terça-feira, 2 de agosto de 2011

                                              A FALÁCIA DA DESCENTRALIZAÇÃO                                                    


Em Chapecó e no Estado de Santa Catarina se faz enorme pirotecnia em cima do que eles chamam de descentralização do poder, para melhor atender as demandas de políticas publicas, mas que podemos avaliar e conceituar de reduto aparelhista de cargos públicos. Território de lobos vorazes, de felinos audazes e cobras criadas. 

Qualquer aspiração de críticas ao modelo sem dúvida incomoda. Basta perceber a reação do Sub-Prefeito da Região Efapi que não gostou de intervenção no programa de entrevista na rádio local, chamando os filósofos de propulsores de criticas, sem efetiva ação prática na transformação da realidade, numa clara demonstração de desespero e profunda ignorância histórica ante as justificativas da existência das sub-prefeituras.

Justificativas, qualquer um pode apresentar para o meio e forma de atuação que estão à serviço. Mas isso não nos impedem de avaliar e denunciar que os tais modelos de Descentralização por eles apontados como de eficaz necessidade, no fundo são pleonasmos malditos; não passam de APARELHISMO de Estado. 

Tendo como função especifica prover pleitos eleitorais, repartidos em pedaços como um para cada força política aliada do governo, sem uma efetiva relação de transformação e inserção com a realidade local. Prova disso é como as forças políticas partidárias aliadas do governo do Estado repartiram as suas Regionais como lobos vorazes. Não diferente da forma como as forças políticas partidárias também dividiram as subprefeituras por regiões aqui em Chapecó. Se fizessemos uma lista das citadas ações fantasmagóricas poderíamos assim descrever:

- falam tanto em segurança, e no entanto a criminalidade só tem aumentado  no município;
- falam em educação e tivemos mais de 50 dias de greve dos professores;
- falam de obras e infraestrutura, mas o acesso a 282 é um projeto réptil que rasteja a tempo;
- a saída ao Rio Grande do sul cada vez que chove fica mais intransitável; é a rodovia da casca de ovo;

- falam em Força Tarefa, mas o Estado cobra dos cidadãos taxas até para fazer cópia do RG;
- falam de Chapecó como polo de desenvolvimento do oeste, mas não citam os dados do IBGE que apontaram a cidade com a terceira no ranking de pobreza no estado;



A partir daí poderíamos entender o por que do desespero do Subprefeito em tentar justificar a ineficácia com criticas vazias aos Filósofos. Uma vaga na universidade ajudaria ele abrir os olhos para a realidade com certeza embora possa ser um desafio para um professor de universitário de filosofia ter que recondicionar um papagaio-de-pirata a ver a ver com os olhos da realidade. E Merleau-Ponty pode apresentar de ante-mão uma dica: " A verdadeira filosofia é reaprender a ver o mundo!"


Neuri Alves
Lic Filosofia e Esp. Antropologia





quinta-feira, 14 de julho de 2011



   Notas e conotações                                                                                          


Gabriel Perissé
 
Que notas ainda temos de “dar” aos nossos alunos? Notas musicais? Notas de rodapé? Notas fiscais?


As notas têm conotações nas quais nem sempre pensamos. Se “dou” nota 2 para um aluno meu... estou “dando” nota 2 para mim. Afinal, que professor sou eu que não consegue que um aluno obtenha mais do que a miserável nota 2?


Por outro lado, que triste vitória receber nota 10. Nota máxima demonstra que o aluno já chegou ao final, ao cume, já conquistou tudo. Ao passo que a nota 5, a nota 4 vêm carregadas de expectativas. Quanta coisa ainda a aprender e entender!

Conta-se que o filósofo Henri Bergson, ao divulgar as notas de seus alunos, fazia-o acrescentando comentários. Começava pelas notas mais baixas: 

— Pierre, nota 2. Quero destacar, no entanto, que as suas respostas foram muito originais, e algumas com um toque de ironia que me lembrou nosso Voltaire. Parabéns! Apesar de não corresponderem ao conteúdo pedido, suas considerações paralelas, errando o alvo, acertaram em cheio uma bela árvore. Pense em desenvolver o seu estilo literário. Você deve ter um grande poeta escondido em sua pena. Mais uma vez, meus parabéns! 

E assim ia, prodigalizando elogios e incentivos entre os “fracassados”. À medida que chegavam as notas mais altas, mudava o tom de voz, distribuía sérias críticas. Os primeiros colocados ouviam coisas assim: 

— Charles, nota 10. Entristece-me, porém, o modo como respondeu. Acertadamente, sem dúvida, mas sem um mínimo de reflexão. Não posso recriminá-lo pela exatidão quanto às informações, tampouco pela correção gramatical do seu texto. Lamento, contudo, que sua memória seja mais prodigiosa que sua imaginação. Esta sua vitória é a vitória dos que já sabem. Fica a minha esperança de que este sucesso não o afaste da busca da verdade, sempre mais arriscada! 

Possivelmente Bergson colocava em prática o pensamento de outro francês, Blaise Pascal. Para este, é necessário mostrar ao homem que ele não é anjo nem animal. Se alguém se exalta, devemos humilhá-lo. Se alguém se humilha, devemos exaltá-lo: “Contradigo-o sempre, até que ele compreenda que é um monstro incompreensível”. 

Talvez as notas musicais criem nova harmonia pedagógica. O que fazer? Dançar, tocar. Para você, Fá sustenido! Para você, Sol bemol maior! Para você, Si bemol menor! E agora... cantemos! 


Gabriel Perissé é coordenador pedagógico do Ipep (Instituto Paulista de Ensino e Pesquisa) e autor do livro recém-lançado A arte de ensinar, pela Editora Montiei.





Mauro Santayana: do Manifesto Comunista à rebelião dos homens

Imagine o leitor que em fevereiro de 1848 já houvesse a rede mundial de computadores. Vamos supor que, em lugar de imprimir os primeiros e poucos exemplares do Manifesto Comunista, Marx e Engels tivessem usado a internet, de forma a que todos os trabalhadores europeus e norte-americanos pudessem ler o texto. Qual teria sido o desenvolvimento do processo?

Por Mauro Santayana, em seu blog

Como sabemos, o ano de 1848 foi de rebeliões operárias na Europa, reprimidas com toda a violência. O capitalismo selvagem de então, um dos filhos bastardos da Revolução Francesa, sentiu-se animado pela derrota dos trabalhadores. Na França a burguesia tomou conta do poder e, derrotada a monarquia, assumiu-o sem disfarces e sem intermediários, em um período que os historiadores denominam de “A República dos homens de negócios”.Os trabalhadores e intelectuais tentaram, mais tarde, em 1871, logo depois de a França ser derrotada pelos alemães, criar um governo autônomo e igualitário em Paris. Com a ajuda dos invasores, o Exército de Thiers executou 20 mil parisienses nas ruas.

As manifestações populares dos países árabes, que os governos e a imprensa dos Estados Unidos e da Europa saudaram como o fim dos tiranos e o início da democratização do mundo islâmico, entram em nova etapa, ao atingir os países ricos. Os analistas apressados são conduzidos a rever suas conclusões. O mal-estar que levou os povos às ruas não se limita ao norte da África: é fenômeno mundial. Uma das contradições do capitalismo, principalmente nessa nova etapa, a do imperialismo desembuçado, no qual os governos nacionais não passam de meros servidores dos donos do dinheiro, é a de sua incapacidade em estabelecer limites. 

Hoje, nos Estados Unidos — que foram, em um tempo, o espaço para a realização de milhões de pessoas mediante o trabalho — a diferença entre os ricos e os pobres é maior do que durante toda a sua História, incluído o tempo da escravidão. Um por cento da população norte-americana detém 40% de toda a riqueza nacional. A mesma situação se repete em quase todos os países nórdicos.Quando redigíamos este texto, milhares de pessoas se encontravam acampadas no centro de Madri, em continuidade ao movimento Democracia Real, Já, que se iniciou em 15 de maio, com protestos em todas as grandes cidades espanholas. 

A Espanha hoje está dominada pelos grandes banqueiros e companhias multinacionais, que não só exploram o trabalho nacional, como vivem de explorar os países latino-americanos. Bancos como o Santander — cujos resultados mais expressivos ele os obtém no Brasil — dividem com os dois partidos que se revezam no poder (os socialistas e os conservadores) o resultado do assalto à economia do país. É contra esse sistema odioso que os espanhóis foram às ruas, e nas ruas continuam.Não são apenas os jovens desempregados que se indignam. São principalmente as mulheres e homens maduros, os que estimulam o movimento. 

Eles sentem que seus filhos e netos estarão condenados a um futuro a cada dia mais tenebroso e mais violento, se os cidadãos não reagirem imediatamente. Os espanhóis estão promovendo a articulação internacional de movimentos semelhantes, que ocorrem em outros países, como a Islândia, a França, a Inglaterra e mesmo os Estados Unidos. Se o sistema financeiro se articulou, com o Consenso de Washington e os encontros periódicos entre os homens mais ricos do planeta, a fim de dominar e explorar globalmente os povos, é preciso que os cidadãos do mundo inteiro reajam.Marx queria a união de todos os proletários do mundo. O movimento de hoje é mais amplo e seu lema poderia ser: Seres humanos do mundo inteiro, uni-vos.


Fonte: 
http://www.vermelho.org.br/noticia.

sexta-feira, 8 de julho de 2011


                                  As mágoas que Itamar levou consigo                                 



O senador e ex-presidente da República Itamar Franco, morto no último sábado 2, teve, como todo político, suas contradições. Ele completou o restante do governo Fernando Collor de Mello -cassado por corrupção. Chegou ao final com alto índice de aceitação popular tanto pela estabilidade econômica como pelo combate à corrupção.


Elegeu o Coisa Ruim (FHC) seu sucessor pensando em retornar ao poder quatro anos depois, já que tinha dele a garantia de apoio neste sentido. Itamar acreditou na gratidão daquele a quem tirou do ostracismo político, fez dele ministro das Relações Exteriores e depois da Fazenda para coordenar a equipe que elaborava o Plano Real.

A primeira grande decepção com o seu sucessor foi logo no primeiro mês de governo: no dia 19 de janeiro de 1995, através do Decreto nº 1.376 o Coisa Ruim extingui a Comissão Especial de Investigação (CEI) criada por ele, Itamar, para apurar denúncias de corrupção em todas as esferas do governo federal. A CEI era um dos orgulhos de Itamar, e ele esperava que o seu sucessor desse continuidade. 

A segunda grande decepção, e esta doeu profundamente, foi descobrir que o seu sucessor extinguiu a CEI justamente para cimentar a estrada da corrupção que levaria à aprovação da Proposta de Emenda Constitucional da reeleição, como ficou amplamente demonstrada pela oposição de então e através de depoimentos de parlamentares que declararam ter recebido R$ 200 mil para rever a posição e votar a favor, entre eles João Maia e Ronivon Santiago, ambos do PFL do Acre e que tiveram de renunciar ao mandato para não ser cassados e ficar inelegíveis por oito anos.

A traição a Itamar Franco - e ao Brasil - foi tamanha que este declarou que o maior arrependimento de sua vida foi ter indicado e apoiado o Coisa Ruim para sucedê-lo. Se a institucionalização da corrupção, com a extinção da CEI, já era inaceitável, posto que Itamar sempre foi um ferrenho defensor do combate à corrupção, com a quebra unilateral do acordo que certamente o levaria de volta ao Palácio do Planalto fez Itamar a perder todo o respeito que um dia nutriu pelo Coisa Ruim. O ex-senador mineiro também se disse arrependido de ter permitido que o seu sucessor assinasse a cédula do Real mesmo não sendo mais ministro da Fazenda.

O zelo pela coisa pública marcou a passagem do político mineiro pela Presidência da República e pelo governo de Minas Gerais. Ele afastou da chefia da Casa Civil o seu ministro Henrique Hargrives – seu amigo-irmão e o auxiliar de mais confiança – por este ter sido acusado de corrupção. Mandou realizar profunda investigação, ficando constatada a inocência de Hargrives, sendo este reconduzido ao cargo.

O governo neoliberal tucano-pefelista foi o mais corrupto da história republicana. Quem não se lembra dos escândalos da reeleição, do Proer, do DNER, da Sudam, da Sudene, da Pasta Rosa, do Sivam e principalmente das privatizações? E o que dizer do escândalo que ficou conhecido como Pavilhão de Hanouver, onde Paulo Henrique Cardoso, filho do Coisa Ruim gastou R$ 14 milhões liberado pelo governo para montar o pavilhão brasileiro na Expo 2000, na Alemanha? Modesto Carvalhosa - advogado, doutor e livre-docente em Direito pela Universidade de São Paulo e ex-membro da CEI, afirmou categoricamente que “Infelizmente, verifica-se que no governo FHC a corrupção grassou de forma nunca antes vista”. E o general Felicíssimo Cardoso, tio do Coisa Ruim, afirmou que “Esse meu sobrinho não merece confiança”. Precisa dizer mais?Mas as decepções do criador com a sua criatura não param por aí. Quando assumiu o governo de Minas Gerais, Itamar tentou renegociar a dívida do Estado com a União, mas o Coisa Ruim foi contra, forçando-o a decretar uma moratória, fato que gerou uma retaliação contra o governo mineiro. 

O uso de tropas do Exército em Minas para desalojar os integrantes do MST da fazenda do Coisa Ruim foi outra afronta que ele, Itamar, não engoliu, pois considerou uma intervenção federal indevida. Por fim, Itamar o chamou de mentiroso por ele ter se apresentado ao País como o pai do Plano Real.Essas mágoas Itamar Franco levou consigo para o túmulo, ou melhor, para o crematório.



Messias Pontes *
* Diretor de comunicação da Associação de Amizade Brasil-Cuba do Ceará, e membro do Conselho de Ética do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará e do Comitê Estadual do PCdoB.

                                                   SIGILO                                                                   


Encerrado o apocalipse, julgados vivos e mortos na grande assembléia universal do Vale de Jericó, Matusalém e Noé, encarregados do rescaldo final, encontraram nos escombros de Brasília, espalhados entre ruínas dos ministérios, os arquivos ultra-secretos da República.

― Veja só, Noé, esses aqui trazem o carimbo de “sigilo eterno”.

― Eterno?! Essa gente não deu ouvidos ao que disse Jesus, que tudo aquilo que se passasse às ocultas seria proclamado nos telhados? Do que as autoridades brasileiras se envergonhavam?, indagou o ancião da arca.

― Vejamos esses papéis aqui. Tratam da Guerra do Paraguai. Eis o relatório da atuação do comandante Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias... Nossa, Noé, que coisa! Como os soldados brasileiros foram cruéis com os paraguaios!

― Soldados, Matusalém?! Leia isto aqui: escravos arregimentados sob a promessa de uma liberdade que nunca veio. A maioria teve a morte como prêmio de combate.

― Nossa, Noé, e o Barão do Rio Branco! Como ele ousou ampliar assim, na cara de pau, as fronteiras do Brasil?!

― É, Matu, por isso há quem, no Itamaraty, prefira que os documentos fiquem à sombra das barbas do barão. A história se faz entre heroísmos e baixarias. Só que sempre foi escrita pelos vencedores, jamais pelas vítimas. Isso de “sigilo eterno” foi para jogar as infâmias pra debaixo do tapete.

― Veja isso aqui, Noé, os arquivos da ditadura militar. Repare neste mapa: assinala quando, quem, como e onde foram presas, torturadas e assassinadas as vítimas cujos corpos jamais foram localizados e pranteados por suas famílias. E ainda constam os nomes dos militares que participaram de torturas, assassinatos e seqüestros.

― Matu, e este documento aqui, que vergonha!

― Vergonha por quê?

― São os “decretos secretos” da ditadura. Como um documento público, o decreto, pode ser secreto? Isso é o mesmo que alguém se apresentar como ladrão honesto...

― Ora, Matu, vergonhosos são esses papéis que tratam dos governos Sarney e Collor.

― O que há de interessante neles?

― São dados estarrecedores! Quanta sujeirada em tantos governos do Brasil! Haja tráfico de influência, corrupção, nepotismo e favorecimentos. Agora compreendo por que as autoridades brasileiras sonegaram aos historiadores tantos períodos e fatos da história do Brasil!

― Naquela pasta ali – disse Noé – estão as licitações secretas da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 no Brasil. Haja maracutaia! Obras que ficariam em quinhentos foram multiplicadas por bilhões!

― Pena que o mundo acabou, a história findou e toda essa gente virou pó. Como teria sido importante o povo brasileiro ter direito à transparência histórica! Com certeza teria evitado que a nação repetisse tantos erros e reelegesse aqueles que distorceram os fatos e os encobriram para perpetuarem uma boa imagem que jamais mereceram.

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira”, entre outros livros.

                                Como é fácil escrever                            

Nos últimos anos tem surgido um súbito interesse pelo ato de escrever. Jovens e maduros têm se debruçado de repente sobre a bruxaria que é o escrever sem antes muito ler, algo tão extraordinário quanto o falar sem jamais ter ouvido. As mais difíceis provas de concursos para empregos públicos e de vestibulares exigem uma torturante redação. 

E, aparentemente estranho, até headhunters, até selecionadores de empresas privadas descobriram a pólvora: que não há bom falante de inglês, nem bom falante de qualquer língua estrangeira que não seja antes um bom conhecedor da própria língua, aquela maltratada e desprezada que o indivíduo ouve desde o ventre da mãe.

Daí que no mercado pululem e pulem livros que dizem ensinar a escrever sem o processo longo, permanente, educador de ler. Daí que apareçam prodígios como “Escrever é fácil”, um livro cujo título já é uma declaração de engodo. Imaginem lições do gênero “Porque escrever não passa disso: uma técnica de comunicação...”.

Numa só frase o autor do remédio para incautos faz uma brevidade-maravilha: que escrever é uma técnica!, e de comunicação. Sabemos todos que técnica é um modo, um método prático de se fazer algo, plenamente transmissível por treino, por repetição. (Sinto o autor assentindo com o queixo, “pois é isso mesmo”. ) Pois acabamos de entrar no reino da mais pura animalidade. Temos que descer às profundas para de lá forcejar um retorno. Vejam.No reino das profundas onde nos achamos já vemos que escrever, se é uma técnica, certamente não é como uma técnica de consertar um radinho de pilha ou uma televisão. “Mas é, de uma outra maneira”, insiste o autor do manual-maravilha. De que maneira ? ousaríamos perguntar. Ao que ele nos responde: “Usem sempre a ordem direta: sujeito, verbo, complemento. 

Escrevam períodos curtos usando palavras de uso comum”. Ah, e mais, de passagem, ele nos diz: “Evitem também a dupla negação. Há quem escreva: ‘Eu não entendi nada’. Ora, se não entendeu nada, então entendeu tudo, certo? Lembrem-se da regra de álgebra: menos com menos é igual a mais! Em vez disso, prefiram: ‘Nada entendi’ ”. Muito bom. Se com esse gênero de mestre as novas gerações aprenderem a escrever, estamos perdidos. Porque vejam, a profundidade das profundas não tem fundo, não tem limite. 


Porque vejam. Primeiro, um mestre não deveria recolher exemplos de disciplinas que desconhece. Menos com menos jamais foi igual a mais, sequer na aritmética – o que existe é uma operação, de multiplicação, cujo produto de números negativos, etc. Segundo, o que dá um sinal contrário em matemática não faz o mesmo quando se escreve. Pelo contrário, “não entendi nada” tem um peso expressivo, de reforço de negação, que não está presente em “nada entendi”. Quem assim se expressa é cidadão inglês de anedota. Terceiro, é muita estupidez fechar o pensamento na ordem direta, tão só e somente. 

O pensamento é, antes, o pulo, o salto, o alcance da essência numa desordem que é uma nova ordem, que não se expressa tão burramente como em “O bebê é bonito”. Vejam, essa frase anterior é de uma burrice que rejeita o poeta João Cabral em “De sua formosura deixai-me que diga: é tão belo como um sim numa sala negativa”. E reduzir a escrita à finalidade da comunicação traz danos irreparáveis ao pensamento. Um deles é subestimar a capacidade de compreensão do público leitor. Esse é um preconceito que termina por contagiar a própria criação. Para melhor “comunicar”, começariam a ser censuradas manifestações importantes do fazer e fazer-se humano. Ou seja: baixem o nível, porque o povo é burro. 

E como não temos mais tempo, deixem-nos por favor soltar de vez mais alguns trechos de crua tragédia para a sensibilidade humana no livro: “Toda frase é uma equação ... vírgulas geralmente quebram a fluência da leitura, exigindo que os olhos e a mente do leitor avancem aos trancos pelo texto ... a lógica é uma parte da filosofia encarregada justamente de pôr as idéias em ordem ... Lembrem-se sempre de que a concepção precede a criação ... Como puderam ver, escrever é fácil. Desde que tenham o que dizer” .De frases que são verdadeiras equações até o escrever que é fácil para quem tem o que dizer, só nos resta parodiar Mark Twain, quando ele se referia à luta para deixar de fumar: escrever é fácil, eu mesmo já tentei várias vezes. 


Urariano Mota *
http://www.vermelho.org.br

* Autor de “Os Corações Futuristas” e de “Soledad no Recife”, que recria os últimos dias de Soledad Barrett, mulher do Cabo Anselmo, executada por Fleury com o auxílio do traidor. 

                                           Avançar é preciso                     



Um fato saudável. Na linhagem da mais generosa tradição do pensamento marxista criador, Renato Rabelo (1) levantou questões fundamentais acerca do futuro do movimento revolucionário, essencial a um futuro exitoso para a humanidade e o Brasil. Sua pedagógica intervenção coincide com um momento nacional que requer das forças avançadas uma inteligente postura diante das tentativas de glorificação de um nebuloso passado derrotado no plano eleitoral com a contribuição do PCdoB.


Ao considerar “indispensável manter a identidade comunista e ao mesmo tempo atuar no curso real da luta política” numa “realidade de defensiva estratégica e numa fase de acumulação de forças num sentido revolucionário”, Rabelo examinou os desafios da atualização do pensamento marxista e as alterações na correlação de forças no mundo. 


Quando é avaliado o papel da China e dos países emergentes nas circunstâncias da profunda crise dos EUA, Europa e Japão, aflorou-me à memória uma entrevista realizada (ao lado de José Carlos Ruy) com um dirigente do PC da China em dezembro de 2001 – durante o 10º Congresso do PCdoB, realizado no Rio de Janeiro. O comunista chinês ali tangenciou a possibilidade de restauração da bipolaridade e exaltou as excelências de um mundo multipolar. Foi também no Rio, quase dez anos depois, no recente Encontro Internacionalista realizado na UFRJ, que Renato pronunciou sua esclarecedora conferência que confirma tais rumos. 

Novo ciclo, nova influênciaÉ nas circunstâncias dessa “nova realidade internacional e de mudança do cenário nacional, levando-se em conta o ciclo político aberto por Lula e continuado por Dilma Rousseff”, que o Brasil é promovido a “uma nova dimensão” também no quadro mundial, realçando-se, no pensamento de Renato Rabelo, “a importância de atualizar a teoria revolucionária”. É quando o movimento comunista “começa a recuperar sua influência no processo de acumulação de forças (no sentido ideológico, político e prático da influência concreta na sociedade)”. Uma reflexão assim posta é um vigoroso sopro renovador num país que vive hoje um ambiente auspicioso, mas ameaçado, aqui ou acolá, pelo velho pensamento neoliberal que busca a estagnação e a imbecilização da política. 


Por vezes, tacitamente assimilado pela fase inercial que sucedeu ao desaparecimento de circunstâncias e lideranças que marcaram o curso histórico significativo da trajetória republicana – a exemplo de João Amazonas de Sousa Pedroso, Mauricio Grabois, Leonel de Moura Brizola, Miguel Arraes e outros tantos exemplares do pensamento nacional e de extração patriótica e popular. Boa parte deles eliminada com a ferocidade planejada para que nada restasse desse capital político da soberania e do desenvolvimento — voltado para a realização do Brasil como nação justa, igualitária e grande potência no contexto mundial.

FHC: o paladino ocasionalNeste elo, entre as tarefas mais atuais coloca-se uma, muito especial, que trata de resgatar o gigantesco atraso proporcionado pelas quatro décadas perdidas que se remontam aos períodos do regime militar (1964-1985) e neoliberal que acometeu o país (ao longo dos anos 1990 até 2002).São períodos na essência complementares, articulados e siameses, e raros intervalos nos quais trataram de consagrar a transição negociada – que, da Nova República a Fernando Henrique Cardoso, transitando pela vitória de Fernando Collor, já em 1989, lograram barrar a efetivação de avanços a uma transição de ruptura. Um desdobramento cirúrgico à destruição do pensamento nacional alcançado na ditadura.Emblemática da atual presença deste velho pensamento derrotado em 2002, 2006 e 2010, foi a recente (e bizarra) glorificação do mesmo FHC, que reaparece “forçando a barra” como ocasional paladino da (possível) descriminalização da maconha. Mas o que se torna impossível à nação é tragar seu conservador perfil fisiológico entreguista e embusteiro da chantagem inflacionária. 


Em seu conjunto, destacaram-se, neste cenário, sinais dessa pasmaceira plasmada de ternura cínica e que, na plácida “maresia”, ainda subsiste às transformações requeridas e aos avanços acenados nas três recentes eleições presidenciais. Tudo em nome de uma “estabilidade” que custa ao país uma maquiada instabilidade e sua ruptura com o prodigioso passivo construído pela mesma elite estelionatária que “pensou” o Plano Real à “luz” do Consenso de Washington — e, na tradição, aqueles 502 anos de solidão, monopólio fundiário da propriedade territorial, cidades infladas e apartadas, perversa e secular espoliação do trabalho voltada para a acumulação, vandalismo, truculência, miséria e agudas contradições.(1) Renato Rabelo, presidente do PCdoB (Partido Comunista do Brasil) palestrou sobre “Os desafios dos Partidos Comunistas no século 21” e, no seminário "Governos de esquerda e progressistas na América Latina e no Caribe - Balanço e perspectivas", aprofundou sua análise acerca da natureza, do atual estágio e das agudas repercussões da crise do capitalismo.


Luiz Carlos Antero *

* Desde o início dos anos ‘70 atuou no Jornal dos Esportes, O Globo, Última Hora e Diário de Noticias, nos semanários Opinião e Movimento. Assessor parlamentar no Congresso Nacional desde 1995.

Max Altman: O inconfessável desejo e a realidade


Por acaso os presidentes não têm direito de adoecer? Afinal, estão mais expostos às enfermidades devido a todas as exigências do cargo. Que compostura e dignidade comportam certos setores da sociedade e seus porta-vozes impressos e eletro-eletrônicos quando um presidente se enferma e festejam, mostram satisfação, sabendo que o fato representa aflição e preocupação ao povo que o elegeu.




Que classe de seres humanos são os que desejam, dissimuladamente, a morte de presidentes e políticos que não podem controlar, quando diante das tragédias comuns de nosso dia-a-dia se mostram consternados e piedosos .A direita venezuelana – e isto se pode estender a todas de todos os recantos, em especial de Washington a Madri – pretende conseguir agora, graças ao câncer que acometeu o presidente Hugo Chávez, o que não conseguiu em doze anos: sua derrocada do poder, por qualquer meio. Tentaram a sedição do golpe militar, valeram-se da Pdvsa para paralisar o país, alegaram fraude em disputas eleitorais, arquitetaram múltiplas conspirações para desestabilizar o governo. Não conseguiram. Perderam as ruas, perderam as urnas e perderam os quartéis.

A doença de Chávez desatou uma odiosa e repugnante campanha midiática global que jogou no lixo os últimos resquícios de integridade moral e os princípios que devem nortear o jornalismo: objetividade e verdade. Preferiram entregar-se à manipulação política servindo aos interesses da oligarquia local e à estratégia regional do império. Quem lesse a grande imprensa privada da Venezuela percebia que havia certo regozijo com a enfermidade do presidente, exigindo que Chávez se licenciasse e o vice-presidente Elias Jaua assumisse o Palácio Miraflores. Alegavam os meios de comunicação e políticos de oposição, com base em “informações confidenciais” ou em “relatos do serviço de inteligência da CIA” que o estado de Chávez era terminal, que se havia cometido gravíssimo erro médico de diagnóstico e execução cirúrgica, que o câncer já se espalhara. Enfim, que o presidente não tinha condições de permanecer no cargo e muito menos de governar de Havana, onde estava hospitalizado. 

Fizeram ‘tabula rasa’ do comunicado oficial do chanceler Nicolas Maduro de 10 de junho , segundo o qual o presidente sofrera cirurgia de emergência para limpar um abscesso pélvico e desdenharam a manifestação do próprio Chávez em 30 de junho de que tivera de passar por uma segunda cirurgia para extirpar células e tumor cancerígeno . A respeito da doença do presidente seguem dizendo “segundo as versões oficiais insuscetíveis de confirmação” e que a “localização e gravidade, assim como o tratamento e o prognóstico dos médicos são mantidos em segredo”. Georges Pompidou, presidente da França, morreu de macroglobulinemia de Waldenström, um tipo de câncer linfático, no exercício de suas funções; François Mitterand governou boa parte de seus 14 anos de mandato carregando um câncer na pró-stata; e mais recentemente Fernando Lugo do Paraguai, governa normalmente ainda que portador de linfoma. São alguns exemplos e nenhum deles recebeu o tratamento mórbido de que Chávez é alvo. O regresso de Chávez e a incrível manifestação espontânea que reuniu mais de 150 mil pessoas para ouvir o presidente do ‘ Balcão do Povo ’ do Palácio Miraflores e demonstrar sua imensa alegria consistiram em resposta contundente àqueles que insistem em desestabilizar o governo. 

A reação venezuelana e o império esperavam que o afastamento do cenário político e administrativo de Chávez levassem a uma literal paralisia da ação governamental. Para seu imenso desgosto, no mês que Chávez esteve distante de Caracas, antes pelo giro que incluiu Brasília, Quito e Havana e depois pela internação hospitalar, o governo enfrentou galhardamente o desafio e seguiu funcionando normalmente. Não ocorreu nem ingovernabilidade nem vazio de poder nem paralisia de funções nem crise política nem agitação social como prognosticavam a oposição e seus porta-vozes midiáticos.Insistem agora que as mazelas do país – os descaminhos da economia, a inflação nas alturas, a criminalidade desabrida, a escassez de moradias e o racionamento de energia – se agravaram. São problemas reais, existem e precisam ser combatidos. No entanto, escamoteiam e evitam dizer que nenhum governo do mundo fez tanto em tão pouco tempo pela saúde e educação de seu povo. 

A Venezuela está livre do analfabetismo, mais da metade da população freqüenta alguma sala de aula, todo o povo tem acesso gratuito à medicina preventiva, a Missão Vivenda Venezuela está entregando casas para a população pobre, o instituto norte-americano Gallup situou a Venezuela em 6º lugar de bem-estar do mundo, considerando próspero seu nível de vida atual e expectativas futuras, o PIB cresceu 4,5% no 1º trimestre, caiu a taxa de desemprego para 8,1%, o salário mínimo e a distribuição de renda é o mais alto e a melhor da região, a pobreza foi reduzida drasticamente nos últimos 12 anos.É por tudo isso que o povo venezuelano participou entusiasticamente das comemorações do Bicentenário da Independência da Venezuela, saindo às ruas às dezenas de milhares. Ao vibrar com a parada das forças militares do país, estavam saudando a independência e a soberania atual da Venezuela. Este é, a par da melhoria das condições de vida da população em geral, um dado essencial. Ao abrir o dia festivo de 5 de julho , tendo ao lado os comandantes das Forças Armadas , da Guarda Nacional e da Milícia Popular , o presidente Chávez declarou: “ Não tínhamos melhor maneira para comemorar esse dia que o celebrando sendo independentes como somos, já não somos colônia de nenhum império nem o seremos nunca .”A independência, porém, levou uma década para se consolidar, sendo concretizada finalmente em 24 de junho de 1821 quando as tropas comandadas por Simon Bolívar derrotaram definitivamente as espanholas na Batalha de Carabobo.Igualmente, a próxima década – de 2011 a 2021 – terá por escopo consolidar o processo revolucionário bolivariano socialista. Chávez deve agora priorizar sua saúde, continuar governando mais apoiado em seus auxiliares e lançar-se com ímpeto na campanha eleitoral de 2012.

Sua visão estratégica, seu elã e capacidade política de gerar iniciativas que fortalecem a união dos povos latino-americanos e do Caribe, como a Alba, Petrocaribe, Telesur e diversas outras, fazem de Chávez um protagonista na luta pela total independência e integração de Nossa América.Mas a história ensina também que, ao longo dos próximos anos, faz-se mister que novas lideranças , provadas e capazes , surjam para levar adiante as bandeiras da soberania , da justiça social , da democracia , da paz e fraternidade entre os povos , da mãe-Terra, do socialismo enfim .

* Max Altman é jornalista, advogado e membro da Secretaria Nacional de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores.