quarta-feira, 21 de julho de 2010

Nova York expulsa professor que viajou a Cuba com alunos

A Prefeitura de Nova York decidiu expulsar do sistema público de ensino da cidade um professor de um instituto de Manhattan que organizou uma viagem a Cuba em 2007 com seus alunos, em desobediência à vetusta proibição que o país mantém contra seus cidadãos, proibidos de visitarem a Ilha.

 

A agência municipal que supervisiona as escolas de Nova York decidiu, segundo relatório divulgado nesta quarta-feira (21), que Nathan Turner, um professor de história que lecionava no instituto de ensino médio Beacon, no bairro do Upper West Side, nunca mais poderá trabalhar como professor na cidade.

A prefeitura local afirma alega que Turner teria sido o único responsável por fazer com que alguns alunos desse instituto nova-iorquino quebrassem as leis federais que proíbem todos os cidadãos americanos de viajarem à ilha caribenha a partir do território americano.

As autoridades municipais retiram qualquer responsabilidade da direção da escola e acusam Turner pela viagem, ao mesmo tempo que açodadamente descrevem o professor como um "comunista que tinha de ver Fidel Castro mais uma vez antes que morresse".

Turner, que reuniu 30 estudantes e administrou a viagem mediante uma organização religiosa de Nova York, já tinha conseguido viajar para Cuba anteriormente com alunos de Beacon em 2000, 2001, 2003 e 2005, com o consentimento do centro e do Departamento de Educação do Estado de Nova York.

As viagens de estudos entre os Estados Unidos e Cuba são permitidas para alunos em idade universitária, mas o instituto Beacon conseguiu enviar em várias ocasiões seus alunos para Cuba, entre os que em 2005 se encontrava a enteada do agora governador de Nova York, David Paterson, segundo detalha o The New York Times.

Turner foi obrigado a deixar seu trabalho no instituto Beacon em 2008 e se mudou para Nova Orleans, onde dirige um projeto comunitário.

Da redação, com agências


Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia

Astrônomos detectam estrela gigantesca

Um corpo estelar duas vezes maior que os detectados até hoje foi enocntrado por astrônomos, quem consideram que o astro terá vida efêmera. Trata-se da estrela gigante R136a1, que tem massa equivalente a 250 vezes a do nosso Sol e é milhões de vezes mais luminosa, segundo descrição dos autores do estudo da Universidade britânica de Sheffield.

 

Este tipo de corpo estelare perdura por apenas alguns milhões de anos, antes de implodir, explicou Paul Crowther, o cientista principal.

As estrelas podem pertencer a dois conjuntos, os de massa pequena , como nosso Sol e os de grande massa, que chegam a no máximo um por cento na quantidade de estrelas existentes no Universo, assinalou o especialista. O R136a1 é um exemplo de um super peso pesado, exemplificou.

As estrelas de tamanho normal ao apagar-se transformam-se em anãs brancas, enquanto as de massa gigante podem formar buracos negros e estrelas de neutron, destacou.

"Levamos algum tempo para chegar a esta conclusão. Achava-se que esse corpo era grande, mas em realidade é enorme", agregou o especialista de Sheffield.

Uma estrela gigante é uma estrela com uma raio e uma luminosidade maior que uma estrela igual de seqüência principal com a mesma temperatura superficial . As que superam a luminosidade das gigantes se denominam supergigantes e hipergigantes.

Fonte: Prensa Latina

Estudantes apresentam propostas para as eleições deste ano

 

A União Nacional dos Estudantes (UNE) divulgou nesta terça-feira (20) – através do Portal EstudanteNet – um documento com as plataformas políticas dos estudantes para as eleições deste ano.

 

O documento intitulado “Projeto UNE pelo Brasil” foi elaborado através das propostas discutidas durante o 58º Conselho Nacional de Entidades Gerais (Coneg) da UNE – realizado entre os dias 22 e 25 de abril, no Rio de Janeiro. O evento reuniu mais de 500 lideranças estudantis de todo o país.

"Aprovamos um amplo documento construído com propostas discutidas entre as principais lideranças estudantis de todo o país. Aqui estão as nossas reivindicações, o que acreditamos serem avanços, e o que queremos avançar ainda mais. Vamos apresentar aos presidenciáveis e queremos o compromisso deles com nossas pautas. Esse é o papel da UNE. Exigir que a educação, o esporte, a cultura e muitas outras pautas que envolvam os jovens brasileiros tenham prioridade nessas eleições", explica o presidente da entidade, Augusto Chagas.

Propostas

O documento traça linhas estratégicas para o desenvolvimento do país na visão dos estudantes. Tais como mais educação, mais direitos à juventude, mais cultura, soberania internacional, mais democracia e direitos sociais.

“O Projeto Brasil é muito importante para marcar o posicionamento dos estudantes brasileiros com relação aos rumos que o Brasil deve tomar”, afirma o segundo vice-presidente da UNE, Bruno da Mata.

As propostas tratam, entre outros pontos, da aplicação de 50% do Fundo Social do Pré-sal para Educação, desenvolvimento sustentável com geração de empregos e distribuição de renda, defesa da diversidade cultural, do território nacional, pela democratização da comunicação, além de mais direitos para as mulheres e minorias.

Além do discurso

"Fundamental é fazer com que o projeto dos estudantes brasileiros seja construído através de mobilizações, debates e lutas dentro de cada universidade e nas ruas, apenas dessa maneira conquistaremos a universidade e a sociedade que queremos", pontua o primeiro vice-presidente da UNE, Sandino Patriota.

O Projeto UNE pelo Brasil – conduzido pelo movimento estudantil – afirma ainda que não serão aceitas políticas de retrocesso – com o retorno às privatizações, ao estado mínimo e às políticas de destruição da educação.

O objetivo da UNE é mobilizar a rede estudantil por todo o país na defesa do povo brasileiro e de sua soberania. A entidade – não declara apoio a nenhum a nenhum candidato à Presidência da República – pretende fazer a entrega formal do documento a todos os presidenciáveis.

Da Redação, com informações Portal EstudanteNet

Não são tempos de Barbosa Lima e Castelinho

Sidnei Liberal *

Entramos numa fase de campanha política em que a ordem é bater. Se não tiver como bater, há de se inventar, criar, repetir, requentar. Ainda não conseguimos atravessar o período em que o governo Lula foi invadido por um tal “denuncismo”, travestido de jornalismo investigativo. Irresponsável, politiqueiro, sem porteira, como diria Veríssimo, o pai.


É o que revelam tantos textos pseudojornalísticos, prenhes de “denunciou”, “teria elaborado”, “teria causado”, “foi acusada”, “escândalo”. Quase sempre de fonte suspeita, adversária. Interesses subreptícios, beirando o explícito. São palavras, intenções e ações que não resistem ao menor crivo do jornalismo sério.

O jornalismo sério, para informação da nova geração, é uma prática dos tempos de Barbosa Lima Sobrinho, de Carlos Castelo Branco. Hoje, anêmica, em baixa na bolsa midiática global.

É temerário, pois, auferir credibilidade passiva, acrítica, ao que está ou esteve na rede, nas revistas, jornais, ou foi divulgado por rádio e/ou televisão. Pior ainda os “repassando”, textos que circulam na internet, geralmente de má qualidade e pior credibilidade, no mais das vezes, apócrifos. Como se sabe, textos primários são impressos em papel. E papel tudo aceita. É por isso que o Jornalista tem o cacoete profissional, qual um cheque lista de aeronauta, de não escrever um texto que não responda a maioria das perguntas: quem? o que? quando? onde? e por que? O leitor crítico também busca estas respostas em suas leituras.

O leitor acrítico, não. Ele lê/ouve seu Jabor, Mainardi, Casoy, Cantanhêde, confiando que seus textos não possam ter a menor intenção de distorcer a realidade dos fatos. Não desconfia que cada fato pode ter mais de uma versão, cada uma ditada pelo interesse de quem a escreve e divulga. Ele não percebe que são muitas as armas do convencimento, seja uma aura de santidade, de falsa inquietação moral, seja uma contundência verbal ou a beleza plástica pela qual o texto se apresenta. A acriticidade da leitura e os textos sem o viés profissional têm dominado o panorama político brasileiro desde o “escândalo” do “mensalão”, quando, como dizia Nelson Rodrigues, “os idiotas perderam a modéstia”.

E por que o denuncismo? Nada como práticas deletérias antigas serem expostas em novo tempo e contexto para tentar, como foi largamente feito, desestabilizar a reeleição de um governo que não teve origem na elite e, ao mesmo tempo, teve a ousadia de tentar recuperar parte do que foi surrupiado dos pobres pela burguesia. A burguesia fede, dizia Cazuza. E é mesquinha e vingativa, diríamos. Ela não suporta ver um governo “analfabeto” ousar conduzir sua política exterior com soberania e responsabilidade em relação ao grande capital, aos donos da geopolítica internacional. Um governo que desafiou o usual adesismo automático de antes ao expansionismo do tio Sam.

A grande possibilidade de vitória da candidatura identificada com o atual governo, por um lado, e a defesa de interesses contrariados da nossa elite, personificados na candidatura tucana, por outro, têm produzido frenético retorno da onda denuncista. A grande maioria da imprensa nacional, comprometida com o retorno tucano, começa a mostrar suas ferramentas de fazer tramoia. Desta vez, com maior dose do que o presidente Lula chama de jogo rasteiro. Comprova-o a grosseria, a falta de respeito e o preconceito com que um grande jornal de circulação nacional, a Folha de S. Paulo, pôde estampar, em página nobre do jornal, a candidata Dilma caracterizada de prostituta.

Mais: Fabricação de boatos, dossiês fantasmas, câmaras e teclados atentos a qualquer escorregão. Episódios retirados do contexto e ressaltados como desqualificador da candidata. Como exemplo de tramóia, uma legítima contratação de assessoria jurídica para acompanhamento do processo eleitoral, como o fazem todos os candidatos. A mídia transforma o fato em artimanha da candidatura petista “para burlar” a legislação eleitoral.

No caso dos dossiês, a condenação pode ser pelo fato de ter sido (supostamente ou não) elaborado, vazado, comprado, ou, de outro lado, pelo seu conteúdo. Depende de quem pode ser atingido. Foi por essa tramoia que não mais soubemos o que aconteceu com o caso de mais de 1000 ambulâncias superfaturadas por uma máfia que se instalou no Ministério da Saúde de Serra. Quando o conteúdo supostamente atinge o lado da “base de sustentação”, não interessa discutir a elaboração, o “vazamento”, a compra do dossiê. Discute-se o conteúdo.

Se o assunto é um suposto esquema irregular de financiamento de campanha comandado pelo vice-presidente do PSDB Eduardo Jorge e, de quebra, uma milionária usina de arapongagem supostamente financiada pelo Ministério da Saúde para bisbilhotar futuros adversários presidenciáveis do candidato Serra, dá-se preferência à criação de uma suposta oferta de um “dossiê” correspondente ao comitê político do lado oposto. Um dos jornais assume a tramoia e forma-se uma retumbante onda em toda a mídia. Não são tempos de Barbosa Lima e Castelinho.
* Médico, membro da Direção do PCdoB – DF

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

As memórias balsâmicas podem minorar a insanidade moral?

Fatima Oliveira *

Diante do meu interesse sobre a capacidade de enfrentar problemas e resolvê-los sem gerar novos conflitos, e até que ponto a agressividade destruidora impede resolvê-los "numa boa", sem mortos e feridos, uma amiga disse que ando filosofando demais. Ela tem alguma razão. São perguntas filosóficas, mas ancoradas também em outros naipes. 

 

Meu interesse é focado em pessoas desprovidas do "locus da moralidade", que a psiquiatria catalogava como "insanité sans délire" (insanidade moral), hoje sociopatia ou psicopatia - uma condição neurodegenerativa, que atinge 1% a 3% da população, "intratável, incurável e irreversível" - o mesmo que Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS), ou Distúrbio da Personalidade Antissocial (DPAS), para maiores de 18 anos, e que na infância é diagnosticado como um dos "transtornos disruptivos do comportamento", atitudes antissociais: Transtorno Desafiador e de Oposição; Transtorno de Conduta; e Transtorno de Personalidade Antissocial.


Leiga em psiquiatria, prefiro a antiga terminologia "insanidade moral", que expressa bem a condição de TPAS/DPAS: insanos morais irrecuperáveis, pois não há ex-sociopata; não têm dó de ninguém; possuem memória afetiva distorcida: mesmo criados em ambientes emocionalmente saudáveis, sentem-se lesados. Compreendê-los exige mergulhar num mundo estranho, pois nascem incapazes de incorporar discernimento moral e habilidades sociais para solucionar problemas de modo ético e não conseguem sair da borrasca para um céu de brigadeiro, pois não possuem o porto seguro das memórias afetivas.


Rememorar a minha infância é balsâmico. Ouço vovó mandando entrar quando a brincadeira de roda estava na melhor parte: "Chispa! Pra dentro. Lave os pés e escove os dentes". Ordem inegociável. Depois de "asseada", eu corria para o colo do meu avô, que àquela hora sempre estava sentado na calçada "pegando uma fresca". Esperneava quando ele dizia: "Pega a menina Maria, já dormiu...". Ele não me levava até o quarto, pois não entrava no quarto das meninas. Era uma conduta moral lá das brenhas do sertão. Adulta, perguntei à vovó por que aquilo. Respondeu que "não se usava pai entrar no quarto das filhas, depois de grandes. Era o costume".


É doce ouvir: "Vamos ler a revista nova do papai?" Abria onde queria que eu lesse; e, se eu errasse a entonação, ou engolisse a pontuação, ele corrigia: "Lê de novo! Agora sem engolir as vírgulas e os pontos". Transporto-me para a máquina de costura da mamãe, onde eu surrupiava pedaços de pano para fazer roupas de boneca e, desgraçadamente, sempre quebrava a agulha e saía de fininho... Quando ela via a agulha quebrada, logo dizia: "A que horas aquela traquina passou por aqui?".


Insanos morais não guardam os carinhos recebidos e sentem que todos lhes devem tudo! Seria eficaz uma terapia que os ensine a cultivarem memórias balsâmicas? A criança que vive numa família (biológica ou social) sem bagagem emocional para suprir carinho e outras formas de afetividade pode ter dificuldades de aprender habilidades sociais para resolver problemas, mas não chega à "insanidade moral", apesar das evidências de que abandono e outras manifestações de desamor na infância estão estreitamente ligadas às posturas agressivas e similares. As que desfrutam de boa acolhida navegam em céu de brigadeiro - estado de aconchego que só quem é ou foi criança feliz tem para recordar e ser acalentada nos momentos difíceis ou felizes vida afora.


* Médica e escritora. É do Conselho Diretor da Comissão de Cidadania e Reprodução e do Conselho da Rede de Saúde das Mulheres Latino-americanas e do Caribe. Indicada ao Prêmio Nobel da paz 2005.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

terça-feira, 20 de julho de 2010

A arte e a rebeldia de Caravaggio

Mazé Leite *
 

Neste domingo, 18 de julho, completaram-se exatos 400 anos da morte de um dos maiores gênios da pintura: Michelangelo Merisi Da Caravaggio, ou simplesmente Caravaggio. Revolucionário em seu tempo, subverteu as regras estéticas impostas pelo Concílio de Trento. 

 

Os MúsicosMichelangelo Merisi nasceu no povoado de Caravaggio, na lombardia italiana, em 29/09/1571. Seus pais, Fermo Merisi e Lucia Oratori, morreram cedo. Com apenas 12 anos, foi enviado para estudar no atelier de Simoni Peterzano, que se dizia discípulo de Ticiano (1488-1576). Passou quatro anos vivendo e estudando no atelier desse mestre. Com ele, aprendeu o tratamento das cores segundo o método de Ticiano e o naturalismo da escola pictórica lombarda.

Tendo rompido com seu mestre, parte para Veneza onde observou obras de Ticiano, e a técnica do sfumato de Leonardo da Vinci (1452-1519). A atitude artística do jovem pintor já era de rebeldia contra os convencionalismos de sua época. E o homem Caravaggio também era atraído por brigões, beberrões e vagabundos, freqüentando prostíbulos, jogos e se envolvendo em todo tipo de confusão, inclusive com os sbirri, a polícia. Era um homem agoniado, inquieto.

Mas seu destino era Roma, a cidade que atraía artistas de todo canto, devido à demanda da igreja católica que transformava a cidade num canteiro de obras, com o objetivo de ser o centro da cristandade e do mundo civilizado. Artistas de toda a Europa afluíam à cidade, participando das discussões sobre pintura, estudando os mestres.

Chegando à cidade, foi morar na casa do monsenhor Pandolfo Puzzi, onde viveu em condições tão frugais que apelidou o padre de “monsenhor salada”. Caravaggio perambulava pela cidade, percorrendo ateliês em busca de trabalho. Necessitado, pintava até três quadros por dia, que vendia muito barato. Com o passar do tempo, foi ficando conhecido e, segundo o biógrafo Gilles Lambert, Caravaggio alternava com seus amigos “sessões de trabalho, de festas e de diversões no submundo”. Era amigo de homossexuais e prostitutas, muitos dos quais posaram para ele em seu atelier. Seus modelos eram esses marginalizados, em quem o artista via o desespero da luta cotidiana pela sobrevivência em um ambiente dominado pela miséria. Em plena Roma, a cidade dos papas e cardeais cercados de riqueza e opulência!

No começo, Caravaggio se recusou a pintar quadros com temas religiosos. Mas logo, aconselhado por colegas, viu que essa era uma forma de sobreviver e pintou “São Francisco recebendo os estigmas”, de 1595, considerada a pioneira e a que melhor expressa a estética da arte barroca. Em geral os quadros eram encomendados por ricos burgueses que com eles presenteavam as igrejas, mas muitos de seus quadros foram recusados pelos padres. Nota-se que, nele, a transcendência do divino não surge como um além separado do mundo, mas como realidade da alma humana.

Em maio de 1606, em meio a uma briga de jogo, Caravaggio matou um colega. Condenado à morte, fugiu para Nápoles, depois indo para a ilha de Malta. De lá, fugiu para a Sicília, após agredir um cavaleiro da Ordem de Malta. Cansado, doente, ansioso pelo indulto que o permitiria voltar a Roma para continuar seu trabalho, foi detido no Porto Ercole, por engano, e levado à fortaleza da cidade. Lambert diz que ele foi visto, já livre da prisão, “atarantado, faminto, enfermo, extenuado em busca de um barco” que o levasse de volta a Roma. Estava infectado por feridas e com febre. E assim morreu no dia 18 de julho de 1610, antes de receber a notícia de seu indulto.

Fora essa vida inquieta e atribulada, Caravaggio foi um pintor original. O aspecto mais notável de sua obra é o tratamento do claro-escuro. Consiste em projetar a luz sobre as figuras com um contraste intenso e brusco com as sombras, o que marca o início de uma das grandes conquistas da pintura barroca. Outra característica primordial de seu estilo é o realismo enfático como reação ao idealismo renascentista. Ao invés de pintar figuras, mesmo as religiosas, com ar solene ou suave, conforme os ditames da igreja, ele as trata com um realismo quase insolente, usando como modelos, o povo das ruas.

Um bom exemplo, entre inúmeros outros, é o quadro O Enterro da Virgem. A figura de Maria foi inspirada no cadáver de uma prostituta afogada no rio Tibre e com o ventre inchado. Maria Madalena foi retratada muitas vezes a partir do modelo de uma jovem amante do pintor, assim como seus vários “João Batista” teve como modelo um rapaz amante de Caravaggio, que era bissexual.

As personagens principais dos quadros de Caravaggio estão sempre localizados na obscuridade: um cômodo sombrio, um exterior noturno ou simplesmente um fundo escuro. Uma luz poderosa que provém de um ponto da parte superior da tela envolve os personagens à maneira de um projetor de luz sobre uma cena de teatro. O coração da cena é especialmente iluminado e os contrastes produzidos por essa maneira de pintar conferem uma atmosfera dramática ao quadro.

Edward Gombrich, em seu livro História da Arte, diz que Caravaggio queria a verdade, acima de tudo. Por isso não tinha respeito pela beleza idealizada de seu tempo. No quadro São Tomé, os três apóstolos parecem trabalhadores comuns, com os rostos curtidos pelo tempo, testas enrugadas. Ele queria copiar a natureza, fosse ela bela ou feia e fez todo o possível para que as figuras dos textos bíblicos parecessem reais.
Sem Caravaggio não haveria – como diz o crítico de arte Roberto Longhi – “Ribera, Vermeer, La Tour, Rembrandt. E Delacroix, Courbet e Manet teriam pintado de outra maneira”. Poucos artistas têm fascinado a posteridade de artistas e encorajado a ousadia criativa como ele o fez.
* Artista plástica, membro do Atelier de Arte Realista de Maurício Takiguthi, designer gráfica. Graduanda em Letras pela FFLCH-USP. Membro da coordenação da Seção Paulista da Fundação Maurício Grabois.

Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna

Religião na escola estimula o preconceito e a intolerância

Carlos Pompe *

A professora Débora Diniz, da Universidade de Brasília (UnB) liderou uma pesquisa que apurou que livros didáticos mais aceitos pelas escolas públicas promovem a homofobia e pregam o cristianismo. O estudo gerou o livro Laicidade: O Ensino Religioso no Brasil.


A pesquisa conclui que o preconceito e a intolerância religiosa são inculcados em milhares de crianças e jovens do ensino fundamental brasileiro. Foram analisados os 25 livros de ensino religioso mais usados pelas escolas públicas do país. Os livros foram escolhidos a partir dos títulos mais aceitos pelas escolas do governo federal, segundo informações do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. A imagem de Jesus Cristo aparece 80 vezes mais do que a de uma liderança indígena no campo religioso – limitada a uma referência anônima e sem biografia –, 12 vezes mais que o líder budista Dalai Lama e ainda conta com um espaço 20 vezes maior que Lutero, referência intelectual para o Protestantismo (Calvino nem mesmo é citado).

“O estímulo à homofobia e a imposição de uma espécie de ‘catecismo cristão’ em sala de aula são uma constante nas publicações”, informa uma das autoras do trabalho, a antropóloga e professora do Departamento de Serviço Social, Débora Diniz.

A psicóloga e coautora do livro, Tatiana Lionço, salienta que, antes de ir parar nas mochilas de crianças e jovens, todo material didático passa por uma avaliação de uma banca de profissionais do Programa Nacional do Livro Didático, vinculado ao Ministério da Educação. Todos, menos os de Religião. “Não há qualquer tipo de controle. O resultado é a má formação dos alunos”, comenta.

Ela questiona o modelo de ensino religioso nas escolas do país com base no princípio constitucional de que o Estado deveria ser laico (neutro em relação às religiões). “Se o Estado deveria ser laico, por que ensinar religião nas escolas? Se a religião for tratada na sala de aula, tem de ser de forma responsável e diversificada”, acrescenta.

A discriminação de homossexuais vem junto com a doutrinação religiosa feita às cutas do Estado, em escolas públicas. “Desvio moral”, “doença física ou psicológica”, “conflitos profundos” e “o homossexualismo não se revela natural” são algumas das expressões usadas para tratar das pessoas que optam por ligações com o mesmo sexo. Um exercício com a bandeira das cores do arco-íris acaba com a seguinte questão: “Se isso (o homossexualismo) se tornasse regra, como a humanidade iria se perpetuar?”.

Débora diz que num dos livros didáticos uma pessoa sem religião é associada ao nazismo (que, contraditoriamente, teve apoio ativo da Igreja Católica e foi combatido pela União Soviética, primeiro Estado a adotar expressamente o materialismo dialético no ensino público). “É sugerida uma associação de que um ateu tenderia a ter comportamentos violentos e ameaçadores”, observa. “Os livros usam de generalizações para levar a desinformação e pregar o cristianismo”, completa ela que é uma das três autoras da pesquisa.

“Há uma clara confusão entre o ensino religioso e a educação cristã”, afirma Débora. A antropóloga reforça a imposição do catecismo. “Cristãos tiveram 609 citações nos livros, enquanto religiões afro-brasilieras, tratadas como ‘tradições’, aparecem em apenas 30 momentos”, comenta.

O estudo, realizado entre março e julho de 2009, revela a ligação entre as editoras responsáveis pelas publicações e a doutrinação religiosa. A editora FTD, por exemplo, pertence aos irmãos Maristas, sociedade católica criada em 1817, na França. Também são católicas as editoras Vozes, Paulus Paulinas, Vida e Edições Loyola. “É esse contexto nebuloso de relações e interesses que envolve a pesquisa” diz Débora. Outras das principais editoras do material escolar são a Abril de Educação, líder do mercado, a Ártica, Scipione Saraiva, Moderna e Dimensão.

As 112 páginas da publicação, lançada pelas editoras UnB e Letras Livres, ainda conta com a contribuição da assistente social Vanessa Carrião, do instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.
* Jornalista e curioso do mundo.
Fonte: http://www.vermelho.org.br/coluna