pobres, a chance de uma criança não superar o baixo grau de instrução de seus pais é de cerca de 60%. Então, é legítimo dizer que, sem políticas de estado que os insira na competição, a identidade entre ser negro, ser pobre e ter baixo nível educacional persista no Brasil.

Como disse, é perfeitamente saudável discutir qual a forma que devem assumir as ações afirmativas em nosso país e, com todos os defeitos que se possa apontar, a política de cotas foi a única coisa que já se fez neste sentido. Se é preciso modificá-la, que haja o debate. Mas, francamente, o que se quer em lugar dela é o nada, a eternização das diferenças de oportunidade.

A elite brasileira faz assim. Diz que não pode haver tratamento discriminatório de espécie alguma. Mas só quando é para proteger os mais pobres. Quando a discriminação – real, objetiva, concreta – se dá pelo poder econômico isso é democracia, é a “lei do mercado”.

Ou então que o “tratamento diferenciado” aos nossos irmãos negros continue a ser dado apenas no setor onde já é tradicional: nas batidas policiais.
 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

                         Wikileaks vaza vídeos que mostram crimes de guerra no Afeganistão         

Nesta segunda-feira (25) ocorreu o que se tem chamado na mídia de "uma das maiores fugas de informação de inteligência militar da História. O site Wikileaks, que se transformou no principal meio para divulgar os excessos militares, repassou uma informação a três meios de comunicação ocidentais — The Guardian (britânico), Der Spiegel (alemão) e The New York Times (Estados Unidos) — que envolve tropas americanas.

 

A maciça quantidade de informações que o site abarca desde janeiro de 2004 até dezembro de 2009 e o teor delicado do conteúdo converte a divulgação em um incidente de vazamento de informações mais importante dos tempos modernos.

As ações detalhadas de mais de 90 mil incidentes publicados envolvem militares americanos, forças da Otan, tropas britânicas, francesas e polonesas e expõem um cenário sombrio e pouco convincente em relação aos "avanços" que, segundo o governo americano, teriam ocorrido no Afeganistão.

Segundo esses três meios de comunicação, entre as ações secretas mais delicadas que vieram à tona estão:

  • A existência de uma unidade especializada (paramilitares) em assassinatos de líderes talibãs e guerrilheiros sem nenhum julgamento ou tribunal.
  • Centenas de incidentes nos quais civis acabam mortos ou feritos por causa das tropas invasoras.
  • O uso crescente de dispositivos letais de controle remoto por parte da coalizão.
  • Comos os EUA ocultaram a aquisição de mísseis terra-ar por parte das forças talibãs.
  • A falta de cooperação dos militares do Paquistão na luta contra os guerrilheiros que os EUA estão combatendo e até a participação direta deles no auxílio a esses guerrilheiros.
  • O ocultamento sistemático dos assassinatos de civis inocentes por parte das forças de ocupação.

A divulgação desses documentos acontece em um momento tenso, já que aumentou a dúvida sobre a viabilidade da guerra no Afeganistão entre o público americano e certos setores do Congresso, que há pouco aumentaram ainda mais com a renúncia do comandante das tropas no Afeganistão, Stanley McChrystal. A própria existência dessa guerra e os métodos de contra-guerrilha estarão na mira de um questionamento mais profundo.

A reação da Casa Branca foi de criticar a publicação pelo Wikileaks, alegando que a divulgação dessa informação de inteligência coloca em perigo seus efetivos no Afeganistão e também a sua segurança nacional. O governo americano não fez nenhum esforço para ocultar o que é agora uma aberta perseguição aos criadores e informantes do Wikileaks.

A Wikileaks colocou novamento o governo dos Estados Unidos na defensiva com esse vazamento de documentos secretos, desta vez relacionados com a ocupação do Afeganistão. O fundador do site, Julian Assange, explicou sua decisão de publicar os documentos como parte da obrigação de "bom jornalismo", que deve se encarregar de desmascarar os "abusos daqueles no poder" e que esses documentos iluminam "a verdadeira natureza da guerra", para que o público "no Afeganistão e em outros países conheçam a verdade e possam assim lidar com este problema".

Os incidentes redigidos em códigos e jargões militares detalham desde assassinatos de civis até uma quantidade inusual de incidentes de "fogo amigo", passando por numerosos incidentes de fogo entre tropas do Afeganistão e das forças de ocupação.

O arquivo completo está disponível para se baixar a partir da página da Wikileaks (no momento de publicação deste texto, o site estava indisponível).

Da redação, com informações da revista Amauta.

http://www.vermelho.org.br/noticia

Deus e o destino não são responsáveis pela pobreza, diz Dilma

Ao se reunir no último sábado (24) com evangélicos em Brasília, a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, pediu o apoio dos religiosos para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros, se eleita.

 

A candidata disse que Deus e o destino não podem ser responsabilizados pela pobreza e os infortúnios. Segundo ela, “a mão imperfeita” das pessoas que conduz mal as políticas públicas.

“A pobreza não é resultado do destino. Não foi Deus que construiu um país tão desigual. Foi a mão imperfeita de homens e mulheres. Isso acontece quando nos afastamos dos desígnios de Deus”, afirmou Dilma, na sede nacional das Assembleias de Deus no Brasil. “Está nas escrituras, o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem no dia seguinte.”

Acompanhada pelo candidato a vice-presidente na chapa PT-PMDB, deputado federal Michel Temer (PMDB), do chefe de gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, parlamentares, candidatos nas próximas eleições e líderes evangélicos, Dilma fez um discurso de pouco mais de 20 minutos citando várias passagens bíblicas.

Segundo a candidata, o objetivo dela, se eleita, é dar continuidade a vários projetos iniciados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Eleita, vou dar continuidade ao projeto do presidente Lula e aprofundar [em várias áreas]”, afirmou Dilma. “O povo evangélico deste país também é o povo do governo Lula.”

Para Dilma, os programas sociais devem considerar o apoio à solidez familiar e também às questões relativas aos jovens, às crianças, aos idosos e aos deficientes.

Segundo ela, para assumir um cargo de comando e por em prática as metas definidas é preciso lembrar do pedido do rei Salomão – que governou Israel por 40 anos e foi considerado um dos mais sábios. “Quero ter sabedoria e discernimento nesta caminhada”, disse ela.

O presidente das Assembleias de Deus do país, deputado e pastor Manoel Ferreira (PTB-RJ), defendeu a candidatura de Dilma. Segundo ele, o Brasil está no rumo certo e por isso não há razão para mudar a orientação política. “Temos aqui a timoneira [Dilma]. Estamos no rumo certo, então por que mudar?”, afirmou.

Fonte: Agência Brasil

Paulo Henrique Amorim: o Mainardi vai embora sem pagar o que deve

Amigo navegante me telefona para dizer que o Diogo Mainardi escreveu na Veja, a última flor do Fascio, que vai embora.

Por Paulo Henrique Amorim, no Conversa Afiada

(O meu simpático zelador tem instruções para não entregar o exemplar da Veja em casa. Ele corresponde a uma assinatura que não é paga desde tempos imemoriais, diria o Mino Carta. Não quero que o Daniel Dantas me processe por furto …)

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Isso é um perigo. O Mainardi me deve dinheiro. Ele perdeu no Supremo Tribunal Federal, por decisão do Ministro Toffoli, recurso em uma causa que movo contra ele. Contra ele e o patrão, o Robert(o) Civita.

Ele disse na revista do patrão que eu recebia dinheiro de quem eu não recebia. Como aquele advogado de Dantas que, por isso mesmo, também me deve um dinheiro. Interessante que o próprio Mainardi foi quem disse que só escrevia por dinheiro.

Amanhã, vou perguntar ao José Rubens Machado de Campos como faço o Mainardi me pagar. Preciso do dinheiro para enfrentar as 962 causas que o Daniel Dantas move contra mim. Numa, já ganhei por 3 a 0.

Interessante: uma ideia me passou pela cabeça: será que existe algum nexo entre Mainardi e Daniel Dantas? Será que a fuga de um não prenuncia a do outro?
 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

Cuba celebra revolução em Dia Nacional de Rebeldia

 

Os cubanos comemoram, nesta segunda (26), o 57º aniversário do assalto ao Quartel Moncada. A data, maior festa da Revolução, é conhecida como o Dia da Rebeldia Cubana. O presidente Raúl Castro comandou ato na Praça Ernesto Che Guevara, em Santa Clara, onde repousam os restos do guerrilheiro argentino. Fidel, contudo, não esteve presente. Ele participou, no sábado (24), de uma cerimônia em memória dos ex-combatentes da revolução.

 

26 de julho de 2010: Dia Nacional da Rebeldia CubanaPovo de Cuba celebra a revolução
No ato desta manhã. Raúl foi aclamado pela multidão que, com gritos e palavras de ordem, expressou seu compromisso com e revolução, o socialismo e com o líder histórico Fidel Castro.

A direção do Partido Comunista dedica este 26 de julho ao libertador Simón Bolívar e ao Bicentenário das Independências na América Latina. A tomada do quartel por um grupo de jovens sob a liderança de Fidel Castro, em 1953, iniciou a luta contra ditadura de Fulgêncio Batista, que terminou com o triunfo revolucionário do dia 1º de janeiro de 1959.

Na ocasião, muitos guerrilheiros morreram e Fidel foi preso, julgado e condenado a 15 anos de prisão. Por ser advogado, ele se pronunciou em auto defesa diante do tribunal e, após 22 meses de prisão, foi libertado com a anistia geral de 1955.

Compareceram aos atos comemorativos os combatentes da revolução que participaram do histórico 26 de julho, expedicionários do Granma, habitantes da região, e outros lutadores cubanos. Também estiveram presentes membros do Comitê Político do Partido Comunista, dirigentes do Governo e das organizações de massas, das Forças Amadas Revolucionárias e do Ministério do Interior, bem como uma ampla delegação da Venezuela.

Conquistas da Revolução

Em festejos prévios, no sábado, Raúl Castro listou as principais conquistas da revolução. "Cinqüenta e cinco anos é um período curto na vida de um povo, mas o suficiente para confirmar que o 26 de julho marcou o início de uma nova era na história de Cuba", disse o presidente.

Ele elogiou as palavras que seu irmão Fidel empregou, em 1973, durante o 20º aniversário do assalto ao quartel Moncada. Considerou que Fidel, a quem dedicou a celebração, expressou, de maneira exata e precisa, "a dura realidade que estava por vir e as formas de enfrentá-la."

"Em um dia como hoje, em 1973, Fidel afirmou que a única salvação para os povos da América Latina era unir-se e livrar-se da dominação imperialista, pois só assim conseguiriam um lugar entre as grandes comunidades humanas", disse ele.

Raúl afirmou ainda que, desde daquele "ato memorável de 1973, apenas as profundas convicções e a firme determinação de nosso povo para resistir e vencer tornaram possível a celebração, com orgulho e otimismo, de mais este aniversário."

Ele destacou que, em 1953, a expectativa de vida "em Cuba era de 59 anos, quase 20 a menos que a atual." Lembrou que "no passado, prevalecia o tempo de inatividade, as longas filas de desempregados, o desalojamento dos camponeses das terras que cultivavam e dos trabalhadores de suas casas porque não podiam pagar o aluguel; não devemos esquecer a imagem terrível de crianças morrendo de fome, implorando esmolas, sem médicos ou escolas."

Falou ainda dos últimos investimentos, apesar da difícil situação de Cuba, do incremento ao turismo e das ações realizadas com a colaboração da Venezuela. E levantou um grito, dizendo: "Em nome de todos os patriotas desta ilha, desde a heróica Santiago de Cuba, berço da revolução, Fidel, lhe dedicamos este aniversário e vamos continuar a sua iniciativa de 26 julho. Glória eterna aos nossos mártires! Viva a revolução! Viva Cuba livre!", encerrou, recebendo a resposta da multidão: "Viva!".

A homenagem de Fidel

Usando o simbólico verde-oliva, Fidel Castro alegrou os cubanos neste fim de semana ao visitar uma cidade próxima a Havana pela primeira vez em quatro anos, o que alimentou a discussão relativa a sua participação ou não na principal festa da revolução.

Para homenagear os rebeldes mortos no ataque ao Quartel Moncada, Fidel visitou no sábado um mausoléu em Artemisa, 60 km a sudoeste da capital, vestido com sua camisa militar tradicional, mas sem as insígnias de Comandante-em-chefe.

Segundo as imagens de televisão, Fidel - com uma boa aparência - depositou flores nos túmulos dos guerrilheiros que morreram no ataque a Moncada, primeira ação armada da Revolução Cubana, saudou o povo e leu em pé e com fluidez uma mensagem "aos combatentes revolucionários de toda a Cuba".

Foi a sexta aparição pública de Fidel Castro em 17 dias, mas a viagem a Artemisa marcou a primeira incursão fora de Havana desde que sua doença o tirou do poder, em julho de 2006.




Com Telesur e Prensa Latina
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

A grande imprensa e o nascimento do novo

Gilson Caroni *

Em pleno ano eleitoral de 2002, o governo submergia em sérios escândalos na área econômica. O presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e o diretor de Política Monetária da mesma instituição, Luiz Fernando Figueiredo, eram acusados pelo presidente interino da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) de fazer lobby em favor das empresas de telefonia. Ambos teriam entregado à Câmara de Política Econômica, instância governamental, um texto preparado pela BCP, empresa que operava na banda B de telefonia celular em São Paulo. No documento eram recomendados aumentos de tarifas, mudanças contratuais beneficiando as operadoras e redução dos impostos que incidem sobre as contas dos consumidores.

Tinha mais. Havia sérias suspeitas de que técnicos de alto escalão do BNDES, do Tesouro Nacional, do Banco do Brasil e do Ministério da Fazenda fizeram uso de informações privilegiadas para compra e venda de ações do Banco do Brasil. Eram pessoas que trabalham nas mesmas instituições que desenharam o projeto de venda de 16,3% do capital do BB. O então ministro da Fazenda do governo FHC, Pedro Malan, mandou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) investigar as acusações. O problema é que o órgão fiscalizador abriu sindicância para apurar denúncias de irregularidades de funcionários em processo de cisão nas áreas de petroquímica e de papel e celulose. Em suma, em tempos do império do cassino, o melhor a fazer era, tal como na música de Chico Buarque, "chamar o ladrão".

O que revelam os parágrafos acima? Um cenário tétrico. Um governo corrompido em setores-chave de formulação e execução de sua política econômica. O resultado lógico de instituições que se redefiniram para melhor servir ao receituário neoliberal. Não havia acidentes de percurso. A banca internacional e a degradação interna de autoridades e órgãos que se desviavam de suas funções republicanas não eram obra do acaso. A segunda era um desdobramento lógico da primeira. E não atingia apenas instâncias econômicas; levava de roldão uma imprensa que a tudo silenciava. Por convergência de princípios e por ser sócia do jogo.

Os fatos aqui relatados não são fruto de uma exaustiva investigação pessoal. Resultam da leitura de novas mídias, em complementação entre o impresso e o digital, vieram para disputar a hegemonia no campo da produção e difusão de informação. Veículos como Caros Amigos, Carta Capital e Carta Maior, entre outros,noticiaram o que a imprensa oligarquizada tratou de jogar para debaixo do tapete. Os profissionais que militam nesses espaços, ao invés de seguirem conhecidas orientações editoriais, cumpriram, já naquele pleito, a função básica de fiscalizar o poder público e estabelecer a construção de dispositivos contra-hegemônicos.

Por excelência, sempre denunciaram as malfeitorias do consórcio demo-tucano com amparo em sólido trabalho investigativo, tarefa irrenunciável de um jornalismo preocupado em atender aos interesses dos novos sujeitos emergentes e dos movimentos sociais organizados. Hoje, passados oito anos, vemos surgir novas formas de produção comunicativa que não se deixam submeter a outro imperativo que não seja o interesse do leitor. Nadando contra a corrente de uma imprensa de mercado e antinacionalista, não recusam os princípios que fundamentam a liberdade de imprensa, assegurada em qualquer regime democrático. O pluralismo está assegurado na cobertura dos fatos, no respeito ao contraditório e nos mais variados matizes ideológicos de seus colaboradores e articulistas.

Como veículos de cidadania, não se prestam a agenciamentos de interesses escusos, a distorções da realidade, infamando, como fazem as corporações, quem consideram adversários políticos. É bela a aula de jornalismo dada por espaços que se multiplicam com o surgimento de um governo comprometido com a luta da classe trabalhadora. Que mantêm na credibilidade, independente do formato, sua identidade central. Reafirmam o que disse, já há algum tempo, o jornalista Washington Novaes: "jornalismo não é profissão a ser exercida em nome próprio, mas por delegação da sociedade, a quem legitimamente pertence a informação”.

Se a imprensa tradicional está desfigurada, reduzida à condição de boletim de campanha, com fanfarras eleitorais semeadas em praticamente todas as páginas, um fazer jornalístico alternativo, próprio dos que resistem , ameaça a sua até então granítica hegemonia. As eleições de outubro talvez venham a ser o divisor de águas do campo comunicativo. Fruto da massa crítica acumulada, o novo pode enfim nascer. E virá como desconcertante reconquista do futuro.

Até agosto.

* É professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

sexta-feira, 23 de julho de 2010

A velha mídia finge que o país não mudou

Venicio A. de Lima *

O país realmente mudou. A velha mídia, todavia, insiste em "fazer de conta" que tudo continua como antes e seu poder permanece o mesmo de 1989. Aparentemente, ainda não se convenceu de que os tempos são outros.

 

Apesar de não haver consenso entre aqueles que estudaram o processo eleitoral de 1989 – as primeiras eleições diretas para presidente da República depois dos longos anos de regime autoritário –, é inegável que a grande mídia, sobretudo a televisão, desempenhou um papel por muitos considerado decisivo na eleição de Fernando Collor de Mello. O jovem e, até então, desconhecido governador de Alagoas emergiu no cenário político nacional como o "caçador de marajás" e contou com o apoio explícito, sobretudo, da Editora Abril e das Organizações Globo.

No final da década de 80 do século passado, o poder da grande mídia na construção daquilo que chamei de CR-P, cenário de representação da política, era formidável. A mídia tinha condições de construir um "cenário" – no jornalismo e no entretenimento – onde a política e os políticos eram representados e qualquer candidato que não se ajustasse ao CR-P dominante corria grande risco de perder as eleições. Existiam, por óbvio, CR-Ps alternativos, mas as condições de competição no "mercado" das representações simbólicas eram totalmente assimétricas.

Foi o que ocorreu, primeiro com Brizola e, depois, com Lula. Collor, ao contrário, foi ele próprio se tornando uma figura pública e projetando uma imagem nacional "ajustada" ao CR-P dominante que, por sua vez, era construído na grande mídia paralelamente a uma maciça e inteligente campanha de marketing político, com o objetivo de garantir sua vitória eleitoral [cf. Mídia: teoria e política, Perseu Abramo, 2ª. edição, 1ª. reimpressão, 2007].


2010 não é 1989

Em 2010 o país é outro, os níveis de escolaridade e renda da população são outros e, sobretudo, cerca de 65 milhões de brasileiros têm acesso à internet. A grande mídia, claro, continua a construir seu CR-P, mas ele não tem mais a dominância que alcançava 20 anos atrás. Hoje existe uma incipiente, mas sólida, mídia alternativa que se expressa, não só, mas sobretudo, na internet. E – mais importante – o eleitor brasileiro de 2010 é muito diferente daquele de 1989, que buscava informação política quase que exclusivamente na televisão.

Apesar de tudo isso, a velha mídia finge que o país não mudou.


O CR-P do pós-Lula

Instigante artigo publicado na Carta Maior por João Sicsú, diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do IPEA e professor do Instituto de Economia da UFRJ, embora não seja este seu principal foco, chama a atenção para a tentativa da grande mídia de construir, no processo eleitoral de 2010, um CR-P que pode ser chamado de "pós-Lula".

Ele parte da constatação de que dois projetos para o Brasil estiveram em disputa nos últimos 20 anos: o estagnacionista, que acentuou vulnerabilidades sociais e econômicas, aplicado no período 1995-2002, e o desenvolvimentista redistributivista, em andamento. Segundo Sicsú, há líderes, aliados e bases sociais que expressam essa disputa. "De um lado, estão o presidente Lula, o PT, o PC do B, alguns outros partidos políticos, intelectuais e os movimentos sociais. Do outro, estão o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), o PSDB, o DEM, o PPS, o PV, organismos multilaterais (o Banco Mundial e o FMI), divulgadores midiáticos de opiniões conservadoras e quase toda a mídia dirigida por megacorporações".

O que está em disputa nas eleições deste ano, portanto, são projetos já testados, que significam continuidade ou mudança. Este seria o verdadeiro CR-P da disputa eleitoral para presidente da República.

A grande mídia, no entanto, tenta construir um CR-P do "pós-Lula". Nele, "o que estaria aberto para a escolha seria apenas o nome do ‘administrador do condomínio Brasil’. Seria como se o ‘ônibus Brasil’ tivesse trajeto conhecido, mas seria preciso saber apenas quem seria o melhor, mais eficiente, ‘motorista’. No CR-P pós-Lula, o presidente Lula governou, acertou e errou. Mas o mais importante seria que o governo acabou e o presidente Lula não é candidato. Agora, estaríamos caminhando para uma nova fase em que não há sentido estabelecer comparações e posições (...); não caberia avaliar o governo Lula comparando-o com os seus antecessores e, também, nenhum candidato deveria (ser de) oposição ou situação (...); projetos aplicados e testados se tornam abstrações e o suposto preparo dos candidatos para ocupar o cargo de presidente se transforma em critério objetivo".

Sicsú comenta que a tentativa da grande mídia de construir esse CR-P se revela, dentre outras, na maneira como os principais candidatos à Presidência são tratados na cobertura política. Diz ele: "a candidata Dilma é apresentada como: ‘a ex-ministra Dilma Rousseff, candidata à Presidência’. Ou ‘a candidata do PT Dilma Rousseff’. Jamais (...) Dilma (é apresentada) como a candidata do governo (...)". Por outro lado, "Serra e Marina não são apresentados como candidatos da oposição, mas sim como candidatos dos seus respectivos partidos políticos. Curioso é que esses mesmos veículos de comunicação, quando tratam, por exemplo, das eleições na Colômbia, se referem a candidatos do governo e da oposição".

Novos tempos

Muita água ainda vai rolar antes do dia das eleições. Sempre haverá uma importante margem de imprevisibilidade em qualquer processo eleitoral. Se levarmos em conta, no entanto, o que aconteceu nas eleições de 2006, o poder que a grande mídia tradicional tem hoje de construir um CR-P dominante não chega nem perto daquele que teve há 20 anos. E, claro, um tal CR-P não significaria a eleição garantida de nenhum candidato (a).

O país realmente mudou. A velha mídia, todavia, insiste em "fazer de conta" que tudo continua como antes e seu poder permanece o mesmo de 1989. Aparentemente, ainda não se convenceu de que os tempos são outros.

* é professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Pancadaria literária: a guerra anunciada entre João Ubaldo e FHC

 

Guardei, por 12 anos, em meio à minha papelada imunda de recortes de jornais e revistas velhas, numa caixa de papelão em frangalhos, um artigo de João Ubaldo Ribeiro datado de 25 de outubro de 1998, porque esperava justamente esse momento: a hora em que Fernando Henrique Cardoso, alijado da política e na iminência de cair no esquecimento público, se candidatasse a uma vaga na Academia Brasileira de Letras.


Por Leandro Fortes, no blog Brasília, eu Vi

 

O artigo, intitulado “Senhor Presidente”, foi escrito logo depois da vitória de FHC, no primeiro turno das eleições de 1998, graças ao Plano Real e à aprovação, no Congresso Nacional, da Emenda Constitucional da reeleição, conseguida à custa de um escandaloso esquema de compra de votos. O texto é pau puro e, surpreendentemente, foi escrito numa época em que a mídia nacional era, praticamente, uma assessoria de imprensa do consórcio PSDB/PFL.

Não por outra razão, foi inicialmente censurado em O Estado de S. Paulo, para onde o cronista escrevia, embora o jornal tenha sido obrigado a publicá-lo, uma semana depois, para evitar se envolver em um escândalo de censura justo com um dos mais respeitados escritores do país. Num tempo de internet incipiente, a repercussão do artigo foi mínima, ficando restrita às redações e ao meio intelectual, de resto, também acovardado pela força do pensamento único imposto à sociedade pela imprensa e pelo governo de então.

Esse retalho jornalístico ficou comigo tanto tempo porque, no fundo, eu tinha certeza que a vaidade intelectual de FHC iria levá-lo, em algum momento, a pleitear uma vaga na ABL, como agora se noticia em notas discretas de colunas de jornal, certo de que se trata de uma confraria historicamente vulnerável a influências políticas, quando não à bajulação pura e simples, como qualquer um pode constatar, embora abrigue grandes escritores, como o próprio João Ubaldo Ribeiro.

Contudo, lá também estão escribas do calibre de José Sarney e do cirurgião plástico Ivo Pitanguy. No passado, também circulavam entre os imortais o general Aurélio de Lira Tavares (codinome “Adelita), eleito em 1970, com o apoio do ditador Emílio Médici, e Roberto Marinho, das Organizações Globo. A presença de FHC, que pelo menos escreveu uns livros de sociologia não seria, portanto, um escândalo em si. O problema é o artigo de João Ubaldo.

Fogueira de brasas

No texto, o escritor baiano, entre outras considerações, refere-se assim a Fernando Henrique Cardoso: “(…) o senhor é um sociólogo medíocre, cujo livro O Modelo Político Brasileiro me pareceu um amontoado de obviedades que não fizeram, nem fazem, falta ao nosso pensamento sociológico”.

Mais adiante, relembra um dos piores momentos da vida de FHC: “(…) o senhor, que já passou pelo ridículo de sentar-se na cadeira do prefeito de São Paulo, na convicção de que já estava eleito, hoje pensa que é um político competente e, possivelmente, tem Maquiavel na cabeceira da cama. O senhor não é uma coisa nem outra, o buraco é bem mais embaixo”.

E por aí vai, até se lembrar, a certa altura do texto, que FHC, em algum momento da vida, poderia se interessar pela vida imortal da ABL. João Ubaldo, então, cospe uma fogueira de brasas para cima de Fernando Henrique: “(…) E, falando na Academia, me ocorre agora que o senhor venha a querer coroar sua carreira de glórias entrando para ela. Sou um pouco mais mocinho do que o senhor e não tenho nenhum poder, a não ser afetivo, sobre meus queridos confrades. Mas, se na ocasião eu tiver algum outro poder, o senhor só entra lá na minha vaga, com direito a meu lugar no mausoléu dos imortais”.

Eu posso estar errado, já se passou mais de uma década, a ira de João Ubaldo pode ter se perdido na poeira do tempo, mas a julgar pelo teor do imortal artigo do escritor e jornalista baiano, FHC vai ter que pensar duas vezes antes de se candidatar a uma vaga na ABL. Ou considerar o fato de que só vai entrar lá por cima do cadáver de João Ubaldo Ribeiro. A conferir.

Abaixo, o artigo completo, para quem quiser se deleitar:

 
Senhor Presidente


Por João Ubaldo Ribeiro (25 de outubro de 1998)

 

Senhor Presidente,


Antes de mais nada, quero tornar a parabenizá-lo pela sua vitória estrondosa nas urnas. Eu não gostei do resultado, como, aliás, não gosto do senhor, embora afirme isto com respeito. Explicito este meu respeito em dois motivos, por ordem de importância. O primeiro deles é que, como qualquer semelhante nosso, inclusive os milhões de miseráveis que o senhor volta a presidir, o senhor merece intrinsecamente o meu respeito. O segundo motivo é que o senhor incorpora uma instituição basilar de nosso sistema político, que é a Presidência da República, e eu devo respeito a essa instituição e jamais a insultaria, fosse o senhor ou qualquer outro seu ocupante legítimo. Talvez o senhor nem leia o que agora escrevo e, certamente, estará se lixando para um besta de um assim chamado intelectual, mero autor de uns pares de livros e de uns milhares de crônicas que jamais lhe causarão mossa. Mas eu quero dar meu recadinho.


Respeito também o senhor porque sei que meu respeito, ainda que talvez seja relutante privadamente, me é retribuído e não o faria abdicar de alguns compromissos com que, justiça seja feita, o senhor há mantido em sua vida pública – o mais importante dos quais é com a liberdade de expressão e opinião. O senhor, contudo, em quem antes votei, me traiu, assim como traiu muitos outros como eu. Ainda que obscuramente, sou do mesmo ramo profissional que o senhor, pois ensinei ciência política em universidades da Bahia e sei que o senhor é um sociólogo medíocre, cujo livro O Modelo Político Brasileiro me pareceu um amontoado de obviedades que não fizeram, nem fazem, falta ao nosso pensamento sociológico. Mas, como dizia antigo personagem de Jô Soares, eu acreditei.


O senhor entrou para a História não só como nosso presidente, como o primeiro a ser reeleito. Parabéns, outra vez, mas o senhor nos traiu. O senhor era admirado por gente como eu, em função de uma postura ética e política que o levou ao exílio e ao sofrimento em nome de causas em que acreditávamos, ou pelo menos nós pensávamos que o senhor acreditava, da mesma forma que hoje acha mais conveniente professar crença em Deus do que negá-la, como antes. Em determinados momentos de seu governo, o senhor chegou a fazer críticas, às vezes acirradas, a seu próprio governo, como se não fosse o senhor seu mandatário principal. O senhor, que já passou pelo ridículo de sentar-se na cadeira do prefeito de São Paulo, na convicção de que já estava eleito, hoje pensa que é um político competente e, possivelmente, tem Maquiavel na cabeceira da cama. O senhor não é uma coisa nem outra, o buraco é bem mais embaixo. Político competente é Antônio Carlos Magalhães, que manda no Brasil e, como já disse aqui, se ele fosse candidato, votaria nele e lhe continuaria a fazer oposição, mas pelo menos ele seria um presidente bem mais macho que o senhor.


Não gosto do senhor, mas não tenho ódio, é apenas uma divergência histórico-glandular. O senhor assumiu o governo em cima de um plano financeiro que o senhor sabe que não é seu, até porque lhe falta competência até para entendê-lo em sua inteireza e hoje, levado em grande parte por esse plano, nos governa novamente. Como já disse na semana passada, não lhe quero mal, desejo até grande sucesso para o senhor em sua próxima gestão, não, claro, por sua causa, mas por causa do povo brasileiro, pelo qual tenho tanto amor que agora mesmo, enquanto escrevo, estou chorando.


Eu ouso lembrar ao senhor, que tanto brilha, ao falar francês ou espanhol (inglês eu falo melhor, pode crer) em suas idas e vindas pelo mundo, à nossa custa, que o senhor é o presidente de um povo miserável, com umas das mais iníquas distribuições de renda do planeta. Ouso lembrar que um dos feitos mais memoráveis de seu governo, que ora se passa para que outro se inicie, foi o socorro, igualmente a nossa custa, a bancos ladrões, cujos responsáveis permanecem e permanecerão impunes. Ouso dizer que o senhor não fez nada que o engrandeça junto aos corações de muitos compatriotas, como eu. Ouso recordar que o senhor, numa demonstração inacreditável de insensibilidade, aconselhou a todos os brasileiros que fizessem check-ups médicos regulares. Ouso rememorar o senhor chamando os aposentados brasileiros de vagabundos. Claro, o senhor foi consagrado nas urnas pelo povo e não serei eu que terei a arrogância de dizer que estou certo e o povo está errado. Como já pedi na semana passada, Deus o assista, presidente. Paradoxal como pareça, eu torço pelo senhor, porque torço pelo povo de famintos, esfarrapados, humilhados, injustiçados e desgraçados, com o qual o senhor, em seu palácio, não convive, mas eu, que inclusive sou nordestino, conheço muito bem. E ouso recear que, depois de novamente empossado, o senhor minta outra vez e traga tantas ou mais desditas à classe média do que seu antecessor que hoje vive em Miami.


Já trocamos duas ou três palavras, quando nos vimos em solenidades da Academia Brasileira de Letras. Se o senhor, ao por acaso estar lá outra vez, dignar-se a me estender a mão, eu a apertarei deferentemente, pois não desacato o presidente de meu país. Mas não é necessário que o senhor passe por esse constrangimento, pois, do mesmo jeito que o senhor pode fingir que não me vê, a mesma coisa posso eu fazer. E, falando na Academia, me ocorre agora que o senhor venha a querer coroar sua carreira de glórias entrando para ela. Sou um pouco mais mocinho do que o senhor e não tenho nenhum poder, a não ser afetivo, sobre meus queridos confrades. Mas, se na ocasião eu tiver algum outro poder, o senhor só entra lá na minha vaga, com direito a meu lugar no mausoléu dos imortais.
 
Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

Análise em rochas confirma que Lua tem água mineral

A Lua não é tão árida como se pensava. Ainda que não se encontrem oceanos, lagos ou mesmo uma poça em sua superfície, a água está presente no satélite terrestre. Após a descoberta de gelo em 2009, agora um grupo de pesquisadores acaba de identificar grupos de hidroxila em uma rocha lunar.

 

Segundo o estudo, publicado na edição desta quinta-feira (22) da revista Nature, a presença do radical composto por oxigênio e hidrogênio confirma a existência de água em minerais no satélite terrestre. A rocha analisada foi trazida pelo programa Apolo.

“A Lua, considerada desprovida de materiais hídricos, tem água”, disse John Eiler, professor de geologia e geoquímica no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), um dos autores do estudo.

Os pesquisadores se surpreenderam ao conseguir medir quantidade significativa de água em um mineral lunar. O grupo encontrou água em apatita, um mineral do grupo dos fosfatos, dentro de um basalto coletado por astronautas.

Para ser mais exato, eles não encontraram água, ou seja, a molécula H2O, mas hidrogênio na forma de um ânion hidroxila (OH-). “Hidróxido é um parente químico próximo da água. Se aquecermos a apatita, os íons hidroxila serão ‘decompostos’ e formarão água”, explicou outro autor da pesquisa, George Rossman, professor de mineralogia da Caltech.

A rocha lunar examinada agora foi trazida em 1971 por astronautas da Apolo 14. A proposta de procurar água na amostra foi de Larry Taylor, professor da Universidade do Tennessee, que enviou amostras ao grupo na Caltech para análise.

Mas a ideia de procurar água em apatita não era nova. “Charles Sclar e Jon Bauer, da Universidade Lehigh, notaram que algo estava faltando nos resultados das análises químicas feitas em 1975. Agora, 35 anos depois, somos capazes de fazer medições adequadas e vimos que eles estavam certos. A peça que faltava era a hidroxila”, disse Jeremy Boyce, outro autor do estudo na Caltech.

O grupo investigou a rocha lunar em busca de sinais de hidrogênio, enxofre e cloro por meio de uma microssonda iônica, capaz de analisar grãos de materiais com tamanhos muito menores do que a espessura de um fio de cabelo humano.

As análises mostraram que, em termos da presença de tais elementos, a apatita lunar é semelhante à encontrada em rochas vulcânicas na Terra. “Há mais água na Lua do que se imaginava, mas ainda assim em ordens de magnitude muito inferiores às da Terra”, disse Eiler.

A existência de vulcões na Lua há mais de 4 bilhões de anos deu aos cientistas a pista de que a água poderia estar presente em minerais lunares, uma vez que as dinâmicas dos vulcões terrestres são principalmente dirigidas pela água.

A possibilidade de extrair água no subterrâneo da Lua amplia as chances de instalar bases humanas no satélite. Levar água da Terra é um dos principais obstáculos para a permanência do homem na Lua, uma vez que o custo atual é superior a US$ 50 mil por litro transportado.

Fonte: Agência Fapesp

http://www.vermelho.org.br/noticia

Radioatividade em Faluja é mais grave que em Hiroxima

A leitura do fundamentado texto de Layla Anwar deixa o leitor como uma angústia revoltante e algumas interrogações: Como é possível no século 21 tamanha barbárie? O que significa direitos humanos para o poder nos EUA? Como é possível os governos de todos e cada um dos nossos países colaboraram, e pior, terem relações de subordinação com criminosos tão cruéis? Cada vez é mais evidente por que razão de os EUA não aceitaram para seus cidadãos a territorialidade do Tribunal Penal Internacional.

 

Esta informação é demasiado importante para ser somente anotada… e este é apenas um comentário apressado. Acabei de assistir a uma reposição da Arabic-interview, da Al-Jazira, conduzida por Ahmad Mansour com o professor Chris Busby. O professor Busby é Cientista e Director da Green Audit, e conselheiro científico do Comitê Europeu para os Riscos de Radiação. Para saber mais sobre o professor Busby e o seu trabalho pode procurar no Google: Chris Busby Uranium.

Por Layla Anwar

O professor Busby publicou vários artigos sobre radiação, urânio e contaminação em países como o Líbano, Kosovo, Gaza e, claro, Iraque.

Falar-vos-ei das suas recentes descobertas, que eram o tema do programa emitido pela Al-Jazira. Como alguns de vocês saberão, Faluja é uma cidade proibida. Foi sujeita a intensos bombardeios em 2004, com bombas de urânio empobrecido (DU, do inglês Depleted Uranium) e fósforo branco, e depois disso transformou-se numa zona interdita — o que significa que tanto as autoridades-fantoche como as forças invasoras e ocupantes estadunidenses não permitem que se conduza nenhum estudo em Faluja.

Faluja está cercada. Evidentemente que tanto os estadunidenses como os iraquianos sabem de alguma coisa que escondem do público. E é aqui que entra o professor C. Busby. Determinado em ir até ao fundo do que aconteceu em Faluja em 2004.

Sendo um cientista de renome na sua área, conduziu pesquisas e exames em Faluja cujos resultados preliminares serão publicados nas próximas semanas – assim esperamos.

O professor Busby encontrou bastantes obstáculos enquanto desenvolvia o seu projeto. Nem ele nem nenhum membro da sua equipe foram autorizados a entrar em Faluja para realizar entrevistas. Logo, na sua opinião, quando a porta principal se fecha, torna-se necessário encontrar outras portas para abrir. E foi o que fez.

Conseguiu reunir uma equipe de iraquianos de Faluja para conduzir os exames por ele. A pesquisa baseou-se em 721 famílias de Faluja, num total de 4.500 participantes - vivendo em zonas com diferentes níveis de radiação. Os resultados foram comparados com um grupo padrão - um exemplo do mesmo número de famílias vivendo numa zona não-radioativa noutro país árabe. Para esse efeito comparativo, escolheu três outros países - Kuwait, Egito e Jordânia.

Antes de avançarmos para os resultados preliminares, devo salientar o seguinte:
  • As autoridades iraquianas ameaçaram todos os envolvidos na pesquisa, de prisão e detenção, caso cooperassem com os “terroristas” que os estavam a entrevistar. Por outras palavras, foram ameaçados na alçada da lei anti-terrorista.
  • As forças estadunidenses proibiram o professor Busby de obter quaisquer dados, argumentando que Faluja é uma zona insurgente.
Os médicos de Faluja recusaram o pedido para prestarem declarações que seriam transmitidas diretamente para o programa de Ahmad Mansour, já que receberam inúmeras ameaças de morte e temem pelas suas vidas.Noutras palavras, este estudo foi conduzido em condições extremamente difíceis. Mas foi conduzido.


Como o programa ainda não foi carregado no Youtube, não posso proporcionar uma transcrição oral absolutamente exata. Mas tomei breves notas e memorizei o necessário. Farei o possível para apresentar todos os fatos a que hoje assisti. E então o que é que os EUA e os seus fantoches iraquianos não querem que o público saiba? E porque é que não autorizam quaisquer medições dos níveis de radiação em Faluja, e porque é que proíbem até a AIEA de entrar na cidade? Que é que aconteceu em Faluja, exatamente? Que tipos de bombas foram usadas? Somente DU ou outra coisa mais?
  • Algo que é bastante curioso em Faluja é a subida dramática das taxas de câncer, num curto espaço de tempo, por exemplo em 2004. Exemplos fornecidos pelo professor Busby:
  • Taxa de leucemia infantil aumentou 40 vezes desde 2004 em comparação com anos anteriores. Comparada com a Jordânia é 38 vezes maior.
  • Taxa de câncer da mama cresceu 10 vezes desde 2004
  • Taxa de câncer linfático cresceu também 10 vezes desde 2004.
Outra curiosidade em Faluja é o dramático aumento nas taxas de mortalidade infantil. Comparada com dois outros países árabes, como o Kuwait e o Egito, que não estão contaminados pelas radiações, é este o retrato:

  • Mortalidade infantil em Faluja é de 80 crianças por cada 1.000 nascimentos, em comparação com o Kuwait, com 9 crianças por cada 1.000 nascimentos, e com o Egito, com 19 crianças a cada 1.000 (assim, a taxa de mortalidade infantil no Iraque é 4 vezes maior do que no Egito e 9 vezes maior que no Kuwait).

A terceira particularidade em Faluja é o número de malformações congênitas que explodiram repentinamente desde 2004. Este é um assunto que já abordei no passado. Mas não é toda a verdade, hoje aprendi um pouco mais. A radiação de qualquer dos agentes utilizados pelas forças de “libertação” não só causaram massivas deformações genéticas como também, e não menos importante:
  • Provocaram alterações estruturais em nível celular. Por sua vez, isto significa que devido às alterações genéticas dos rapazes (falta de cromossomo X), estes têm mais probabilidades de morrer ao nascer, e as moças têm mais probabilidades de sobreviver com fortes deformações. Outro exemplo adiantado pelo professor Busby: antes de 2003, as taxas de natalidade em Faluja eram as seguintes: 1.050 rapazes para 1.000 moças. Em 2005, somente 350 rapazes nasceram — o que significa que a maioria não sobreviveu.
  • Tal como para as moças, e é aqui que jaz a tragédia, a radiação causa mudanças no DNA, o que significa que caso sobrevivam, e tentem reproduzir, darão provavelmente à luz filhas geneticamente desfiguradas e filhos nados-mortos.
  • As conclusões anteriores são suportadas noutros estudos conduzidos nos filhos e netos que sobreviveram a Hiroxima (realizado em 2007) e que evidencia que até a terceira geração exibe malformações congênitas, incluindo doenças (câncer, problemas cardio-vasculares) numa taxa de aumento de 50 vezes. Em Tchernobyl, por outro lado, estudos em animais na mesma área demonstram que os efeitos da radiação modificaram geneticamente 22 gerações. Em suma, a radiação é transmitida de gene para gene e tem efeitos cumulativos com o passar do tempo. (não dissecarei o porquê – as propriedades acumulativas/ memória das células e a atividade do sistema imunológico – poderá ler mais detalhes sobre isso quando o artigo do professor Busby for publicado) [1].
  • Algumas destas deformações em crianças são tão grotescas que, tanto a Al-Jazira como a BBC (que produziu um documentário sobre a mesma matéria), recusaram a difusão destas imagens.

Exemplos das deformações que Ahmad Mansour revelou em imagens:
  • Crianças nascidas sem olhos
  • Crianças com duas e três cabeças
  • Crianças nascidas sem orifícios
  • Crianças nascidas com tumores cerebrais e retinais malignos
  • Crianças nascidas sem órgãos vitais
  • Crianças nascidas sem membros ou com excesso dos mesmos
  • Crianças nascidas sem genitais
  • Crianças nascidas com severas malformações cardíacas
Mais…


Sobre esse assunto, os médicos em Faluja foram questionados acerca da relevância para o estudo da comparação das taxas de deformação congênita no espaço de um mês (comparando-o com o mês anterior). Eis o resultado: somente no espaço de um mês, os recém-nascidos com malformações cresceram de uma (mês anterior) para três vezes por dia (mês corrente, que para efeitos de estudo foi Fevereiro de 2010).

O urânio é introduzido na corrente sanguínea através da ingestão e inalação.

Os níveis massivos de urânio a que a população de Faluja foi sujeita também concorre para o aumento vertiginoso de câncer nos pulmões, vasos linfáticos e mama, na população adulta.

Com estas conclusões preliminares, o professor Busby e a sua equipe concluíram que, em comparação com Hiroxima e Nagasaki, Faluja é pior. E cito o professor Busby: “A situação em Faluja é horrenda e assustadora, mais perigosa e grave que Hiroxima…”

Uma nota lateral, ou talvez não

Referi que estes eram resultados preliminares. Por quê?

Porque o professor Busby tem sido ameaçado, viu os seus fundos de pesquisa cortados, portas fechadas, foi ameaçado (tal como outros cientistas que tentaram conduzir estudos semelhantes nos anos 90, no Iraque). As implicações políticas são enormes e perigosas para os EUA e seus homens. Significa que as evidências científicas de crimes de guerra estão aqui mesmo na ponta dos dedos…

Logo, a vida do professor Busby não tem sido fácil. A pesquisa que conduziu e produziu com grande dificuldade foi enviada para a revista científica Lancet, para uma revisão do Comitê Científico. A revista científica Lancet recusou-o, afirmando que não tinha tempo para o rever. Os laboratórios que, no passado, cooperaram com ele no teste de amostras recusaram colaborar quando souberam que as amostras provinham do Iraque. Só dois laboratórios estão disponíveis para testar as amostras do material/agente usado em Faluja – e fazem-no a um preço exorbitante – pela natureza sensível do estudo. Também devido à falta de verbas, o professor Busby tem cerca de 20 amostras de Faluja para teste – que guarda cuidadosamente. Aguarda os fundos necessários para testar as amostras.

Quando questionado por Ahmad Mansour acerca da sua perseverança perante os enormes obstáculos que tem enfrentado, a sua resposta foi:

“Toda a minha vida procurei a verdade, sou um caçador da verdade nesta selva de mentiras. Também tenho filhos. As crianças não são só o nosso futuro, são os portadores das gerações futuras. Nos últimos 50 anos temos contaminado o planeta (com radiação) e passamos esta herança para os nossos filhos e netos. Devemos a verdade à população de Faluja.”

Quando questionado como lida com a escassez de fundos e o excesso de portas fechadas na cara, respondeu:

“Confio na boa vontade de pessoas que enviam pequenas quantias, e acredito verdadeiramente que quanto a porta principal se fecha, outras se abrem. Quando há vontade, há caminho.”

Tiro-lhe o chapéu, professor Busby.

Insto a que todos que leiam este artigo, todas as pessoas de consciência, insto a que todos os iraquianos (mexam-se, por amor de Deus!) e todos os árabes contatem o professor Busby e doem para que as amostras de Faluja sejam testadas e a verdade venha à tona. Terminarei este artigo com uma última citação que dedico a este grande homem:

“A verdade tem asas que não podem ser cortadas”

Tenho de terminar. Já é madrugada. Ainda não dormi. Quis colocar este artigo disponível ao mundo… a questão que levo comigo para a cama - se é que conseguirei fechar os olhos - é a mesma questão que tenho colocado desde 2003
Por quê? Que fez o povo iraquiano, que fizeram as crianças iraquianas para merecer isto?

A conclusão é horrível…

Nota do tradutor:
[1] A autora refere-se ao texto “Cancer, Infant Mortality and Birth Sex-Ratio in Falujah, Iraq 2005–2009”, Chris Busby, Malak Hamdan and Entesar Ariabi, Int. J. Environ. Res. Public Health 2010, 7, 2828-2837; doi:10.3390/ijerph7072828.

* Layla Anwar é membro da Arab Woman Blues, uma organização que considera que a sua pátria é a nação árabe.


Fonte: ODiario.info, Tradução de José Pedro Ribeiro

A pouca cultura nossa de cada dia

Luciano Siqueira *


Quando subi ao palco – a contragosto, pois palco em evento cultural é para os artistas – ao lado do então prefeito João Paulo, no Marco Zero, numa tarde de domingo, por ocasião de um concerto da Orquestra Sinfônica do Recife, não contive a emoção ao perceber a composição do público de cerca de cinco mil pessoas ali reunidas: gente do nosso povo, boa parte vinda de bairros periféricos, a quem se atribui (erroneamente) a preferência quase exclusiva por produtos musicais de baixa qualidade popularizados pela grande mídia.

Cena semelhante pôde presenciar durante os oitos anos em que estivemos na Prefeitura do Recife. Em espetáculos gratuitos, pois produto cultural de qualidade custa caro.

A observação vem a propósito de um estudo feito há algum tempo pela Universidade Federal de Minas Gerais, a propósito do baixo dispêndio do brasileiro com cultura: apenas 40% dos habitantes de nossas regiões metropolitanas tem esse item em seu orçamento familiar.

A estimativa se apóia em informações contidas na Pesquisa de Orçamento Familiar, realizada entre 2002 e 2003 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O estudo focou nove regiões metropolitanas – Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza e Belém – e do Distrito Federal e procurou cruzar idade, escolaridade e renda no consumo de artigos de áudio, vídeo, leitura e arte, além de ingressos de teatro, shows, cinema, museus e estádios. Também incluiu a aquisição de instrumentos musicais, aparelhos de televisão, máquinas fotográficas e gastos com internet e TV por assinatura.

Na interpretação dos pesquisadores, dois fatores principais determinariam esse perfil de baixo consumo de cultura: preço e nível de escolaridade.

Pode ser. Quanto a preço cobrado em casas de espetáculo e por produtos como CDs, DVDs e livros, por exemplo, está longe do alcance da média de uma população cuja massa salarial é baixa.

Mas quanto à escolaridade, cabe dúvida. Pelo menos pela observação empírica das bem sucedidas tentativas de ofertar no Recife produtos de qualidade para grandes públicos formados por extratos mais populares e de reconhecido baixo nível de instrução formal.

O problema não é simples, é evidente. Reclama inclusive políticas públicas que convirjam no sentido de baratear custos dos produtos culturais – algo complexo que implica ação sobre toda a cadeia produtiva da cultura – e, obviamente, melhorar a qualidade de vida da população que vive do próprio trabalho, do ponto de vista material e espiritual. Vale refletir.
* Médico, vereador em Recife, membro do Comitê Central do PCdoB

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

quinta-feira, 22 de julho de 2010


                    Promotor Natural e o Devido Processo Legal                  


Há mais de vinte anos, exatamente em 20 de maio de 1987, em artigo publicado no jornal "O Estado de São Paulo", o eminente ministro do Supremo Tribunal Federal, Sidney Sanches, em exposição feita junto à Subcomissão do Poder Judiciário e Ministério Público, textualmente afirmou que "o interesse público será melhor atendido e a Justiça melhor servida se o Ministério Público, em qualquer de suas funções em juízo, estiver a salvo de influências externas, seja no âmbito estadual, seja no federal", clamando por maior autonomia, financeira e administrativa, para que se garanta a seus membros maior segurança e isenção, em nome do interesse público e da justiça.

Da mesma forma, tornava-se necessária a outorga de garantias, idênticas às da magistratura, diante de possíveis influências, inclusive de ordem política, para que seus membros atuem em nome e na defesa da sociedade. Posteriormente, o constituinte, atendendo aos reclamos dos operadores do direito, estabeleceu, em cláusula pétrea, que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente" (art.5º inciso LIII, da CF). Garantiu-se, assim, ao acusado, prévio conhecimento de quem o perseguirá em juízo e quem aplicará o direito ao caso concreto.

Defensor da legalidade, cristalina qualificação do Ministério Público, causa espécie a posterior designação de Promotor de Justiça, em detrimento do intitulado Promotor Natural, vedando-se, dessa forma, a discricionária designação, afastando-se o verdadeiro titular, ferindo-se a regra pétrea, verdadeira garantia constitucional, porque, conforme doutrina o eminente jurista Jaques de Camargo Penteado, "governo algum pode interferir no Ministério Público para obter acusação contra inimigo político, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da ampla defesa. Não basta o controle jurisdicional posterior, eis que a todo indivíduo deve ser assegurado o direito de jamais ver seu nome inserido numa denúncia sem supedâneo suficiente. E o contrário deve igualmente ser analisado. Governo algum pode interferir no Parquet para obter denúncia que jamais chegará a bom termo ou arquivamento que deixará de levar à condenação justamente aquele que feriu a ordem jurídica".

Os notáveis avanços e as novas tarefas atribuídas ao Ministério Público, ao contrário do que se pode inferir, possuem o condão de permitir a seus membros o cumprimento desses misteres, em proveito da sociedade, única beneficiada, não tendo jamais o intuito de estabelecer privilégio a determinada casta de funcionários.

A concessão de discricionariedade na designação de promotor em detrimento daquele prévia e legalmente autorizado a propor ação desvirtua e macula o devido processo legal, voltando-se a tempos pretéritos "em que o Ministério Público se notabilizou por servir ao governo e aos governantes, situação esta incompatível com sua atual destinação constitucional", conforme alerta Hugo Nigro Mazzilli, que aponta o caminho correto: "justamente para que o Ministério Público possa servir a sociedade e não aos governantes, precisa ser dotado de garantias substanciais que assegurem a independência administrativa e funcional - garantias concretas e não palavras retumbantes na Lei Maior, mas vazias de maior conteúdo prático".

A evolução da instituição, assim, caminha para o respeito às garantias estabelecidas na Constituição Federal, mas, antes de tudo, são garantias da própria coletividade e que devem, portanto, ser rigorosamente concretizadas para que não se constituam em meros enunciados. 

Claudionor Mendonça dos Santos é Promotor de Justiça e 1º Secretário do Ministério Público Democrático. 


      Fonte: http://www.correiocidadania.com.br

A mentira na história e a compreensão da crise



O capitalismo atravessa uma crise estrutural para a qual não encontra soluções. Para que os povos se mobilizem na luta contra o sistema que os oprime e ameaça já a própria continuidade da vida na Terra, é indispensável a compreensão do funcionamento da monstruosa engrenagem que deforma o real, impondo à humanidade uma Historia deformada , forjada pelo capitalismo para lhe servir os interesses. 

Essa compreensão é extraordinariamente dificultada pela máquina de desinformação midiática controlada pelas grandes transnacionais. Nunca antes a humanidade dispôs de tanta informação, mas em época alguma esteve tão desinformada. Nesta era da informação instantânea, as forças do capital estão conscientes de que a transformação da mentira em verdade é cada vez mais imprescindível à sobrevivência do capitalismo.

A lógica das crises
No esforço para enganar e confundir os povos, a primeira mentira é inseparável da afirmação categórica, difundida através de um bombardeio midiático, de que nos EUA irrompera uma grave crise, definida como financeira, resultante de especulações fraudulentas no imobiliário. Obama e os sacerdotes de Wall Street reconheceram a cumplicidade da banca e das seguradoras quando surgiram falências em cadeia, mas garantiram que o tsunami financeiro seria superado através de medidas adequadas. Trataram de ocultar que se estava perante uma crise profunda do capitalismo, de âmbito mundial. A simulação da surpresa fez parte do jogo. O presidente dos EUA e os senhores da finança mentiram conscientemente. As grandes crises mundiais raramente são previstas e anunciadas com antecedência. Mas quando se produzem não surpreendem. Inserem-se na lógica da História. 

Isso aconteceu, por exemplo, após a II Guerra Mundial. A Aliança que fora decisiva para a derrota do III Reich não poderia prolongar-se. Era incompatível com as ambições e o projeto de dominação do capitalismo. 

A dimensão da vitória, ao eliminar a Alemanha como grande potência militar e econômica, gerou uma situação potencialmente conflitiva. A partilha dessa dramática herança foi feita, numa atmosfera de aparente cordialidade, nas Conferências de Teerã e Yalta. Mas, quando os canhões deixaram de disparar, Washington e Londres logo se entenderam para criar tensões incompatíveis com o respeito dos compromissos assumidos. 

A Guerra Fria foi uma criação dos EUA e do Reino Unido. Derrotado um inimigo, o fascismo, o imperialismo precisava inventar outro. A tarefa não exigiu muita imaginação. Os slogans que nas duas décadas anteriores apresentavam o comunismo como ameaça letal à democracia foram rapidamente retomados.Como os povos estavam sedentos de paz, uma gigantesca campanha de falsificação da História foi desencadeada para persuadir no Ocidente centenas de milhões de pessoas de que a União Soviética configurava um perigo para a humanidade democrática. Essa ofensiva contribuiu decisivamente para dissipar as esperanças geradas pelas Nações Unidas e o discurso humanista sobre uma paz perpétua. 

A chamada Guerra Fria nasceu dessa mentira. O famoso discurso de Fulton, quando Churchill carimbou a expressão Cortina de Ferro para caracterizar a imaginária ameaça soviética, foi previamente discutido com a Casa Branca. O medo da "barbárie russa" abriu o caminho à Doutrina Truman e à OTAN. Não foi a URSS quem tomou a iniciativa de romper os acordos assinados pelos vencedores da guerra.

Cabe recordar que somente após o afastamento dos comunistas dos governos da França e da Itália os ministros anticomunistas deixaram de integrar governos de países do Leste europeu. 

É também significativo que os historiadores norte-americanos e ingleses – com raríssimas exceções - omitam que a implantação de regimes alinhados com a União Soviética se concretizou na Europa sem recurso à força armada, enquanto na Grécia – país situado na zona de influência inglesa - o exército de ocupação britânico desencadeou uma violenta repressão quando os trabalhadores revolucionários estavam prestes a tomar o poder. Foram então abatidos milhares de comunistas gregos para garantir a sobrevivência de uma monarquia apodrecida, mas a mídia ocidental ignorou esses massacres. O tema era incômodo.O tão comentado plano russo de "conquista e dominação mundiais" não passa de um mito forjado em Washington e Londres para criar o alarme e o medo propícios à criação da OTAN como "aliança defensiva" capaz de se opor "à subversão comunista". E a arma atômica passou a ser usada como instrumento de chantagem. 

Na realidade, a URSS, a quem a guerra custara mais de 20 milhões de mortos (a maioria homens de menos de 30 anos), precisava desesperadamente de paz para se reconstruir. As hordas nazis tinham devastado as zonas mais desenvolvidas e industrializadas do país. Como poderia desejar a guerra e promover o "expansionismo comunista" uma sociedade nessas condições?

A agressividade vinha toda dos EUA que tinham sido enriquecidos por uma guerra que não atingiu o seu território e na qual as suas forças armadas sofreram perdas muito inferiores às do seu aliado britânico. 

A Grã Bretanha, cujo império principiava a desfazer-se, ligou, porém, o seu destino ao colosso americano. Os elogios ao aliado russo, antes freqüentes, foram substituídos por insultos e calúnias. Aos jovens de hoje parece quase inacreditável que Churchill, o inventor da Cortina de Ferro, meses antes do final da guerra tenha afirmado: "Não conheço outro governo que cumpra os seus compromissos (…) mais solidamente do que o governo soviético russo. Recuso-me absolutamente a travar aqui uma discussão sobre a boa fé russa". (citado por Isaac Deutscher em Ironias da História, pág. 184; Ed. Civilização Brasileira; Rio de Janeiro, 1968). Assim falava o primeiro ministro do Reino Unido pouco antes de transformar o aliado que tanto admirava em ogre que ameaçava o mundo… 

Mesma hipocrisia numa crise muito diferente 
Desagregada a União Soviética e implantado o capitalismo na Rússia, o imperialismo sentiu a necessidade de reinventar inimigos para justificar novas guerras. E eles foram rapidamente fabricados. Surgiu assim "o eixo do mal". Pequenos países como Cuba, o Iraque e a Coréia do

Norte, metamorfoseados em potências agressoras, foram apresentados como "ameaça à segurança" dos EUA e dos seus aliados. Um homem, Osama Bin Laden, foi guindado a "inimigo número um" dos EUA. O Afeganistão, onde supostamente se encontrava, foi invadido, vandalizado e ocupado. Bin Laden, aliás, não foi sequer localizado. Permanece vivo, em lugar desconhecido. Mas a sua organização, a fantasmática Al Qaeda, é responsabilizada como a fonte do terrorismo mundial. 
Seguiu-se o Iraque. Durante meses, a máquina midiática dos EUA inundou o mundo com notícias sobre "as armas de destruição massiva" que Saddam Hussein teria acumulado para agredir a humanidade. O secretário de Estado Colin Powell declarou perante o Conselho de Segurança da ONU que Washington tinha provas da existência desse arsenal de terror. O britânico Tony Blair garantiu que também dispunha dessas provas.

O Iraque foi invadido, destruído, saqueado e, tal como o Afeganistão, permanece ocupado. Mas Bush e Blair acabaram por reconhecer que, afinal, as tais armas de destruição massiva não existiam.

Entretanto, o complexo militar industrial dos EUA agigantou-se. O orçamento de Defesa do país é o maior da história.

Agora chegou a vez do Irã. O berço de uma das mais importantes civilizações criadas pela humanidade é a mais recente ameaça à "segurança dos EUA". A Agência Internacional de Energia Atômica não conseguiu encontrar qualquer prova de que o país esteja a utilizar as suas instalações nucleares com o objetivo de produzir armas nucleares. Com o aval do Brasil e da Turquia , o governo de Ahmadinejad comprometeu-se a que o seu urânio seja enriquecido no exterior com fins pacíficos. Mas Washington acaba de impor, através do Conselho de Segurança da ONU, novas sanções a Teerã. Mais: o presidente dos EUA ameaçou já utilizar armas atômicas táticas contra o país se ele não se submeter a todas as suas exigências. 

Isto acontece quando Obama se viu forçado a demitir o comandante chefe norte-americano no Afeganistão na seqüência de uma entrevista na qual o general McChrystal - aliás, um criminoso de guerra (vide artigo de John Catalinotto em odiario.info, 12.7.2010) - criticou duramente o presidente e esboçou um panorama desastroso da política da Casa Branca na região. 

Entre a farsa e a tragédia

Diariamente, a grande mídia norte-americana repete que a crise foi praticamente superada nos EUA graças às medidas tomadas pela administração Obama. É outra grande mentira. A taxa de desemprego mantém-se inalterada e a situação de dezenas de milhões de famílias é crítica.É suficiente ler os artigos sobre o tema de Prêmios Nobel da Economia (aliás, empenhados na salvação do capitalismo), como Joseph Stiglitz e Paul Krugman, por exemplo, para se compreender que a situação, longe de melhorar, pode eventualmente agravar-se. Não é a taxa do PIB que lhe define o rumo, porque a crise, global, é do sistema e não apenas financeira. 

Os discursos do presidente contribuem para confundir os cidadãos em vez de esclarecê-los. Persistem contradições entre a Casa Branca e a finança. Mas elas resultam de os senhores de Wall Street e os chairman das grandes transnacionais considerarem insuficientes as medidas da administração que os beneficiaram. Pretendem voltar a ter as mãos totalmente livres. 
A retórica presidencial não pode esconder que a estratégia de Obama visou no fundamental salvar e não punir os responsáveis por uma crise que adquiriu rapidamente proporções mundiais. As empresas acumulam novamente lucros fabulosos enquanto os trabalhadores apertam o cinto. A desigualdade social aumenta e os banqueiros, driblando decisões do Congresso, continuam a atribuir-se prêmios principescos. 

O grande capital resiste, aliás, com o apoio firme do Partido Republicano, a todas as medidas de caráter social, na maioria tímidas - como a reforma do sistema de saúde - que a administração adota (ver artigo de John Bellamy Forster, odiario.info, 13.7.2º10).É cada vez mais transparente que estamos perante uma crise do capitalismo, sem solução previsível, embora a esmagadora maioria da humanidade não tenha tomado consciência dessa realidade.A tentação de ampliar a escalada militar na Ásia como saída "salvadora" é muito forte, mas no próprio Pentágono generais influentes temem as conseqüências de um ataque ao Irã. A invasão terrestre está excluída e o bombardeio com armas convencionais de alvos estratégicos não produziria outro efeito que não fosse uma gigantesca onda de anti-americanisno no mundo muçulmano. 

O recurso a armas nucleares táticas é a opção de uma minoria. Essa hipótese tem sido admitida por destacadas personalidades internacionais, mas não se me afigura que possa concretizar-se. Não obstante a vassalagem dos governos da União Européia e do Japão, os povos condenariam massivamente uma repetição do genocídio de Hiroshima. Seria o prólogo de uma tragédia cujo desfecho poderia ser a extinção da humanidade.Retomo assim a afirmação do início, tema desta reflexão. A mentira na História dificulta extraordinariamente a compreensão da crise de civilização que o homem enfrenta.
 
Miguel Urbano Rodrigues é jornalista e escritor português.

      Fonte: http://www.correiocidadania.com.br