terça-feira, 12 de janeiro de 2016

PESQUISADORA DENUNCIA FARSA NA CRISE DA PREVIDÊNCIA SOCIAL





'' Se os movimentos sociais não estiverem bem organizados para pressionarem na defesa de seus interesses pode haver mais perdas de proteção social, como ocorreu em reformas anteriores.''


Em tese de doutorado, pesquisadora denuncia a farsa da crise da Previdência Social no Brasil forjada pelo governo com apoio da imprensa.

ENTREVISTA - DENISE GENTIL

A crise forjada da Previdência

Por Coryntho Baldez

Com argumentos insofismáveis, Denise Gentil destroça os mitos oficiais que encobrem a realidade da Previdência Social no Brasil. Em primeiro lugar, uma gigantesca farsa contábil transforma em déficit o superávit do sistema previdenciário, que atingiu a cifra de R$ 1,2 bilhões em 2006, segundo a economista.

O superávit da Seguridade Social - que abrange a Saúde, a Assistência Social e a Previdência - foi significativamente maior: R$ 72,2 bilhões. No entanto, boa parte desse excedente vem sendo desviada para cobrir outras despesas, especialmente de ordem financeira - condena a professora e pesquisadora do Instituto de Economia da UFRJ, pelo qual concluiu sua tese de doutorado "A falsa crise da Seguridade Social no Brasil: uma análise financeira do período 1990 - 2005" (leia a tese na íntegra).

Nesta entrevista ao Jornal da UFRJ, ela ainda explica por que considera insuficiente o novo cálculo para o sistema proposto pelo governo e mostra que, subjacente ao debate sobre a Previdência, se desenrola um combate entre concepções distintas de desenvolvimento econômico-social.

Jornal da UFRJ: A idéia de crise do sistema previdenciário faz parte do pensamento econômico hegemônico desde as últimas décadas do século passado. Como essa concepção se difundiu e quais as suas origens?

Denise Gentil: A idéia de falência dos sistemas previdenciários públicos e os ataques às instituições do welfare state (Estado de Bem- Estar Social) tornaram-se dominantes em meados dos anos 1970 e foram reforçadas com a crise econômica dos anos 1980. O pensamento liberal-conservador ganhou terreno no meio político e no meio acadêmico. A questão central para as sociedades ocidentais deixou de ser o desenvolvimento econômico e a distribuição da renda, proporcionados pela intervenção do Estado, para se converter no combate à inflação e na defesa da ampla soberania dos mercados e dos interesses individuais sobre os interesses coletivos. Um sistema de seguridade social que fosse universal, solidário e baseado em princípios redistributivistas conflitava com essa nova visão de mundo. O principal argumento para modificar a arquitetura dos sistemas estatais de proteção social, construídos num período de crescimento do pós-guerra, foi o dos custos crescentes dos sistemas previdenciários, os quais decorreriam, principalmente, de uma dramática trajetória demográfica de envelhecimento da população. A partir de então, um problema que é puramente de origem sócio-econômica foi reduzido a um mero problema demográfico, diante do qual não há solução possível a não ser o corte de direitos, redução do valor dos benefícios e elevação de impostos. Essas idéias foram amplamente difundidas para a periferia do capitalismo e reformas privatizantes foram implantadas em vários países da América Latina.

Jornal da UFRJ: No Brasil, a concepção de crise financeira da Previdência vem sendo propagada insistentemente há mais de 15 anos. Os dados que você levantou em suas pesquisas contradizem as estatísticas do governo. Primeiramente, explique o artifício contábil que distorce os cálculos oficiais.


Denise Gentil: Tenho defendido a idéia de que o cálculo do déficit previdenciário não está correto, porque não se baseia nos preceitos da Constituição Federal de 1988, que estabelece o arcabouço jurídico do sistema de Seguridade Social. O cálculo do resultado previdenciário leva em consideração apenas a receita de contribuição ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) que incide sobre a folha de pagamento, diminuindo dessa receita o valor dos benefícios pagos aos trabalhadores. O resultado dá em déficit. Essa, no entanto, é uma equação simplificadora da questão. Há outras fontes de receita da Previdência que não são computadas nesse cálculo, como a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) e a receita de concursos de prognósticos. Isso está expressamente garantido no artigo 195 da Constituição e acintosamente não é levado em consideração.

Jornal da UFRJ: A que números você chegou em sua pesquisa?

Denise Gentil: Fiz um levantamento da situação financeira do período 1990-2006. De acordo com o fluxo de caixa do INSS, há superávit operacional ao longo de vários anos. Em 2006, para citar o ano mais recente, esse superávit foi de R$ 1,2 bilhões.

O superávit da Seguridade Social, que abrange o conjunto da Saúde, da Assistência Social e da Previdência, é muito maior. Em 2006, o excedente de recursos do orçamento da Seguridade alcançou a cifra de R$ 72,2 bilhões.

Uma parte desses recursos, cerca de R$ 38 bilhões, foi desvinculada da Seguridade para além do limite de 20% permitido pela DRU (Desvinculação das Receitas da União).

Há um grande excedente de recursos no orçamento da Seguridade Social que é desviado para outros gastos. Esse tema é polêmico e tem sido muito debatido ultimamente. Há uma vertente, a mais veiculada na mídia, de interpretação desses dados que ignora a existência de um orçamento da Seguridade Social e trata o orçamento público como uma equação que envolve apenas receita, despesa e superávit primário. Não haveria, assim, a menor diferença se os recursos do superávit vêm do orçamento da Seguridade Social ou de outra fonte qualquer do orçamento.

Interessa apenas o resultado fiscal, isto é, o quanto foi economizado para pagar despesas financeiras com juros e amortização da dívida pública.

Por isso o debate torna-se acirrado. De um lado, estão os que advogam a redução dos gastos financeiros, via redução mais acelerada da taxa de juros, para liberar recursos para a realização do investimento público necessário ao crescimento. Do outro, estão os defensores do corte lento e milimétrico da taxa de juros e de reformas para reduzir gastos com benefícios previdenciários e assistenciais. Na verdade, o que está em debate são as diferentes visões de sociedade, de desenvolvimento econômico e de valores sociais.


LEIA TAMBÉM: Desafio de 2016: Preservar as conquistas previdenciárias


Jornal da UFRJ: Há uma confusão entre as noções de Previdência e de Seguridade Social que dificulta a compreensão dessa questão. Isso é proposital?

Denise Gentil: Há uma grande dose de desconhecimento no debate, mas há também os que propositadamente buscam a interpretação mais conveniente. A Previdência é parte integrante do sistema mais amplo de Seguridade Social.

É parte fundamental do sistema de proteção social erguido pela Constituição de 1988, um dos maiores avanços na conquista da cidadania, ao dar à população acesso a serviços públicos essenciais. Esse conjunto de políticas sociais se transformou no mais importante esforço de construção de uma sociedade menos desigual, associado à política de elevação do salário mínimo. A visão dominante do debate dos dias de hoje, entretanto, freqüentemente isola a Previdência do conjunto das políticas sociais, reduzindo-a a um problema fiscal localizado cujo suposto déficit desestabiliza o orçamento geral. Conforme argumentei antes, esse déficit não existe, contabilmente é uma farsa ou, no mínimo, um erro de interpretação dos dispositivos constitucionais.

Entretanto, ainda que tal déficit existisse, a sociedade, através do Estado, decidiu amparar as pessoas na velhice, no desemprego, na doença, na invalidez por acidente de trabalho, na maternidade, enfim, cabe ao Estado proteger aqueles que estão inviabilizados, definitiva ou temporariamente, para o trabalho e que perdem a possibilidade de obter renda. São direitos conferidos aos cidadãos de uma sociedade mais evoluída, que entendeu que o mercado excluirá a todos nessas circunstâncias.

Jornal da UFRJ: E são recursos que retornampara a economia?

Denise Gentil: É da mais alta relevância entender que a Previdência é muito mais que uma transferência de renda a necessitados. Ela é um gasto autônomo, quer dizer, é uma transferência que se converte integralmente em consumo de alimentos, de serviços, de produtos essenciais e que, portanto, retorna das mãos dos beneficiários para o mercado, dinamizando a produção, estimulando o emprego e multiplicando a renda. Os benefícios previdenciários têm um papel importantíssimo para alavancar a economia. O baixo crescimento econômico de menos de 3% do PIB (Produto Interno Bruto), do ano de 2006, seria ainda menor se não fossem as exportações e os gastos do governo, principalmente com Previdência, que isoladamente representa quase 8% do PIB.

Jornal da UFRJ: De acordo com a Constituição, quais são exatamente as fontes que devem financiar a Seguridade Social?


Denise Gentil: A seguridade é financiada por contribuições ao INSS de trabalhadores empregados, autônomos e dos empregadores; pela Cofins, que incide sobre o faturamento das empresas; pela CSLL, pela CPMF (que ficouconhecida como o imposto sobre o cheque) e pela receita de loterias. O sistema de seguridade possui uma diversificada fonte de financiamento. É exatamente por isso que se tornou um sistema financeiramente sustentável, inclusive nos momentos de baixo crescimento, porque além da massa salarial, o lucro e o faturamento são também fontes de arrecadação de receitas. Com isso, o sistema se tornou menos vulnerável ao ciclo econômico. Por outro lado, a diversificação de receitas, com a inclusão da taxação do lucro e do faturamento, permitiu maior progressividade na tributação, transferindo renda de pessoas com mais alto poder aquisitivo para as de menor.

Jornal da UFRJ: Além dessas contribuições, o governo pode lançar mão do orçamento da União para cobrir necessidades da Seguridade Social?

Denise Gentil: É exatamente isso que diz a Constituição. As contribuições sociais não são a única fonte de custeio da Seguridade. Se for necessário, os recursos também virão de dotações orçamentárias da União. Ironicamente tem ocorrido o inverso. O orçamento da Seguridade é que tem custeado o orçamento fiscal.

Jornal da UFRJ: O governo não executa o orçamento à parte para a Seguridade Social, como prevê a Constituição, incorporando-a ao orçamento geral da União. Essa é uma forma de desviar recursos da área social para pagar outras despesas?

Denise Gentil: A Constituição determina que sejam elaborados três orçamentos: o orçamento fiscal, o orçamento da Seguridade Social e o orçamento de investimentos das estatais. O que ocorre é que, na prática da execução orçamentária, o governo apresenta não três, mas um único orçamento chamandoo de "Orçamento Fiscal e da Seguridade Social", no qual consolida todas as receitas e despesas, unificando o resultado. Com isso, fica difícil perceber a transferência de receitas do orçamento da Seguridade Social para financiar gastos do orçamento fiscal. Esse é o mecanismo de geração de superávit primário no orçamento geral da União. E, por fim, para tornar o quadro ainda mais confuso, isola-se o resultado previdenciário do resto do orçamento geral para, com esse artifício contábil, mostrar que é necessário transferir cada vez mais recursos para cobrir o "rombo" da Previdência. Como a sociedade pode entender o que realmente se passa?

Jornal da UFRJ: Agora, o governo pretende mudar a metodologia imprópria de cálculo que vinha usando. Essa mudança atenderá completamente ao que prevê a Constituição, incluindo um orçamento à parte para a Seguridade Social?


Denise Gentil: Não atenderá o que diz a Constituição, porque continuará a haver um isolamento da Previdência do resto da Seguridade Social. O governo não pretende fazer um orçamento da Seguridade. Está propondo um novo cálculo para o resultado fiscal da Previdência. Mas, aceitar que é preciso mudar o cálculo da Previdência já é um grande avanço. Incluir a CPMF entre as receitas da seguridade é um reconhecimento importante, embora muito modesto. Retirar o efeito dos incentivos fiscais sobre as receitas também ajuda a deixar mais transparente o que se faz com a política previdenciária. O que me parece inadequado, entretanto, é retirar a aposentadoria rural da despesa com previdência porque pode, futuramente, resultar em perdas para o trabalhador do campo, se passar a ser tratada como assistência social, talvez como uma espécie de bolsa. Esse é um campo onde os benefícios têm menor valor e os direitos sociais ainda não estão suficientemente consolidados.

Jornal da UFRJ: Como você analisa essa mudança de postura do Governo Federal em relação ao cálculo do déficit? Por que isso aconteceu?

Denise Gentil: Acho que ainda não há uma posição consolidada do governo sobre esse assunto. Há interpretações diferentes sobre o tema do déficit da Previdência e da necessidade de reformas. Em alguns segmentos do governo fala-se apenas em choque de gestão, mas em outras áreas, a reforma da previdência é tratada como inevitável. Depois que o Fórum da Previdência for instalado, vão começar os debates, as disputas, a atuação dos lobbies e é impossível prever qual o grau de controle que o governo vai conseguir sobre seus rumos. Se os movimentos sociais não estiverem bem organizados para pressionarem na defesa de seus interesses pode haver mais perdas de proteção social, como ocorreu em reformas anteriores.

Jornal da UFRJ: A previdência pública no Brasil, com seu grau de cobertura e garantia de renda mínima para a população, tem papel importante como instrumento de redução dos desequilíbrios sociais?

Denise Gentil: Prefiro não superestimar os efeitos da Previdência sobre os desequilíbrios sociais. De certa forma, tem-se que admitir que vários estudos mostram o papel dos gastos previdenciários e assistenciais como mecanismos de redução da miséria e de atenuação das desigualdades sociais nos últimos quatro anos. Os avanços em termos de grau de cobertura e de garantia de renda mínimapara a população são significativos. Pela PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), cerca de 36,4 milhões de pessoas ou 43% da população ocupada são contribuintes do sistema previdenciário. Esse contingente cresceu de forma considerável nos últimos anos, embora muito ainda necessita ser feito para ampliar a cobertura e evita que, no futuro, a pobreza na velhice se torne um problema dos mais graves. O fato, porém, de a população ter assegurado o piso básico de um salário mínimo para os benefícios previdenciários é de fundamental importância porque, muito embora o valor do salário mínimo esteja ainda distante de proporcionar condições dignas de sobrevivência, a política social de correção do salário mínimo acima da inflação tem permitido redução da pobreza e atenuado a desigualdade da renda.

Cerca de dois milhões de idosos e deficientes físicos recebem benefícios assistenciais e 524 mil são beneficiários do programa de renda mensal vitalícia. Essas pessoas têm direito a receber um salário mínimo por mês de forma permanente.

Evidentemente que tudo isso ainda é muito pouco para superar nossa incapacidade histórica de combater as desigualdades sociais. Políticas muito mais profundas e abrangentes teriam que ser colocadas em prática, já que a pobreza deriva de uma estrutura produtiva heterogênea e socialmente fragmentada que precisa ser transformada para que a distância entre ricos e pobres efetivamente diminua. Além disso, o crescimento econômico é condição fundamental para a redução da pobreza e, nesse quesito, temos andado muito mal. Mas a realidade é que a redução das desigualdades sociais recebeu um pouco mais de prioridade nos últimos anos do que em governos anteriores e alguma evolução pode ser captada através de certos indicadores.

Jornal da UFRJ: Apesar do superávit que o governo esconde, o sistema previdenciário vem perdendo capacidade de arrecadação. Isso se deve a fatores demográficos, como dizem alguns, ou tem relação mais direta com a política econômica dos últimos anos?

Denise Gentil: A questão fundamental para dar sustentabilidade para um sistema previdenciário é o crescimento econômico, porque as variáveis mais importantes de sua equação financeira são emprego formal e salários. Para que não haja risco do sistema previdenciário ter um colapso de financiamento é preciso que o país cresça, aumente o nível de ocupação formal e eleve a renda média no mercado de trabalho para que haja mobilidade social. Portanto, a política econômica é o principal elemento que tem que entrar no debate sobre "crise" da Previdência. Não temos um problema demográfico a enfrentar, mas de política econômica inadequada para promover o crescimento ou a aceleração do crescimento.

Publicado no Jornal da UFRJ

Fonte / Reprodução: http://www.adunicentro.org.br

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

O IDEOLOGO DO AGRONEGÓCIO E O GENOCÍDIO


"Felizes sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque é grande a vossa recompensa nos céus. Pois foi deste modo que perseguiram os profetas que vieram antes de vós." (Mateus 5, 11-12).

O texto assinado por Denis Lerrer Rosenfield no Globo em 16 de novembro de 2015 ataca o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), cuja credibilidade é atestada nos seus mais de 40 anos de ação missionária em defesa dos direitos indígenas. Nossa atuação é fundamentada no Evangelho de Jesus Cristo e na premissa de que é preciso promover a vida e a dignidade, em especial daqueles que têm sido excluídos e desrespeitados. Esta opção teológica em favor dos povos indígenas contraria quem defende que tudo deve se dobrar à lógica do mercado.

Rosenfield contesta as informações divulgadas pelo Cimi sobre os assassinatos de indígenas no Mato Grosso do Sul. Esclarecemos que as informações veiculadas em nossos relatórios anuais provêm de fontes oficiais, de notícias da imprensa e dos povos indígenas com os quais atuamos. Estes dados, vistos no seu conjunto, permitem afirmar que se trata, sim, de genocídio, entendimento compartilhado pelo Ministério Público Federal (MPF), pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e pela Anistia Internacional. E, nesse sentido, em boa hora, a Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul criou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio, investigação que poderá demonstrar as precárias condições de vida a que estão submetidos os povos indígenas daquele estado.

Em Mato Grosso do Sul, 390 indígenas foram assassinados (2003 a 2014) e 707 cometeram suicídio (2000 a 2014), conforme dados do Ministério da Saúde. A situação de confinamento em terras ínfimas, a prolongada permanência em acampamentos em beira de rodovias, a falta de perspectivas e a violência e a discriminação cotidianas estão entre os fatores que levam ao incremento dos suicídios e assassinatos entre os indígenas. A questão fundiária está, portanto, na raiz desta grave realidade.

Os dados sobre violências contra os indígenas em Mato Grosso do Sul estão estampados cotidianamente nos jornais, são denunciados pelo Ministério Público Federal, por lideranças indígenas e pelos movimentos de defesa dos direitos humanos no Brasil e no exterior. A situação é tão grave que, por vezes, o governo federal intervém diretamente, a exemplo do que ocorreu em agosto de 2015, quando a Polícia Federal e o Exército foram enviados ao município de Antônio João para evitar que fazendeiros agissem cruelmente contra os Guarani e Kaiowá da terra Cerro Marangatu, onde o indígena Semião Vilhalva foi assassinado.

Outro argumento utilizado por quem defende uma ideologia desenvolvimentista é o de que o Cimi estaria a serviço de interesses internacionais. Recomendamos uma leitura atenta dos artigos 20 e 231 da Constituição federal, que conceituam as terras indígenas como sendo bens da União, destinadas ao usufruto exclusivo dos índios. A demarcação é um modo de assegurar que essas terras não estejam disponíveis à ganância exploratória internacional. Não se pode afirmar o mesmo de áreas de latifúndio voltadas à exportação ou de empreendimentos agropecuários e minerários vinculados a empresas multinacionais.

Rosenfield defende que o marco temporal da Constituição de 1988 seria uma linha divisória na demarcação das terras indígenas. No entender do Cimi, não há como compactuar com manobras jurídicas ou políticas que restrinjam direitos, e é absurda a interpretação de que a data de promulgação de nossa Lei Maior anule direitos fundamentais que a antecedem. Se isso ocorresse, se conflagraria um estado de insegurança jurídica sem precedentes.

Reiteramos nosso compromisso com os povos indígenas pela defesa da vida e de seus direitos constitucionais. Nossa inspiração missionária vem das palavras de Jesus Cristo: "Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em plenitude" (João, 10, 10).


Artigo do presidente do Cimi, Dom Roque Paloschi, originalmente publicado no jornal O Globo do dia 08/12/2015.


Fonte: http://www.cimi.org.br/

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

RETROCESSOES NA AMÉRICA LATINA

''(...) os governos progressistas se omitiram quanto à única via capaz de garantir-lhes sustentabilidade: formação e organização política de suas bases eleitorais.''

Frei Betto, Escritor, Religioso Dominicano
A vitória eleitoral de Macri, novo presidente da Argentina, é mais um passo da América Latina rumo ao neoconservadorismo. O processo de desmonte das políticas neoliberais, tão em voga nas décadas de 1980 e 1990, teve início com a eleição de Chávez na Venezuela, em 1998.

Em seguida, foram eleitos vários presidentes progressistas: Lula no Brasil, Lugo no Paraguai, Zelaya em Honduras, Funes em El Salvador, Bachelet no Chile, Morales na Bolívia e Mujica no Uruguai. Cuba e Nicarágua foram pioneiras nesse processo.

Esse avanço neutralizou a proposta da ALCA e favoreceu a criação de instituições de articulação regional e continental, como Aliança Bolivariana, Unasul, Celac, e fortaleceu o Mercosul.

No conjunto da América Latina, as condições sociais melhoraram significativamente, com a redução da miséria absoluta.

Ser de esquerda em um mundo dominado pela direita é quase como se manter virgem no bordel. A ascensão das forças progressistas na América Latina, na virada dos séculos 20 e 21, despontou como a ocasião de desmontar a tese de Robert Michels (1911), de que todo partido de esquerda que trafega nas vias da legalidade burguesa é inevitavelmente cooptado por ela.

Em dois países a direita enveredou pelo atalho do golpismo, e interrompeu a possibilidade de reformas pela via democrática: Honduras (2009) e Paraguai (2012). Nos demais, a direita tem sido beneficiada por erros dos governos progressistas.

Com exceção de Cuba e da Bolívia, todos eles acreditaram poder segurar o violino com a esquerda e tocar com a direita… O que se vê é um concerto desafinado.

Ainda que políticas sociais tenham sido implementadas com êxito e livrado milhões de pessoas da miséria, as reformas estruturais, quando feitas (infelizmente não é o caso do Brasil), não foram suficientes para criar um modelo alternativo ao neodesenvolvimentismo consumista.

A economia permaneceu com todas as suas características neocoloniais, de exportação de produtos primários, agora denominados commodities. Não se criou um mercado interno sustentável, nem se reduziu a desigualdade social, ainda que tenha havido aumento do poder aquisitivo dos pobres.

O erro principal, porém, foi não complementar a inclusão econômica com a inclusão política. Os benefícios aos mais pobres vieram como iniciativa do Estado e não como conquista do povo. Não se organizou politicamente o pobretariado. Não se conscientizou o oprimido. Não se fez da grande massa de eleitores protagonistas políticos. A exceção é a Bolívia, onde há o mais consistente governo progressista da América Latina. E o é justamente por priorizar, no arco de alianças políticas, os movimentos sociais.

A Argentina pode ser a primeira peça do dominó a tombar. Brasil e Venezuela se destacam no alvo dos neoliberais.

Em um mundo que, ameaçado pelo terrorismo, troca a liberdade pela segurança, e cujo poder financeiro (especulação) se sobrepõe ao industrial (produção), e no qual a ambição de consumo prevalece sobre o direito à cidadania, os governos progressistas se omitiram quanto à única via capaz de garantir-lhes sustentabilidade: formação e organização política de suas bases eleitorais. Muitos partidos se deixaram contaminar pela corrupção, e não cuidaram da “alfabetização política”.

Eis que o sonho ameaça virar pesadelo. A menos que a esquerda perca a vergonha de ser de esquerda.

Frei Betto - Teólogo, Escritor e Religioso Dominicano

Fonte: http://www.patrialatina.com.br

Rico é “sonegador”. Pobre é “caloteiro”, “vagabundo”, “aproveitador”

''Ricos que cometem um crime são “jovens''. Pobres que cometem crimes são “menores infratores''

Uma milícia branca armada até os dentes que toma um prédio público no Oregon e promete resistir contra a opressão do governo federal é composta de “ativistas armados''. Grupos por direitos civis que fecham vias públicas para protestar contra a violência policial contra negros por lá adotam práticas “terroristas''. A discussão sobre esse caso tomou a mídia dos Estados Unidos e Europa e há bons textos mostrando como um “dois pesos, duas medidas'' tem sido adotado para aborda-lo. Conhecemos bem essa prática:
Ricos que cometem um crime são “jovens''. Pobres que cometem crimes são “menores infratores''.
“Manifestantes'' são aqueles que fecham avenidas para lutar por algo com o qual concordamos. “Baderneiros'' são aqueles que fazem o mesmo por algo sobre o que discordamos.
Empresas que grilam terras públicas são “ocupantes irregulares''. Grupos de sem-terra que permanecem em fazendas griladas e pedem sua destinação à reforma agrária são “invasores''.
Da mesma forma, proprietários de imóveis mantidos vazios para a especulação imobiliária que devem o seu preço em IPTU atrasado são “devedores do poder público'', enquanto os sem-teto que ocupam esses imóveis pedindo sua destinação à moradia popular são “invasores''.
Árabe que se mata com bombas pelo corpo é um “fanático'' que prova a irracionalidade das culturas não-ocidentais. Um ocidental que sai matando todo mundo em protesto contra política de diversidade social é um “louco''.
Rico que deixa de pagar milhões em impostos não é “ladrão''. Ele está apenas exercendo seu protesto contra a pesada carga tributária. “Ladrão'' é pobre que rouba xampu. De um lado, “sonegador'', do outro, o “caloteiro'', o “vagabundo'', o “aproveitador'' que não pagou a mensalidade do carnê da geladeira.
A discussão de qualquer política para regulação de rádio e TV, que são concessões públicas, é “censura e ataque à democracia''. Mas quando o novo presidente da Argentina desmonta a agência pública que trata do assunto por decreto, sem passar a discussão pelo Congresso, escutamos um estrondoso silêncio.
A escolha de uma palavra para nomear um fato ou qualificar um fenômeno, parece aleatória, é consequência de uma série de processos na nossa cabeça que evocam experiências vividas, traumas, aprendizados, doutrinações, medos, bloqueios.
Da mesma forma, aquilo que não dizemos, o interditado, fala tanto sobre nós quanto os termos que escolhemos para explicar o mundo. Porque algo não dito tem tanto significado quanto aquilo que é dito pela razões acima.
É possível e desejável ficar atento e frear uma palavra que vem não sei de onde antes que seja dita ou escrita e refletir sobre ela, tentando entender o porquê de você a estar usando e se não haveria um termo melhor, que não fizesse outra pessoa sofrer ou que fosse mais justo com a realidade. Dessa forma, evitamos perpetuar discursos de opressão – que não foram produzidos por nós, mas que nos aprendemos muito bem, transmitidos pela escola, a família, a igreja, a mídia, o trabalho, e para os quais somos instrumentos muito competentes de difusão.
Isso resolve o caso de quem usa essas palavras sem pensar. O problema é que muita gente faz essas opções conscientemente.
Leonardo Sakamoto - Professor de Jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SC), ativista no combate e erradicação do trabalho escravo.
Fonte: Blog do Sakamoto ( http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br )


A sociedade do cansaço e do abatimento social

''(...) temos uma tarefa histórica a cumprir para nós, para nossos descendentes e para a própria humanidade. Utopia? Sim.''


Ha uma discussão pelo mundo afora sobre a “sociedade do cansaço”. Seu formulador principal, é um coreano que ensina filosofia em Berlim, Byung-Chul Han, cujo livro com o mesmo título acaba de ser lançado no Brasil (Vozes 2015). O pensamento nem sempre é claro e, por vezes discutível, como quando se afirma que “cansaço fundamental” é dotado de uma capacidade especial de “inspirar e fazer surgir o espírito” (cf. Byung-Chul Han, p. 73). Independentemente das teorizações, vivemos numa sociedade do cansaço. No Brasil além do cansaço sofremos um desânimo e um abatimento atroz.

Consideremos, em primeiro lugar, a sociedade do cansaço. Efetivamente, a aceleração do processo histórico e a multiplicação de sons, de mensagens, o exagero de estímulos e comunicações, especialmente pelo marketing comercial, pelos celulares com todos os seus aplicativos, a superinformação que nos chega pelas midias sociais, nos produzem, dizem estes autores, doenças neuronais: causam depressão, dificuldade de atenção e uma síndrome de hiperatividade.

Efetivamente, chegamos ao fim do dia estressados e desvitalizados. Nem dormimos direito, desmaiamos.

Acresce ainda o ritmo do produtivismo neoliberal que se está impondo aos trabalhadores no mundo inteiro. Especialmente o estilo norteamericanmo cobra de todos o maior desempenho possível. Isso é regra geral também entre nós. Tal cobrança desequilibra emocionalmente as pessoas, gerando irritabilidade e ansiedade permanente. O número de suicídios é assustador. Resuscitou-se, como já referi nesta coluna, o dito da revolução de 68 do século passado, agora radicalizado. Então se dizia: “metrô, trabalho, cama”. Agora se diz: “metrô, trabalho, túmulo”. Quer dizer: doenças letais, perda do sentido de vida e verdadeiros infartos psiquicos.

Detenhamo-nos no Brasil. Entre nós, nos últimos meses, grassa um desalento generalizado. A campanha eleitoral turbinada com grande virulência verbal, acusações, deformações e reais mentiras e o fato de a vitória do PT não ter sido aceita, suscitou ânimos de vindita por parte das oposições. Bandeiras sagradas do PT foram traídas pela corrupção em altíssimo grau, gerando decepção profunda. Tal fato fez perder costumes civilizados. A linguagem se canibalizou. Saiu do armário o preconceito contra os nordestinos e a desqualificação da população negra. Somos cordiais também no sentido negativo dado por Sergio Buarque de Holanda: podemos agir a partir do coração cheio de raiva, de ódio e de preconceitos. Tal situação se agravou com a ameaça de impeachment da Presidenta Dilma, por razões discutíveis.

Descobrimos um fato, não uma teoria, de que entre nós, vigora uma verdadeira luta de classes. Os interesses das classes abastadas são antagônicos aos das classes empobrecidas. Aquelas, historicamente hegemônicas, temem a inclusão dos pobres e a ascensão de outros setores da sociedade que vieram ocupar o lugar, antes reservado apenas para elas. Importa reconhecer que somos um dos países mais desiguais do mundo, vale dizer, onde mais campeiam injustiças sociais, violência banalizada e assassinatos sem conta que equivalem em número à guera do Iraque. Temos ainda centenas de trabalhadores vivendo sob condição equivalente à escravidão.

Grande parte destes malfeitores se professam cristãos: cristãos martirizando outros cristãos, o que faz do cristianismo não uma fé mas apenas uma crença cultural, uma irrisão e uma verdadeira blasfêmia.

Como sair deste inferno humano? A nossa democracia é apenas de voto, não representa o povo mas os interesses dos que financiaram as campanhas, por isso é de fachada ou, no máximo, de baixíssima intensidade. De cima não se há de esperar nada pois entre nós se consolidou um capitalismo selvagem e globalmente articulado o que aborta qualquer correlação de forças entre as classes.

Vejo uma saída possível, a partir de outro lugar social, daqueles que vem debaixo, da sociedade organizada e dos movimentos sociais que possuem outro ethos e outro sonho de Brasil e de mundo. Mas eles precisam estudar, se organizar, pressionar as classes dominantes e o Estado patrimonialista, se preparar para eventualmente, propor uma alternativa de sociedade ainda não ensaiada mas que possui raízes naqueles que no passado lutaram por um outro Brasil e com projeto próprio. A partir daí formular outro pacto social via uma constituição ecológico-social, fruto de uma constituinte exclusiva, uma reforma política radical, uma reforma agrária e urbana consistentes e a implantação de um novo designde educação e de serviços de saúde. Um povo doente e ignorante nunca fundará uma nova e possível biocivilização nos trópicos.

Tal sonho pode nos tirar do cansaço e do desamparo social e nos devolver o ânimo necessário para enfrentar os entraves dos conservadores e suscitar a esperança bem fundada de que nada está totalmente perdido, mas que temos uma tarefa histórica a cumprir para nós, para nossos descendentes e para a própria humanidade. Utopia? Sim. Como dizia Oscar Wilde: “se no nosso mapa não constar a utopia, nem olhemos para ele porque nos está escondendo o principal”. Do caos presente deverá sair algo bom e esperançador, pois esta é a lição que o processo cosmogênico nos deu no passado e nos está dando no presente. Em vez da cultura do cansaço e do abatimento teremos uma cultura da esperança e da alegria.

Leonardo Boff, colunista do JB on line e escritor


quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

OBRIGADO ANO VELHO E BEM VINDO ANO NOVO



Feliz Ano Novo aos que deixam 2015 convictos da missão cumprida e sob o travesseiro da verdade essa noite descansará impávida a consciência;

Feliz Ano Novo a você que fez dos dias do ano que fica tempo de luta em defesa do meio ambiente. Por você podemos sonhar com minutos, dias, meses, anos acrescidos neste planeta;

Feliz Ano Novo a você lutou em defesa dos direitos da mulher. Por você feridas foram tratadas com dignidade, abraços amenizam a dor, a solidão e sementes da coragem foram distribuídas;

Feliz Ano Novo a você que não olhou para o adolescente como delinquente, mas como esperança e futuro de um mundo melhor. Por você foi possível mostrar que o bom cidadão se forma na dignidade, na educação de qualidade, no acesso a políticas de inclusão e não com leis punitivas;

Feliz Ano Novo a você lutou bravamente em defesa da democracia, por entender e vive-la como essência de nossa vida quando bandidos a todo custo tentaram usurpa-las de nós durante os doses meses do ano;

Feliz Ano Novo a você que deu xeque mate no preconceito e mostrou as mentes pequenas que o ser humano é muito mais do que seu aspecto físico, seu peso, sua cor de pele, condição social, profissional;

Feliz Ano Novo a você que foi capaz desligar a Globo de sua vida e percebeu que a verdade realmente existe para além das décadas de mentiras dos marinhos;

Feliz Ano Novo a você que foi capaz de queimar livros, revistas, almanaques e impressos da ‘EdiPora’ abril. Por você foi possível entender que a ‘primavera’ da autodeterminação é mais bela que o ‘outono’ do despropósito oferecido pelos civitas;

Feliz Ano Novo a você que teve a coragem de lutar contra o terceiro turno ‘eleitocriminal’ do candidato derrotado em dois turnos em 2014 e no TERCEIRO do início de 2015 até esse dia 31 final;

Feliz Ano Novo a você que foi capaz de dizer as elites minoritárias desse país que eles não tem futuro porque não sabem sonhar. Por você aprendemos a não colocar o ponto final da história, pois a luta pelos direitos é um processo continuo;

Feliz Ano Novo a você que me suportou durante esses 365 dias de 2015, opinando, divergindo, me lapidando humanamente, enriquecendo meu conhecimento com sua presença, sua inteligência, sua irreverência. Por você, eu fiz o balanço de minha vida e meu planejamento de mudanças e amadurecimento pessoal;

Feliz Ano Novo, a você meu Amigo, minha Amiga, que o ano novo que se anuncia seja tempo de crescimento pessoal, sem o ufanismo de crenças, promessas estapafúrdias mas apenas pedidos de saúde, pois com ela fará os caminhos necessários que a vida lhes apresentará;

Um grande abraço do amigo que embora ás intempéries sentirá saudade de 2015 pois a coragem de enfrentar desafios nos faz vivos e renovados;

Por tudo que aprendi, deixo também um muito obrigado Ano Velho, na certeza do acúmulo de boas lembranças, grandes histórias e conquistas neste ano que inicia!


Neuri Adilio Alves 
Professor, Pesquisador e Assessor de Formação
Grad e Esp. Filosofia PUC/PR e PUCCamp/SP 


domingo, 27 de dezembro de 2015

À beira de uma nova era: como será o século XXI?

No século XXI haverá um grande conflito no Oriente Médio e veremos o declínio do Ocidente, de acordo com o autor francês e especialista em islamismo Alexandre del Valle.

Os países ocidentais têm vindo a perder o seu estatuto na arena internacional, disse o comentador político francês e professor de Alexandre del Valle ao site de notícias francês Atlantico.

"Estamos prestes a mergulhar em um século caracterizado pelo declínio progressivo e contínuo do Ocidente, o que não significa declínio total ou desaparecimento, mas uma perda de hegemonia e influência intelectual e ideológica", disse del Valle ao Atlantico.

Segundo ele, no novo paradigma global de outras civilizações, os valores ocidentais terão uma importância cada vez menor. 

Outro ponto importante para Alexander del Valle é a entrada na época de um mundo multipolar. Isto é evidenciado pelo fortalecimento estratégico da Rússia e China, a ascensão da Índia e o retorno do Irã, Turquia e Egito à vanguarda.

Esses desenvolvimentos sugerem que a globalização não está indo tão bem, e que o mundo formado após a Guerra Fria será caracterizado pela formação de polos ideológicos e geopolíticos, buscando livrar-se da dominação do Ocidente, sobretudo o polo formado pela posição da Rússia.

"Esta Rússia [nova] se recusa a deixar os americanos desestabilizarem os regimes amigos e atacar seus interesses diretos em nome dos chamados direitos humanos, também violados por amigos do Ocidente, como as monarquias islâmicas do Golfo [Pérsico] e de comércio de escravos», frisou ele, fazendo referência às práticas abusivas em relação aos imigrantes econômicos das monarquias do Golfo. 

Quando se trata de futuros desafios para a humanidade, del Valle se foca na dependência energética:

"Os países do Golfo, em algum momento, vão se tornar um dos centros e o principal patrocinador global do islamismo radical. Portanto, há certamente uma ligação evidente entre a geopolítica da luta contra o islamismo e o trânsito de recursos energéticos», disse del Valle.

Alexandre del Valle é um autor francês com posições geralmente de extrema-direita, que tem criticado os adversários políticos dos Estados Unidos, Israel e o neoliberalismo. No entanto, ele acredita que a Rússia deveria ser incluída em uma aliança estratégica entre os EUA e a Europa Ocidental em vez de ter laços com países críticos dos Estados Unidos.